Carlos Ruiz Zafón. ‘Às vezes parece que tenho de pedir desculpa pelo meu sucesso’

Alcançou notoriedade mundial com A Sombra do Vento, romance passado numa Barcelona gótica imaginária. Aos 52 anos, acaba de publicar O Labirinto dos Espíritos, a quarta e última parte do ciclo ‘O Cemitério dos Livros Esquecidos’, iniciado em 2001. Vive entre Los Angeles e Barcelona e diz que o sucesso não o mudou

Carlos Ruiz Zafón. ‘Às vezes parece que tenho de pedir desculpa pelo meu sucesso’

Depois da publicação de cada um dos seus livros, Carlos Ruiz Zafón anda durante cerca de um ano a viajar. Mas vê poucos dos sítios onde vai, pois a esmagadora parte do tempo é passada numa sala de hotel a falar com jornalistas. Ao fim do dia, se houver oportunidade, concede-se um passeio pela cidade.

«Este livro apareceu em Espanha a 17 de novembro», diz-nos o autor, a propósito de O Labirinto dos Espíritos, o quarto e último volume do ciclo ‘O Cemitério dos Livros Perdidos’, iniciado em 2001 com A Sombra do Vento. «Desde então estive em Barcelona, Madrid, fui ao México, do México voltei para Itália e de Itália vim para aqui». Descreve no ar um percurso imaginário com o indicador enquanto imita o som de um inseto a voar muito rápido: «Zzzzzzzz!».

Quando o encontramos numa sala com vista para o Tejo, Zafón está a garatujar qualquer coisa numa folha. Pensamos tratar-se de anotações, porventura apontamentos para o próximo livro. Mas não: os traços no papel formam o desenho de um dragão. O autor coleciona estes seres imaginários e até o mais distraído notará que usa um dragão metálico na lapela, como se fosse um estranho distintivo.

Nascido em Barcelona em 1964, Zafón dedicou-se desde muito cedo a escrever romances para jovens. Em 1993 venceu um prémio que lhe permitiu mudar-se para Los Angeles, onde começou uma carreira como guionista. Nos tempos livres, escreveu A Sombra do Vento, que o catapultou para a ribalta mundial e o tornou o autor espanhol mais vendido em todo o mundo. Diz que, com os proventos financeiros que daí resultaram – já terá vendido qualquer coisa como 35 milhões de exemplares -, comprou a sua liberdade, «como Espártaco», ou seja, abandonou a profissão de guionista para se dedicar exclusivamente àquilo que mais gosta de fazer. Apesar disso, não esqueceu a lição que aprendeu em Hollywood, e constrói os seus romances com imagens, texturas, luz, banda sonora, atmosferas e até guarda-roupa – tal e qual como se fossem filmes ou séries de televisão.

Surpreendeu-me muito descobrir, depois de ter lido A Sombra do Vento, que você vivia em Los Angeles e não em Barcelona. Do que foi à procura nos Estados Unidos?

Há muito tempo que me apetecia sair de Espanha. Não porque tivesse algo de errado, mas simplesmente porque queria viver noutros lugares, outras sociedades, outros países, outras línguas. E por uma série de fatores acabei por ir para os Estados Unidos. Depois aconteceu o que acontece tantas vezes na vida: vais para um sítio, a tua vida monta-se ali e às tantas dás-te conta de que passou um montão de anos. O que faço agora é dividir o meu tempo: estou parte do ano na Califórnia e parte do ano em Barcelona. Digamos que quando estou na Califórnia é mais para trabalhar e quando estou em Barcelona é mais ‘de férias’.

Que tipo de cidade é Los Angeles?

Los Angeles e Barcelona não podiam ser mais diferentes. Na Califórnia, em geral, há uma grande diversidade de pessoas de todas as partes do mundo, há gente com muito talento. É uma cidade onde se falam 128 idiomas.

É uma cidade gigantesca, não é?

É uma grande área metropolitana onde vivem 12, 13 milhões de pessoas. Entre Los Angeles e San Diego, às vezes não se percebe se saímos da cidade ou se apenas entrámos noutra zona. Los Angeles tem um modelo urbano muito diferente do das antigas cidades da Europa ou até das cidades da Costa Leste dos Estados Unidos, que são mais antigas. Lisboa, Barcelona, Roma ou Paris são cidades que crescem a partir de um núcleo histórico e desenvolvem-se em anéis, como o tronco de uma árvore, onde o comércio e a habitação estão combinados, onde houve grandes catástrofes que arrasaram a cidade uma e outra vez mas ela volta a erguer-se, como se fossem várias cidades que se constroem umas em cima das outras. As cidades do Oeste dos Estados Unidos não. Têm grandes redes de autoestradas e áreas metropolitanas muito pouco densas. Torna-se interessante por isso, pelo contraste, pela diferença absoluta. E para mim é uma cidade boa para fazer um trabalho criativo, porque consigo criar a minha própria bolha. Em Barcelona a cidade não muda para ti, é o que é. Uma cidade como Los Angeles é o que fazes dela. É outro modelo. E acostumei-me a isso, lancei as minhas raízes, fiz amigos. Quando me canso de estar lá vou para o aeroporto e regresso à Velha Europa. É como ter vidas diferentes. Suponho que a qualquer momento terei de escolher um lado ou o outro, mas não sei ainda qual será.

Disse que se falam 128 línguas?

Sim, no distrito escolar de LA falam-se 128 línguas. Todo o mundo está ali metido.

Fala espanhol no dia-a-dia?

Em Los Angeles não, falo inglês. 40% da população de LA são aquilo a que os americanos chamam hispânicos. Muitos são imigrantes de países centro-americanos que fazem os trabalhos mais duros e são mal pagos. Para estas pessoas, o meu espanhol soa muito estranho. Imagino que seja para eles como o equivalente do inglês do noticiário da BBC, um sotaque a que os ingleses chamam clipped, muito formal, muito chique. 

Mas chegou a tentar…

Há muitos anos, tive de fazer uma mudança de óleo do primeiro carro que comprei na Califórnia. Fui a um sítio onde os mecânicos estavam a falar espanhol e pensei que podia falar espanhol com eles. E disse: ‘Hola, buenos dias! Quiero cambiar el aceite del coche’. Ficaram a olhar para mim de boca aberta. Tive de repetir umas cinco vezes, até que um deles se levanta e diz: ‘El señor quiere cambiar el aceite del carro y habla español!’, como se eu tivesse acabado de aterrar vindo do espaço. Os imigrantes de segunda geração querem é blend in [misturar-se] e se falas com eles em espanhol acham que estás a discriminá-los e respondem-te em inglês. Por isso só falo espanhol quando estou em Espanha. E quando estou em Barcelona falo catalão. Acabamos por falar o idioma do lugar.

E escrever? Escreve sempre em castelhano?

Sim, escrevo sempre em castelhano. Foi a língua em que aprendi a ler e a escrever, e essa relação que o escritor tem com a primeira língua não tem com nenhuma outra, mesmo que a conheça e a domine.

Mas quando trabalhava como guionista escrevia em inglês.

É diferente. Num guião, o que fazemos é criar uma espécie de plano que servirá para construir aquilo que será o produto definitivo – não fazemos o produto definitivo. É como o arquiteto que faz as plantas: isso não é ainda o edifício, ali não pode viver ninguém. O trabalho de linguagem de um guionista não é sequer remotamente comparável ao de escrever um romance, onde a essência de tudo é a linguagem. Num romance, a linguagem é a fotografia, é o cenário, é a maquilhagem, é o guarda-roupa, os atores, a música, a história – é tudo. E num guião não.

No ciclo do ‘Cemitério dos livros esquecidos’ a personagem principal, mais do que a família Sempere, é Barcelona. Vivia lá quando escreveu estes livros?

A Sombra do Vento foi integralmente escrita em Los Angeles. O livro que foi mais escrito em Barcelona – metade foi lá e a outra metade em LA – foi O Jogo do Anjo. O Prisioneiro do Céu foi integralmente escrito em LA e o Labirinto dos Espíritos eu diria que 70% foi escrito em LA, 30% em Barcelona. A ideia, como você disse, não era utilizar Barcelona como cenário mas criar uma personagem baseada na cidade. Há muitos personagens, muitos protagonistas, não há um fundamental, mas Barcelona é dominante. Tentei transformá-la numa estilização gótica da cidade, que não é exatamente a cidade real, mas está muito baseada na realidade, na geografia e na história da cidade.

É uma Barcelona antiga. Fê-la de cabeça ou teve de recorrer a arquivos, de documentar-se?

Nasci em Barcelona, fui criado em Barcelona, conheço-a por dentro e por fora. Posso criar um mundo baseado em Barcelona sem ter necessidade de documentar-me. Às vezes vais acumulando informação sobre um tema e a melhor documentação é quando deixaste que isso se sedimentasse na tua cabeça e utilizas o que ficou. Dramaticamente, meter uma pilha de dados à força na história nunca funciona. Há romances que estão muito documentados mas sentimos que em nenhum momento ganham vida.

A sua vida mudou muito com o sucesso d’A Sombra do Vento?

A Sombra do Vento foi o quinto livro que publiquei, era mais um romance. Um romance diferente, é verdade, um recomeço, porque era um romance sem etiquetas, sem ser para novos ou para velhos. Graças ao sucesso d’A Sombra do Vento pude deixar de trabalhar como guionista e concentrar-me nos meus próprios livros. Comprei a minha liberdade, como Espártaco. Mas as mudanças não foram radicais, até porque o sucesso foi gradual. Na altura em que o livro foi publicado, eu tinha 34 ou 35 anos. Quando o sucesso chegou, já era quem sou hoje. Continuei a fazer o que fazia, a viver como vivia. Não me mudou nem mudou o meu modo de vida. Simplesmente tenho mais independência. Se decidir que vou dedicar anos a trabalhar num livro posso fazê-lo, não tenho a pressão que tinha antes.

Quando não se tem essa pressão, não há a tentação de pensar: ‘Hoje não me apetece trabalhar, hoje não vou’?

Acontece. Às vezes dá-me na gana e digo: ‘Hoje não vou trabalhar. Vou ficar a dormir ou vou dar um passeio’, seja o que for. Posso dar-me a esse luxo. Mas quando começo a trabalhar nalguma coisa não tiro folgas nunca, trabalho constantemente.

Trabalha em casa?

Tanto em Barcelona como em Los Angeles tenho uma oficina, um escritório. O de LA é muito maior porque passo mais tempo lá. Às vezes vejo pessoas a trabalhar num café e não percebo. Eu preciso de estar no meu próprio espaço, isolado do mundo, e passo o dia inteiro a trabalhar. 

E escreve no computador?

Normalmente sim. A minha caligrafia é indecifrável – um grafólogo provavelmente teria um curto-circuito cerebral, porque escrevo a mesma letra de muitas maneiras diferentes. Quando era miúdo gostava de escrever à máquina e acostumei-me desde muito pequeno a usar o computador. Quando ainda ninguém usava o computador, eu já o usava para escrever. E acho que o processador de texto funciona como o cérebro, porque permite escrever e rescrever a mesma frase muitas vezes. Voltas atrás e cortas e colas, e mudas e dás voltas e voltas. Aquela página nunca é definitiva, está sempre aberta até ao momento em que dizes: acabou o trabalho.

Vai para esse escritório de manhã?

Sim. Quando era jovem escrevia de noite. Os cinco primeiros livros que publiquei foram escritos de noite. Começava a trabalhar às onze da noite e escrevia até ao nascer do sol, um pouco mais. A seguir passava uma hora a ler e a fazer descompressão, e depois ia-me deitar. Acordava muito tarde, saía, dava um passeio, pensava, e à noite ia de novo trabalhar. Fiz essa rotina durante muitos anos. Isso começou a mudar com a idade. A própria química do corpo muda, e num momento determinado percebi que não podia continuar a trabalhar de noite, como tinha feito sempre. Quando chegava à meia-noite ou à uma da manhã adormecia. ‘O que se passa?!’ Tentava e adormecia outra vez. E tomava café. Até que disse: ‘Podia experimentar o contrário, fazer o que fazem muitos escritores, que se levantam muito cedo e começam a trabalhar até que o cérebro aguenta’.

E até quando aguenta?

Normalmente há uma margem de horas a partir da qual a máquina não dá mais. Podes fazer outras coisas, mas não escrever. Então comecei a fazer isso, e desde há muitos anos que acordo de manhã, normalmente cedo, e vou para o escritório trabalhar, até que digo ‘Hoje já não vou produzir mais material usável’. Esse é o momento de dizer ‘stop’.

Quando acaba de escrever um livro dá-o a ler a alguém?

A única pessoa a quem dou a ler os livros quando acabo de os escrever é à minha mulher. Quando conhecemos bem alguém e sabemos como pensa, a sua reação, mais do que aquilo que nos diz, ajuda-nos a saber se há coisas que não estavam claras, se há algo confuso, e a partir daí podemos fazer alguma mudança ou ajuste. Essa é a versão definitiva do livro, está fechado, já não mudo, e envio ao meu agente e ao meu editor. Eles leem, podem fazer algum ajuste de datas ou corrigir imprecisões, mas são alterações mínimas. Há muitos escritores que fazem a primeira versão e dão-na a ler a alguém, que depois faz comentários. Essa é a maneira de trabalhar do guionista. Terminas o guião, entrega-lo e dizem-te ‘Queremos mudar tudo’.

Chegou a acontecer-lhe isso?

Sim. E por razões absolutamente ridículas. É como um arquiteto que está a trabalhar com um cliente que lhe diz: ‘Eu quero a piscina no quarto de dormir. E quero golfinhos e uma fonte colorida’. E aí há duas opções: ou dizes ‘isso é uma estupidez’ ou dizes ‘às suas ordens, voltarei daqui a um mês com a piscina com golfinhos e uma fonte colorida’. E quando voltas, ele pergunta-te: ‘Porque é que a piscina está no quarto de dormir?’ ‘Foi o que me pediu’. ‘Não, não foi, eu nunca disse isso. O que eu disse é que a piscina tinha de ter cataratas. E focas’. Vais, e tratas de pôr cataratas e focas. Normalmente na televisão é assim. Quando estás a trabalhar num romance é diferente: é a tua obra, é o teu mundo pessoal, é o que queres fazer. Os editores podem publicá-lo ou não.

O que lhe disse a sua mulher sobre O Labirinto dos Espíritos?

Ela já convive com esta história há mais de 15 anos. Disse que gostou muito. E julgo que não o disse por cortesia. Normalmente a sua reação e serve-me para saber se consegui ou não fazer o que pretendia. Neste caso tive a sensação de que sim, de que escrevi exatamente o livro que queria escrever.

Recebe muitas cartas de leitores?

Antes da explosão das redes sociais as pessoas escreviam mais cartas. Agora põem as suas opiniões nas redes sociais. Publicas os livros e numa semana há milhares de pessoas que te dizem o que pensam. Mas temos de ser cautelosos para não nos deixarmos levar pelo que dizem.

Recebe declarações de amor de leitoras?

Bom… Recebo mensagens muito pessoais, pessoas que me comunicam coisas da sua vida ou que contam como reagiram aos meus livros. E há histórias curiosíssimas de pessoas que encontraram uma relação entre o que liam nos meus livros e o que estava a acontecer nas suas vidas. Ao longo dos anos tenho encontrado de tudo.

Também tem más críticas?

Como qualquer pessoa que faça um trabalho público, há todo o tipo de respostas. Ao longo dos anos, os comentários têm sido sempre muito positivos e generosos, em geral. Se houve algum pior? Sim, houve. Penso que esta é a única profissão do mundo em que, para algumas pessoas, o sucesso está mal visto. 

Na música também pode acontecer.

Passa-se nas artes, em geral. Se um filme tem muito êxito há quem adote uma postura snob. Por vezes parece que tenho que pedir desculpa por algo que fiz ter tido sucesso, como se tivesse cometido um crime. Isto vai sempre acontecer, faz parte da caixa de ressonância do género humano. Particularmente na literatura – mas também noutros campos – há pessoas que dizem maravilhas do teu trabalho, mas quando percebem há muita gente que também gosta, dizem o contrário. Se há alguém que ache mal que os livros tenham sucesso ou que não goste de mim, que pena! – não quis ofender ninguém mas também não vou perder nem um minuto de sono por causa dele.

Para si, parece fácil escrever. 

Não, não…

Quando o lemos, parece que escreve como quem respira.

Quem me dera! Escrever é o meu ofício, a minha profissão, vou trabalhando numa coisa até que funcione, até quando for preciso, e isso é o que chega ao leitor. Parte do artifício da literatura é que quando as coisas estão terminadas tudo pareça simples – a ilusão da simplicidade é a mais difícil de conseguir. Uma coisa que entendo sempre é que o trabalho de engenharia – digamos assim -, o trabalho técnico, cabe-me a mim. Não tenho de o transferir para o leitor. Seria como um restaurante que servisse pratos por cozinhar. Não, eu tenho de trabalhar para que o leitor flua pelo texto como se fosse água, e que tenha uma experiência o mais intensa e sedutora possível, que desfrute e que não se depare com a complexidade e a dificuldade da criação disto.

Mas retira prazer da escrita? Há escritores que dizem que sofrem muito…

Há quem diga: ‘É um trabalho tão duro… Vejo gente a descarregar caixas no porto ou a partir pedra à torreira do sol e digo: ‘Isso sim, é um trabalho duro’. O problema da escrita é que é uma abstração puramente intelectual. Enfrentas constantemente um vazio e não há nada em que te possas apoiar. Isso cria a sensação de que tens de fazer tudo a partir do zero. Estás a tentar criar mundos, personagens, histórias, atmosferas, imagens, sons, texturas, mas só com papel e tinta. Se crio uma cidade, tenho de a levantar a partir do chão. Tudo: a luz, a textura, a atmosfera do lugar, o olhar de um personagem, um movimento, tudo é criado do zero. E isso faz com que sejas prisioneiro das tuas próprias limitações. Só podes fazer aquilo que a tua técnica te permite fazer. É um mundo que se vai erguendo e que tem de ter um nível de intensidade, de profundidade suficiente para que o leitor entre nele.

Para que acredite.

Para que acredite, lhe interesse e queira continuar ali durante muito tempo. Porque um filme dura 90 minutos, mas 90 minutos num romance não é nada. São uns poucos capítulos. Às vezes é frustrante, porque não estás a fazer as coisas como imaginavas, mas por outro lado creio que há uma fruição, precisamente por causa da dificuldade, do desafio de criar todas estas coisas só com papel e tinta, há uma sensação de satisfação. Além disso não precisas de nada nem de ninguém. Se queres fazer um filme, precisas de dinheiro, de muitas coisas. Aqui não precisas de nada, podes criar seja o que for e as únicas limitações são as tuas. 

Em todos estes romances perpassa sempre um grande fascínio pelo livro. Como é a sua biblioteca?

Tenho uma biblioteca imensa, com milhares e milhares de livros, dividida em quatro partes: em Barcelona e em Los Angeles e, em cada um desses locais, em casa e no escritório. E há uma quinta parte, que são todos os arquivos digitais que tenho. Muitos são livros que tenho em papel mas quero ter em digital para levar de um lado para outro. Digamos que tenho uma biblioteca invisível, digital, e quatro bibliotecas repartidas em quatro lugares diferentes. Gostaria de ter todos juntos, mas de momento estão separados.

Tem livros raros, primeiras edições?

Gosto de ver esses livros antigos, mas para mim o importante é a obra. Compro livros porque os quero ler. Se um livro me interessa prefiro encontrar a melhor edição, em melhor estado, para desfrutar do texto, do que uma de 1714 que é muito bonita e tem pequenas lagartinhas. Uma das coisas que quis fazer com esta série do ‘Cemitério dos Livros Perdidos’ era uma homenagem à literatura, à tradição literária, aos géneros, às pessoas que fazem parte do mundo do livro – leitores, escritores, editores, livreiros, bibliotecários – e também uma reflexão sobre o que significa a literatura, o que significa ler, o que significa escrever.

Tem tempo para ler?

Tento ter. Nas alturas em que estou a escrever tenho menos tempo para ler e demoro mais a ler os livros, porque tenho a cabeça mergulhada no livro que estou a escrever, mas gosto sempre de ler, estou sempre a ler algo. Quando não estou a escrever, aí sim, leio muito mais.

E o que gosta mais de ler?

Quando era mais jovem lia muito mais ficção. Nos últimos dez anos, por aí, comecei a mudar. Agora leio muito mais não ficção – ensaio, sobretudo história. Leio livros sobre temas da história que me interessam, história da arte, da ciência. Isso representa uns 70% do que leio. Mas também continuo a ler romances de autores de que gosto e de outros que vou descobrindo.