Sismo de 1969: A noite em que o pânico invadiu Lisboa

O pânico dominou os milhares de portugueses que, na noite de 28 de Fevereiro de 1969, foram acordados pelo maior sismo sentido no país desde 1755, que durou quase um minuto e danificou inúmeros edifícios.

O sismólogo e presidente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), Jorge Miguel Miranda, tinha 16 anos e lembra-se “perfeitamente” dessa noite.

“A cidade [de Lisboa] estava silenciosa. As chaminés começam a cair, a louça começa a cair dentro dos armários, o barulho que se espalha nos bairros é enorme e uma parte significativa da população sai para a rua na perspectiva de se afastar dos edifícios, que podem cair se houver outro abalo”, relatou à Lusa.

O sismo “é razoavelmente longo. O tempo em que é sentido pelas pessoas é razoavelmente grande, o que permite todo o pânico que se pode desenvolver durante um minuto de uma casa a abanar”, acrescentou Jorge Miguel Miranda.

Como especialista na matéria, o sismólogo disse que o que tornou o sismo de há 45 anos diferente foi o ter ocorrido “numa altura em que Portugal começava a ter uma sociedade marcadamente urbana”.

Eram 03:41 quando o sismo de magnitude 8 na escala de Richter, com epicentro no mar, a sudoeste do cabo de S. Vicente, na planície da Ferradura, se fez sentir em Portugal, Espanha e Marrocos.

Os maiores danos foram registados na Costa Vicentina e no Algarve, onde uma aldeia praticamente desapareceu, mas também causou estragos em Lisboa, nomeadamente queda de chaminés e paredes, falhas de energia e de comunicações.

Há ainda a registar no país, oficialmente, 11 mortos e dezenas de feridos, 58 dos quais em Lisboa.

Os sismógrafos existentes na zona sul e centro “ficaram todos saturados, ou seja, os registos não são utilizáveis. O único registo em Portugal continental que está completo é o da Ponte sobre o Tejo”, disse Jorge Miguel Miranda.

“A informação que temos instrumental só não é reduzida porque temos toda a informação do resto do mundo e na altura já estava de pé a primeira grande rede mundial de sismologia, que tinha uma estação na serra do Pilar, no Porto”, acrescentou.

Para o presidente do IPMA, o sismo de 1969 teve um “grande impacto” por outro motivo: “a sua localização foi perto da localização do de 1755. Ele foi sempre visto como uma espécie de aviso de que um 1755 estava lá à nossa espera e que um dia vai voltar outra vez. Foi esse sentimento que em 1969 ficou completamente espalhado e criou na população portuguesa uma consciência da necessidade de estudar, monitorizar e compreender melhor os sismos”.

O sismólogo revelou, ainda, que este sismo está envolto num “mistério” porque tem sido muito estudado e nunca se conseguiu determinar qual a falha que o causou.

“Temos o princípio de que os sismos ocorrem em falhas. Num sismo muito grande, por vezes, a rotura chega à superfície. O que se passa com o de 1969 é que ele é submarino, portanto é sempre de mais difícil acesso e, apesar de se terem feito milhares de quilómetros de sismologia de refracção e de reflexão à procura da estrutura geológica causadora deste sismo, não há uma relação claramente estabelecida entre uma falha específica e a rotura do sismo”, afirmou.

No futuro próximo, Jorge Miguel Miranda acredita que a engenharia sísmica e sistemas de protecção civil mais desenvolvidos vão permitir minimizar os danos dos terramotos.

“Existe muito por fazer e tem de haver a consciência de que sismos como o de 1969 vão existir outra vez e, provavelmente, existem medidas que têm de ser tomadas com tempo, para que os impactos sejam realmente pequenos”, concluiu.

Lusa/SOL