África no centro das atenções do Novo Banco Photo

Enquanto não se sabe o vencedor – dizem-nos que é coisa lá para Junho – decidamos, se assim nos permitirem, que aqui não há derrotados. Mais: ganham todos. Entre Félix Mula, Mónica de Miranda e Pauliana Valente Pimentel não há como escolher, sobretudo agora que estão os três no mesmo lugar, separados por um corredor…

Há, por certo, algo em comum nestes três fotógrafos, ou artistas se quisermos ser mais justos, que faz desta exposição uma espécie de coletiva onde o complexo é decidir onde ficamos mais tempo. Deixemos que a nossa curiosidade escolha por nós, com a certeza de que, seja qual for a paragem em que mais nos demoramos, essa paragem atira-nos para temperaturas mais quentes, para desertos menos urbanos, essa grande amiga de longa data, esse fascínio que é África. Continente que serviu de conceito aos três finalistas. Perdão, vencedores. O Novo Banco Photo 2016, que Pedro Lapa, diretor artístico do Museu Coleção Berardo, apresenta como «o melhor prémio de arte contemporânea do país».

Torna-se coisa simples e natural que, ao arriscar um passo no piso -1, onde cabe a mostra, brote um cheiro a Hemisfério Sul, um tropicalismo pobre de carteira e infinito de beleza, histórias que não param de nos servir, a nós, enquanto público, e aos artistas enquanto tumulto criativo-interino. Cumpramos a ordem: Mónica de Miranda é obcecada, no bom sentido do termo, pela identidade, que, aos seus olhos, não pode ser encarada como coisa fixa, de unhas cravadas a um lugar. Foi no Mindelo que decidiu explorar a genealogia de algumas famílias que, com as gerações a evoluir, virou americana, sabe-se lá o que serão daqui a 200 anos. «Interessa-me a diáspora, o que é isso de ser de um lugar? Procurar a pertença ou não pertença. Depois interessa-me muito a relação com o espetador, por isso coloquei aqui estes bancos para as pessoas poderem contemplar a obra», conta.

Já Félix Mula, moçambicano, centra-se na criação de enredos através da memória, da sua, dos seus, das gentes que só larga depois de lhe contarem as coisas. Neste caso esses contadores são donos de cantinas – assim se chamam as lojas de conveniência das zonas rurais do país – onde agora urgem ervas daninhas, televisores partidos, e onde faltam telhados e gente. «O meu trabalho é uma forma que arranjo de contar histórias, de ir colecionando objetos, de ir sonhando comigo e, com isso, criar histórias», confessa Félix Mula.

O último stop cumpre-se, de novo, no Mindelo, onde, por dois dias, Mónica de Miranda e Pauliana Valente Pimentel não se cruzaram. Por lá, Pauliana ouviu um mito, que diz quem se sentar numa certa pedra se torna homossexual. Contou-lhe Stefi, jovem homem que se veste de mulher, como, de resto, uma outra série de amigos por tal latitude. «Não quer dizer efetivamente que sejam gays ou transgénero, eles vivem fechadas naquela ilha, não têm dinheiro para sair e, simplesmente, gostam de se vestir assim», avisa Pimentel, que esteve, por duas vezes na ilha, tempo de que nunca abdica, nem para aqui nem para outro qualquer projeto: «Preciso de intimidade no meu trabalho, tive que viver como eles, do dia à noite, para viver o presente, sentir-me como eles». Em Junho reencontramo-nos.