Tremores na Estufa e as histórias de amor de Mr. Gallini

Uma rooftop party pode ser tudo. Esta veio em forma de concerto de um tipo de Alcobaça com um conjunto de canções que hão de dar o seu primeiro EP. Histórias de amor com bonecas insufláveis que terminam mal, que nada que feito de ar dura para sempre. A não ser que o ar seja…

Sete da tarde e a romaria do Tremor, primeira das quatro preparadas para esta quarta edição, foi dar à entrada do Hotel Vila Nova, em Ponta Delgada. Nada de que algumas pessoas já não suspeitassem depois de o serviço de quartos ter deixado uma carta a cada hóspede a avisar de que algo de especial se havia de passar nesse dia, mas adiante. Romaria à porta de um hotel de Ponta Delgada, fim de tarde e a chuva que desde o primeiro dia ameaça mas nunca vem. 

Dos Tremores na Estufa que em edições passadas chegaram ao Continente em forma de mito, concertos inusitados que uma pessoa nunca sabe de quem serão ou sequer onde. Sabe que tem que apanhar um autocarro no centro, sabe que há carros a montar caravana rumo ao concerto prometido a seguir e o resto logo se vê para depois se ouvirem relatos de experiências dentro de água, concertos em plantações de ananás ou em hotéis como foi este a que foram dar umas duzentas pessoas, mais coisa menos coisa, e sobre a trabalheira que é pôr esta gente toda a seguir indicações até ao topo de um hotel nem vamos escrever que já se imagina. 

Vamos antes diretos lá acima para encontrar um palco montado com vista para Ponta Delgada inteira. Gente a olhar para toda a gente, espécie de quem é quem num rooftop num crepúsculo que ainda serve bem a vista. E as selfies e tempo para uma imperial que aqui é fino e ainda bem porque ainda não sabemos mas é mais ou menos do Norte que vem a pessoa que há de subir ao palco. 

Três tipos encostados a um dos cantos de óculos de sol e o ar mais que suspeito de quem sabe perfeitamente o que vai acontecer a seguir. E é mesmo um deles, o dos óculos roxos, que sobe ao palco quando as movimentações acalmam, para a seguir nos confirmar que o grupo era Stone Dead, banda que o Tremor programou para sábado num bar de Ponta Delgada, e que ele sozinho é Mr. Gallini neste one-man show de rock a levar-nos de volta para a década de 60. “Boa noite, eu sou o Mr. Gallini e vim do Continente”, para uma canção seguinte (mais do que apropriada) sobre uma “rainbow cow” e depois outra e outra até irmos dar à história de amor entre um rapaz meio perdido e uma boneca insuflável que no final rebentou, que este Mr. Gallini é meio avesso a cantar historiazinhas de amor.

E de bonecas nada por aqui, só um homem disfarçado de coelho de fraque ninguém sabe bem porquê, mais senhoras daqui da ilha a discutirem o significado de um “bitch” atirado a fechar uma canção (bem avisámos da relação de Mr. Gallini com o amor):

– Bitch é cadela.

– Bitch é cabra.

– Não. Bitch, B. I. T. C. H. é cadela.

Mais uma coisa calminha de harmónica que “até vai ficar bem com o barulho do mar” neste “sítio mais fixe” em que Bruno Monteiro, o nome do artista quando desce do palco, diz alguma vez ter tocado. E o barulho do mar ouve-se mesmo. O mar e o vento e a chuva que parece prestes a dar-nos um banho a todos apesar de o aviso para os fatos de banho e toalhas vir só para o Tremor na Estufa do dia seguinte. Fim de concerto, aviões da Sata a rasarem-nos as cabeças, e não importa se isto é sobre cabras ou cadelas ou vacas ou coelhos, o que estas senhoras querem é mesmo “mais uma”, “só mais uma”, “aquela do início”, “pode ser a primeira outra vez”, mas vem “uma nova então”, letra ainda meia por completar para um “não faz mal que nós não falamos inglês”. 

As mesmas senhoras que encontram Mr. Gallini no elevador para a saída, que provavelmente hão de voltar a encontrar no sábado no Raiz Bar, com Stone Dead, onde é baterista. Mr. Gallini, que já tem disponível um single no YouTube e há de lançar em breve uma trilogia de EPs, veio da vontade de Bruno Monteiro de apresentar tudo o que compunha e que não se encaixava na sonoridade dos Stone Dead. Além da de tocar guitarra e tudo aquilo que de um músico precisa para fazer o rock sozinho. E hão de ser totalmente diferentes uns dos outros os EPs: o primeiro será isto, o segundo mais eletrónico, o terceiro mais rock ainda e com banda, explica, que isso dos géneros é um assunto complexo. “Gosto de me sentir bem e há coisas que ouço que me fazem sentir bem e daí acabam por surgir ideias.”

As jornalistas viajaram aos Açores a convite do Festival Tremor com apoio da Sata