«Porque me importa. Pouco me importa o quê? Não sei. Pouco me importa.»

Este «poema inconjunto» de Alberto Caeiro / Fernando Pessoa, escrito numa parede, na Costa do Castelo, é um pequeno monólogo, quase um minidiscurso sobre o desinteresse total.

O poeta começa por afirmar: «pouco me importa», ou seja, não há quase nada que consiga despertar o seu interesse. E, ao questionar-se sobre o que não lhe interessa, conclui: «Não sei. Pouco me importa», ou seja, o desinteresse é total porque nem lhe interessa conhecer o que não lhe interessa. É, efetivamente, uma total falta de interesse, um alheamento completo da realidade. É constatar que tudo existe só porque sim, ou, nas palavras de Joaquim Mensurado, é perguntar, desinteressadamente: «Quem impõe ao dia / que não nasça / ao sol que é a sua fonte / que não brilhe?». É uma atitude de passividade, porque nada pode alterar o que é inalterável.

Este desinteresse radica normalmente num ou mais de três problemas fundamentais. O desinteresse pode dever-se ao facto de a pessoa não conseguir sair do seu canto de conforto, onde se sente segura, o que a leva a não ter interesse em conhecer nada mais. O desinteresse pode, por outro lado, ser apenas uma forma de chamar a atenção (como parece ser o caso de quem pintou esta afirmação na parede) e, eventualmente, de pedir ajuda. A falta de interesse pode, ainda, ser a expressão do medo de reconhecer que não somos capazes de fazer nada, motivo pelo qual o desinteresse é apenas uma capa que cobre a incapacidade.

E não se interessar por nada é não viver a vida, é não aproveitar o que de bom (e de mau) ela tem. Ora, esta atitude de desinteresse é como deixar sempre algo por fazer ou por dizer, é viver como Lobo Antunes descreve a existência de uma das suas mais recentes personagens: é estar com «o coração sempre a meio, a alma sempre a meio, a vida, sobretudo a vida, sempre a meio».

Ora, um elemento essencial para garantir coerência e unir as várias esferas da vida é o afeto, pois, como canta o músico brasileiro Zeca Baleiro, de forma pungente: «Até um canalha precisa de afeto / Dor não cura com penicilina!»

 

Maria Eugénia Leitão

Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services