A ‘família oculta’ de Sócrates na Operação Marquês

Nos processos de grande criminalidade económica, as relações familiares entre arguidos não são incomuns – existiam no Face Oculta, no Monte Branco e até nos Vistos Gold -, mas a teia familiar que os investigadores da Operação Marquês encontraram tem uma complexidade acrescida.

A ‘família oculta’ de Sócrates na Operação Marquês

Algumas destas relações foram determinantes para a abertura de um inquérito que tem José Sócrates como figura central. E protagonizam a grande maioria dos factos apurados e que servem ao Ministério Público (MP) para provar a sua tese: a de que o ex-primeiro-ministro tinha uma fortuna de 23 milhões de euros escondida, com origem em ‘luvas’.

Se foi uma transferência bancária de Maria Adelaide para o filho que chamou a atenção do MP – o dinheiro tinha origem na venda de imóveis ao empresário amigo, Santos Silva -, a verdade é que foi através de um primo, José Paulo Pinto de Sousa, que os investigadores confirmaram a existência de grandes fluxos financeiros entre a família de Sócrates e o ex-administrador do Grupo Lena.

O triângulo primo-mãe-amigo

O ex-governante, aliás, disse aos investigadores que Santos Silva era também muito amigo da sua família.

O telefonema que mudou a vida de Sócrates aconteceu, sem ele saber, um ano após a sua mudança para Paris. O SOL sabe que José Paulo ligou a Santos Silva pedindo apoio monetário. Os investigadores não entenderam de início o pedido e colocaram o primo de José Sócrates sob escuta. Não foi preciso muito até o procurador da República Rosário Teixeira perceber que entre ambos havia uma forte relação. Até porque, após José Paulo ter terminado o telefonema, ligou a um dos irmãos a dar como certa a ajuda financeira. O círculo fechou-se quando foi junta a informação de que todo o património da mãe de Sócrates fora vendido a Santos Silva e grande parte do dinheiro transferido para a esfera de Sócrates.

Entre estes três suspeitos existem ainda mais ligações: 5,4 milhões de euros do acervo de 23 milhões que está em contas de Santos Silva (e que o MP diz ser de Sócrates) teve origem em contas tituladas por José Paulo. E o MP diz ter provas de que outra parte do montante acumulado – 12 milhões de euros – veio de Helder Bataglia, fundador da Escom e pai de uma filha de Maria Filomena (a prima com quem Sócrates viveu em Paris).

Os investigadores defendem que se uns ajudaram a acumular a fortuna, fazendo passar pelas suas contas dinheiro com o objetivo de branqueá-lo, outros ajudaram a gastá-la. É o caso de Sofia Fava a quem Sócrates entregava mensalmente grandes quantias de dinheiro, justificando-as com as despesas de educação dos filhos, e de Fernanda Câncio, com quem passou férias (pagas por Santos Silva) e planeou comprar imóveis.

As famílias dos amigos

No esquema não aparecem apenas familiares de Sócrates. Armando Vara e a sua filha são arguidos por suspeita de terem recebido um milhão de euros de ‘luvas’ com origem no Grupo Vale do Lobo, em troca de condições mais favoráveis na concessão de financiamento.

Pedro Silva Pereira é outro caso. Além de o filho do antigo braço-direito de Sócrates ter vivido em Paris a expensas do ex-primeiro-ministro, também Ana Bessa, mulher de Silva Pereira, trabalhava para uma empresa de Santos Silva.

carlos.santos@sol.pt