Underdogs. Isto já não é um submundo

Uma galeria numa Lisboa que ficava entre duas, um programa de arte pública numa cidade que abraçou a arte urbana como poucas, mais um projeto de edições artísticas. Assim nasceu em 2013 a Underdogs, que sopra hoje as velas do seu quarto aniversário

Quatro anos podem ser bem mais do que quatro anos, podem ser quase sete. E da Lisboa de 2010 à de 2017 haverá tanta distância como tudo o que separa o bairro de Alvalade do de Marvila. Pauline Foessel costumava chamar-lhe “l’entre -deux”, entre a Lisboa nova e a antiga, quando ali foi dar com o armazém que acabaria por se transformar na galeria da Underdogs, plataforma cultural criada com Vhils para criar um novo espaço para a arte urbana no circuito das galerias de arte. Era 2013 mas na verdade tudo tinha começado em 2010, com a exposição coletiva organizada com Alexandre Farto (Vhils) na galeria de Vera Cortês, em Alvalade, que reunia trabalhos de artistas Mais Menos, Adres, Kusca, Mar, Obey, Ram, Smart Bastard, Sphiza, Tosco e do próprio Vhils.

Princípio para um fast forward para vir dar a um presente em que os artistas são outros, e são mais. MaisMenos, Add Fuel, AkaCorleone, André da Loba, Clemens Behr, Cyrcle, Pedrita, Felipe Pantone, Finok, Francisco Vidal, Maria Imaginário, Okuda San Miguel, Olivier Kosta-Théfaine e Wasted Rita são o conjunto de nomes que fazem a exposição coletiva que é inaugurada hoje às 19h no palacete que a Underdogs está a ocupar temporariamente no Príncipe Real (Praça do Príncipe Real, 18) para celebrar o quarto aniversário do projeto lançado (relançado, na verdade) por Alexandre Farto e Pauline Foessel em 2013. Na altura, explica Pauline, codiretora da Underdogs, o objetivo era construir uma plataforma que se equilibrasse entre as ruas de uma cidade, as paredes de uma galeria e um site. “Tomámos o risco de criar um triângulo, de meter sobre a mesma balança três áreas aparentemente díspares: a arte pública, a apresentada numa galeria e as edições artísticas.”

E a escolha dos artistas para esta exposição coletiva não será mais do que uma forma de balanço do que foram os últimos quatro anos, quatro anos em que “tudo mudou”, diz-nos Pauline a partir de Hong Kong. “A cidade mudou muito e a Underdogs pertence muito a Lisboa, portanto com a mudança da cidade o projeto evoluiu muito também. Mudei-me para Portugal em 2013 e consigo ver uma grande diferença no tipo de projetos que existem.”

E se em 2010, ou mesmo em 2013, a ideia de levar artistas da rua para as paredes brancas de uma galeria surgia como gesto isolado, quase tiro no escuro, a Underdogs que levou artistas como Mais Menos, Add Fuel ou AkaCorleone a reinventarem-se para se apresentarem em novos suportes é a mesma que começou mais tarde a abrir-se a artistas como Wasted Rita, produto da internet, da cultura pop e de massas, da globalização (com as individuais “Human Beings – God’s Only Mistake”, em 2015, e “The People, The Dying and All The Fun in Between”, em 2016, no Porto), Francisco Vidal, um dos representantes de Angola na última bienal de Veneza (“Marginal”, exposição conjunta com Pedro Batista”, em 2016), ou André da Loba, que numa individual na Underdogs transpôs pela primeira vez o seu trabalho de ilustração para telas.

Só isto bastará para se dizer que, se o objetivo era levar novos artistas e criar novos públicos para as galerias, ajudar a estabelecer um novo circuito, então ele terá sido cumprido. E não será tudo sobre o mesmo afinal? “As pessoas gostam de pôr as coisas em gavetas, mas a realidade muito é mais abrangente do que isso”, diz-nos Pauline, notando que artistas como Wasted Rita podem nem ter vindo da rua mas não há dúvida de que se inspiram nas novas paisagens urbanas ou na cultura pop contemporânea. “São artistas que pertencem a uma geração mais nova muito inspirada pela globalização.” No início, diz, “a ideia era criar novas oportunidades, um novo espaço, não necessariamente um espaço físico, porque o online era interessante e estava a funcionar bem, mas as oportunidades foram aparecendo e achámos que seria interessante aproveitar.” E quatro anos depois, 2017, underdogs já não têm que vir de um submundo.