Ur dos Caldeus!

Ur, no Iraque é a terra de Abraão – o primeiro dos patriarcas de Israel. Com a sua mulher, Sara, Abraão ouviu a voz de Deus numa terra chamada Harã, na atual Turquia. Vivia frustrado, porque já estava velho – 75 anos – e não tinha conseguido ter um filho. Deus aparece-lhe e fez-lhe uma…

João Paulo II já o tinha querido, mas foi Francisco quem realizou o sonho: visitar o Iraque! 

Do ponto de vista religioso o Iraque é um país icónico de dimensões bíblicas e o berço das três religiões monoteístas. Para compreendemos isto precisamos de percorrer a história de Abraão.

Ur, no Iraque é a terra de Abraão – o primeiro dos patriarcas de Israel. Com a sua mulher, Sara, Abraão ouviu a voz de Deus numa terra chamada Harã, na atual Turquia. Vivia frustrado, porque já estava velho – 75 anos – e não tinha conseguido ter um filho. Deus aparece-lhe e fez-lhe uma promessa: «Sai da tua terra e da tua parentela e vai para a terra onde eu te indicar. Far-te-ei uma grande nação» (Gn 12, 1-2). 

Há aqui dados importante: Abraão, que nascera no território do atual Iraque, recebe a promessa de Deus de receber uma descendência se se pusesse a caminho. Eu consigo imaginar o que aconteceu naquela casa. Sara já velha deve ter levado as mãos à cabeça ou ouvir Abraão diz que teria de sair daquela terra porque tinha ouvido Elshadai (o todo poderoso) que lhe tinha ordenado sair daquela terra. Para onde? Bom, também não sabe. Deve ter havido uma revolução lá em casa: um velho a dizer que ouve vozes e tem de sair da sua casa para ir para um sítio que nem sequer sabe qual é.

A verdade é que Abraão e Sara acredita naquela revelação, obedece e põe-se a caminho. Passado muito tempo, Abraão ainda não tem nenhum filho: como poderá ele receber uma descendência numerosa se nem sequer um filho ele tem? 
Sara tinha uma serva chamada Agar. Segundo o costume de então, se Agar se deitasse com o marido da sua senhora e lhe desse um filho no seu ventre, esse filho passaria a ser de Sara. Assim aconteceu: nasceu Ismael. Vale a pena ler o livro do Génesis, a partir do capítulo doze, para vermos uma certa realidade da ação. Sara, a certa altura, começa a fazer uma cena de ciúmes e Agar começa a agir como se fosse a dona da casa. Sara pede a Abraão para mandar Agar e Ismael embora, porque não a aguenta mais.

Abraão manda a escrava e Ismael embora. Mais tarde, Sara concebe um filho a quem pôs o nome de Isaac, que significa ‘filho do riso’, porque Sara desatou a rir quando Abraão lhe falou da promessa que Deus lhe tinha feito. É de Isaac, filho de Abraão que nasce Jacob que, tendo lutado com o anjo durante uma noite inteira, Deus lhe muda o nome para Israel. 
A partir destes três patriarcas encontramos a história da nação hebraica – Israel. É de Isaac que descende todo o judaísmo e a partir do qual se cumpre a promessa feita a Abraão. Nasce as doze tribos e o povo hebreu.

Esta é a versão da Bíblia compilada pelos judeus. Já o Corão tem uma versão um pouco diferente. Para o Islão, Abraão tem como mulher Agar e não Sara como nas Sagradas Escrituras judaicas e o filho legítimo é Ismael e não Isaac.
Isto é muito importante para compreendermos como as narrativas destas duas religiões – judaísmo e islamismo – se confrontam por legitimar a bênção de Deus. Assim, os judeus e, consequentemente, os cristãos descendem de Isaac e os islâmicos descendem de Ismael.

Pode parecer uma história da carochinha, para algumas mentes mais tacanhas, mas, na realidade, esta é a história de Israel e da Arábia e se não a conhecermos não conseguimos compreender as relações entre os povos do Médio Oriente. Se não conhecermos essa história, não iremos compreender a história da civilização ocidental e os conflitos que estamos a assistir.

Porque estas histórias não nos falam somente sobre a génese destes povos, mas são uma narrativa de como estes povos se relacionam ainda hoje. E como está viva esta narrativa!
Filhos da escrava ou filhos da mulher legítima, o que importa para Francisco é encontrar-se com estes filhos de Abraão e dar-lhes uma palavra de alento.