Terrorismos e liberdade

Numa semana fortemente marcada pela passagem dos dez anos do ataque às Torres Gémeas de Nova Iorque, muitos de nós fomos levados a reflectir sobre as várias formas de terrorismo a que estamos sujeitos no século XXI.

o terrorismo económico, por exemplo. que permite que entidades possuidoras de poderes simbólicos se dignem alterar a geografia política do mundo na permanente procura de outras vítimas – mais frágeis, mais pacóvias ou mais corruptas – para com elas recomeçarem as suas estratégias de terror.

os bisavós dos grandes senhores das agências de rating americanas eram na sua quase totalidade presidiários do colonizador reino unido – que há mais de dois séculos decidiu reduzir a população prisional, deportando-a para o novo mundo.

hoje, diplomados por columbia, yale, oxford ou mit dignam-se classificar de ‘lixo’ as economias grega, irlandesa ou portuguesa, perante o titubear degradante de uma europa onde a memória está fragilizada – como se tivesse sido atingida por uma doença de alzheimer colectiva.

todos sabemos que um povo sem memória é um povo sem história. e é na história e na sua análise que se separa o trigo do joio, depois de atempadas autocríticas serenas e sérias que permitam pelo menos não cometer os mesmos erros em cada geração.

a evolução das espécies ensina o caminho, embora no kansas e no arkansas se ensine ainda nas escolas a teoria criacionista como verdade absoluta.

o terrorismo de estado é uma forma exótica de dar estatuto de legitimidade a simples invasões de territórios autónomos (ou mesmo genocídios) com o aval internacional, em nome do bem comum, e com base em informações das várias ‘secretas’ cuja veracidade ninguém contesta, em nome do ‘segredo de estado’.

granada, o iraque ou o afeganistão são só alguns exemplos nos quais quase todos os países ocidentais estão comprometidos, sem terem exigido provas fundamentadas. no simbolicamente poderoso conselho de segurança da onu, há também uma estranha forma de terrorismo de colarinho branco, ao qual dão o nome de ‘direito de veto’.

por acaso, a montante dos vários pretextos para o exercício destas formas de terrorismo estão sempre os grandes negócios mundiais: petróleo, armas, drogas e tráfico de seres humanos.

tudo isto coberto pelo manto diáfano do silêncio cúmplice ou imposto até ao sufoco que pode conduzir à morte.

nesta forma tenebrosa que é o silêncio cúmplice, têm papel determinante as grandes organizações de pendor ideológico como as igrejas, os partidos e as várias confissões maçónicas.

não importa o crime – importa o pacto de solidariedade e a manutenção do bom nome da instituição.

caiu-me no e-mail uma reportagem de ronald quinlan e maeve sheehan, publicada no irish independent do dia 4 do mês corrente, que é dever de consciência divulgar.

o arcebispo de dublin, d. dearmuid martin, afirma entre muitas outras dolorosas constatações sobre os pedófilos ligados à igreja católica: «pode haver um conluio em cloyne. eles podem ter amigos noutros lugares da igreja irlandesa. eles podem ter amigos na sociedade irlandesa. eles podem ter amigos no vaticano… o dano que essas pessoas provocam é horrendo. cabe a todos nós ver onde elas estão, mas no longo prazo. eu tenho de assumir a responsabilidade de que, em dublin, não haja conluios que rejeitem as nossas leis de protecção às crianças».

depois fala do ‘terrorismo do silêncio’ que ocorre por detrás das paredes da praça de são pedro. e, acrescento eu, por detrás das paredes de todas as grandes instituições, referidas ou não.

em portugal, existe oficialmente liberdade de informação, mas o terrorismo económico caseiro trata de sufocar todos os que não se limitam a reproduzir a voz do dono.

o sol faz hoje cinco anos – de lutas, nuvens e réstias de luz.

nunca entrei na sede deste jornal. sou uma simples escrevinhadora esporádica.

mas aqui, em quase quatro anos de colaborações, nunca ninguém me disse ou insinuou que o que escrevo não é conveniente.

parabéns, sobretudo por isso.

catalinapestana@gmail.com