Grupo de Braga lidera na segurança eletrónica e aposta na felicidade

Ricardo Costa é líder na segurança eletrónica e fatura 65M€. A partir de Braga, o grupo está presente em quatro países. O CEO da AE Minho revela como superou as dificuldades que afetaram o grupo.

Quais são os fatores críticos de sucesso deste grupo?
RC – Os fatores críticos de sucesso são as pessoas e a diversificação que fizemos a partir de 2004 quando diversificámos as áreas de negócio. Durante quase 50 anos, só existiu uma empresa. Hoje, a segurança eletrónica (que só começou em 2004) tem uma preponderância muito grande e corresponde a 75% do nosso volume de negócios.

As áreas de formação e consultoria, audiovisuais, desenvolvimento de casas inteligentes e descartáveis médicos foram acrescentadas desde 2004 – e até, muito recentemente, o KuantoKusta, do qual adquirimos uma participação.

Essa diversificação permitiu ultrapassarmos fases mais complicadas como a da crise que se abateu no mundo e, especificamente, em Portugal no setor da construção civil, se tivermos em conta que a nossa empresa inicial só trabalhava para o setor da construção civil com as instalações elétricas. Se não tivéssemos diversificado a seu tempo as áreas de atividade do grupo, seguramente hoje não estávamos aqui a conversar.

Depois das pessoas, destacaria a diversificação de áreas de negócio e também de áreas geográficas. O facto de hoje estarmos em Portugal, em Espanha, nos Camarões, em Marrocos e no Brasil também revela que foi importante a diversificação geográfica de novos mercados. Quando uns estão mais afetados por determinada circunstância, outros respondem melhor. Isso já nos sucedeu, mais concretamente com o Brasil. Apanhámos momentos bons no Brasil, quando na Europa estávamos menos bem; e quando estamos melhor na Europa, o Brasil tem passado por algumas crises.
Esta diversificação, tanto de áreas de negócio como geográficas, para mim foi um dos fatores-chave de sucesso do grupo.

Quanto ao modelo de negócio, o foco está em empresas de intermediação, mas agora também apostam no fabrico como, por exemplo, de soluções de domótica?
RC – Sim, é o caso das casas inteligentes ou a dita domótica. Preferimos chamar-lhe casas inteligentes porque o termo “domótica” foi caindo um pouco em desuso e as pessoas não percebiam ou diabolizavam a domótica.

Nesse campo temos todo o desenvolvimento dentro de portas e é um fator distintivo do grupo. Foi algo que nós procurámos à volta de 2015, quando só tínhamos empresas de distribuição, ou seja, vendíamos o que outros desenvolviam e, por isso, não controlávamos todo o processo.

Quando apostamos na Atouch (uma empresa que estava sediada em Chiang Mai, na Tailândia), fomos lá primeiro adquirir uma parte e, passados três anos, adquirimos a totalidade do capital e trouxemos o desenvolvimento todo para Portugal. É uma das empresas que mais apostamos para o futuro. Com tudo o que se vive na área da eficiência energética, a Atouch tem soluções muito interessantes e, acima de tudo, conseguimos controlar aquilo que sai para o mercado e somos inovadores nas soluções que apresentamos nesse mercado.

Como é que está o grupo de saúde financeira?
RC – Felizmente, está bem. A IBD, a empresa mais forte do grupo, representa cerca de 75% do volume de negócios de todo o grupo. Através dos processos de fusão e de aquisição que fomos fazendo desde 2018, tem uma saúde financeira muito boa, o que permite que as outras empresas (mais recentes e onde é necessário fazer mais investimento) possam ser alavancadas, não só pela banca como também com alguns capitais próprios da própria IBD.

A faturação do grupo ronda os 65 milhões de euros, com cerca de 250 pessoas. A IBD representa cerca de 52 milhões de euros de faturação. Depois, temos a AVPRO que ronda os 3 milhões; a iNERGIA que ronda os 2 milhões; a Atouch deverá chegar este ano a 1 milhão de euros, mas também é a empresa onde as margens são mais significativas.

E há ainda a Academia Bernardo da Costa que foi um projeto que começou em 2011. No início, era só para dar formação nas áreas em que o grupo trabalhava, mas hoje já tem mais de 27 áreas certificadas pela DGERT e tem trabalhado muito na formação modelar, na formação de desempregados de longa duração.

As empresas que estão ativas são aquelas que, nos próximos 10 anos, queremos consolidar o negócio. Também já tivemos projetos que abandonámos ao longo do tempo como a BC Moçambique ou Angola e Cabo Verde ou Exva, uma spin-off da Universidade do Minho (área do desenvolvimento) que decidimos abandonar.

O negócio começa, com o teu avô, por instalações elétricas. Como foi a evolução dessa área tão dependente da construção civil?
RC – Instalações elétricas de apoio à construção civil e também a bobinagem de motores. Era uma área muito importante da empresa, desde 1957, e até 2004 foi a única empresa que existiu, sempre na mesma área de negócio, com as instalações elétricas a ganharem preponderância sobre a bobinagem de motores. Sempre na baixa tensão e no apoio à construção civil. Por isso é que sofremos tanto quando veio a crise de 2008-2011…

E Braga sentiu bastante, não foi?
RC – Sofreu… Braga tinha oito das 20 maiores construtoras do país e ficaram muito poucas. Ficámos sem 95% dos nossos clientes em 2014 e ficámos sem um ano e meio de faturação; ficámos sem receber. Esse foi, de facto, o momento mais difícil para mim enquanto líder e gestor.

Era uma empresa de cariz familiar (como o grupo ainda é), com colaboradores a trabalhar há mais de 40 anos, outros mais de 30, e que tinham andado comigo ao colo, que me viram nascer e crescer… Quando tivemos de fazer um ajustamento à carga salarial que existia (e esse foi também o momento em que eu mais aprendi enquanto líder), foi um momento de assumir responsabilidades, de dar a cara e eu próprio negociei todas as indemnizações, todos os acordos. Foi tudo por acordo, não houve nenhum advogado no meio! E ainda hoje a maior parte deles continua a ir aos nossos eventos, às nossas festas, quando comemoramos o aniversário do meu avô. Foi um momento duro porque teve uma carga emocional muito forte.

Além de trabalhadores, também havia familiares e foi preciso chegar a um acordo porque a empresa não conseguiria sobreviver, se mantivesse todas as pessoas que trabalhavam nesse momento. Serviu-me de lição para aquilo que eu fui desenvolvendo nos anos seguintes.

É conhecido o teu foco nas pessoas, mas, até há relativamente poucos anos, isso era quase interpretado como um discurso “lamecha”. Que lições é possível tirar da criação do departamento da felicidade?
RC – Quando nós, em 2017, constituímos o departamento da felicidade (o primeiro numa empresa em Portugal), era assim que éramos apelidados porque não era um termo para uma empresa, era pouco profissional, era lamecha.

A história tem vindo a dar-nos razão porque, hoje, não se fala quase em mais nada do que equilíbrio vida pessoal / vida profissional, flexibilidade laboral, bem-estar em contexto organizacional, felicidade em contexto organizacional, atração de talento… e isso veio demonstrar que estávamos certos quando demos esse passo porque temos uma rotação de pessoas baixíssima, nos últimos 10 anos, e isso é também um fator distintivo. Por isso, no início da entrevista, disse que as pessoas são um dos nossos fatores críticos de sucesso.

A forma como olhamos para as pessoas e a forma como as pessoas se unem quando é necessário, nos momentos mais críticos, nos momentos mais difíceis – como foi o que atravessámos na pandemia e em que nós saímos da pandemia bem melhor do que quando entrámos. Isso só é possível porque há aqui um win-win numa relação empresa-trabalhadores que é, de facto, benéfica para ambos. Há momentos em que é a empresa a investir nas pessoas, a reconhecer o trabalho das pessoas e a proporcionar bem-estar, saúde e segurança. Há momentos em que as pessoas se unem e dão aqueles 10, 20, 30% extra que permitem que as empresas ultrapassem os momentos mais difíceis. E isto nós temos conseguido, embora não só desde 2017.

O departamento da felicidade não é o início de nada; é a consequência de uma cultura organizacional que já vem desde o meu avô e a que depois o meu pai e o meu tio deram continuidade, nos 30 anos que estiveram a liderar a empresa. Eu tive a sorte e o privilégio de receber esse legado e de adaptá-lo a este mundo cada vez mais global.

O facto de eu viajar imenso e de estar em contacto com diversas realidades permite-me procurar sempre exemplos que eu possa depois aplicar à nossa realidade e que me têm ajudado a desenvolver. Acima de tudo, o que está aqui em causa é uma cultura organizacional de várias décadas que assenta no respeito, na solidariedade, tolerância, segurança e partilha que são aqueles valores que definem o grupo Bernardo da Costa.

A propósito de valores, estamos a gravar esta entrevista no Dia Mundial da Criança, 1 de junho. O que ainda há em ti de criança e de sonhador?
RC – Sou, de facto, um sonhador e empreendedor que tinha algumas metas na vida, divididas por décadas. Dos 20 aos 30 anos, procurei conhecer o mundo, viajar muito, conhecer muitas realidades. Dos 30 aos 40, procurei empreender negócios que achava que podiam ser interessantes para se associarem ao grupo. Agora, dos 40 aos 50, estou numa fase de consolidar esses mesmo negócios, apesar de não fechar a porta a nenhuma oportunidade – o que aconteceu com o KuantoKusta há poucos meses. É uma área de negócio que acho que vai ser o futuro (e-commerce, Marketplace) e nós não tínhamos nada no grupo.

A nossa entrada no capital do KuantoKusta revela precisamente esse interesse, mas, acima de tudo, queremos consolidar. Temos alguns projetos que têm três, quatro, cinco anos e que precisam de ganhar maturidade e de ser consolidados. É o que pretendo fazer nos próximos cinco anos. Essa é a estratégia das áreas de negócio do grupo, mas não fecho a porta.

Estou muito mais criterioso do que estava há dez anos. Devido também à minha atividade associativa, estou em contacto com muitas empresas, surgem muitas oportunidades e têm surgido aí algumas abordagens e situações que se podem vir a concretizar nos próximos meses, ou seja, parcerias e novos negócios.

À minha maneira

RC – Sou uma pessoa que está bem com a vida, que a maturidade da idade me foi dando e me fez ser cada vez mais espontâneo. Não estou tão preocupado com aquilo que as pessoas pensam, mas eu estou bem com a minha consciência. Gosto muito de causar impacto. Primeiro em mim, porque nós só estamos bem, se conseguimos contagiar as pessoas com esse bem. Depois, em quem está à minha volta e na comunidade onde estamos inseridos.

– Tens dois filhos…
RC – Agora tenho quatro. Os sobrinhos são meus filhos. Eles estão a viver connosco, com a minha cunhada. Portanto, tenho agora quatro filhos a quem procuro transmitir os mesmos valores da segurança, partilha, tolerância, responsabilidade, solidariedade. Procuro transmitir da mesma forma que o meu avô transmitiu ao meu pai e que o meu pai me transmitiu a mim e que eu procuro transmitir a eles. Por muitas tentações que vamos sofrendo ao longo da vida, ter esses valores bem assentes é fundamental.

Não quer dizer que não cometamos erros. Cometo erros todos os dias, tomo centenas de decisões por dia e, algumas vezes, cometemos erros, mas temos de procurar corrigir e assumi-lo, que considero fundamental.

A nível profissional, há duas características que resolvem 99% dos meus problemas. Uma é o bom senso / equilíbrio; a segunda é a coerência, praticar aquilo que dizemos. Assim, consigo resolver a maioria das situações com que me deparo no dia a dia. Há uma terceira: a autenticidade, sermos nós próprios, com liderança humanizada e focada nas pessoas.

Há uma vantagem competitiva muito grande em fatores-chave como a comunicação dentro das organizações e o departamento da felicidade. Como é que medes esse investimento? Não sei se faturo mais 10 milhões ou 20 milhões ou se tenho mais um milhão de EBITDA. O que eu sei é que tenho melhor comunicação dentro da empresa, um ambiente agradável onde as pessoas gostam de trabalhar e, acima de tudo, tenho uma equipa que se une nos momentos mais difíceis para que a empresa possa ultrapassar e possa sair melhor do que entrou desses momentos.

Sim, conseguimos

RC – Tenho um núcleo familiar muito forte à minha volta e, simplesmente, trato as pessoas como pessoas, acho que não há segredo nenhum. Depois, nos momentos mais difíceis, temos as pessoas a darem-nos apoio quando nós mais precisamos.

(Nota da Redação: o irmão de Ricardo, o empresário Fernando Costa, faleceu em dezembro de 2022)
Ainda não está ultrapassado, ainda é muito recente, só passaram cinco meses. Há aqui um contexto muito diverso, profissional, pessoal, empresarial que tem de ser ajustado. Será um processo para ir ultrapassando ao longo do tempo. Acima de tudo, vou ultrapassando com o apoio daquelas pessoas que me são mais próximas, sejam da minha família, sejam do ambiente empresarial ou do grupo de amigos que fui criando ao longo da vida.

Portugal 2043: “Temos tudo para estar no pelotão da frente da Europa”

Estamos em contagem decrescente para os 900 anos de Portugal enquanto Estado-nação mais antigo com fronteiras definidas na Europa. Como cidadão e dirigente associativo da AE Minho [Associação Empresarial do Minho] e da CIP [Confederação Empresarial de Portugal], como gostarias que o país estivesse dentro de 20 anos?
RC – Tenho dito muitas vezes que estamos num momento único e num momento decisivo para onde nós queremos chegar daqui a 20 anos. Temos tudo para, daqui a 20 anos, Portugal estar no pelotão da frente da Europa e não a ser ultrapassado (como está a ser, ultimamente) pelos países que mais recentemente aderiram à União Europeia.

Temos pessoas, conhecimento, localização geográfica e todos estes desafios que estão a acontecer neste momento – relacionados com a transição digital, com a transição energética, com esta nova revolução industrial ligada à inteligência artificial -, Portugal, pela primeira vez, tem as condições para poder liderar estes desafios e estas transições.

Falta-nos ter referências políticas, ter líderes que percebam e que tenham uma visão até 2043. E que essa visão não se limite nos ciclos políticos que, normalmente, são de quatro anos quando não são antecipados e que não sejam eleitoralistas.

Se nós conseguirmos ter um conjunto de pessoas que veja para lá de quatro anos, que veja até 2043 – com as condições que temos hoje, com o pacote financeiro que vamos receber (que pode ajudar a resolver algumas medidas estruturais) e com a coragem para fazer as reformas que o país precisa para avançar -, acredito que Portugal, em 2043, pode ser um dos melhores países para viver e um país onde (e este deve ser o desígnio de qualquer empresário) seja possível aumentar os nossos salários, para que as nossas pessoas vivam melhor em Portugal e para que não tenhamos esta situação em que jovens qualificados (em que Portugal tanto investe) cheguem ao final da sua licenciatura e a primeira opção é emigrar. Temos de conseguir fazer com que esse talento fique todo em Portugal para que nós nos desenvolvamos enquanto sociedade e enquanto nação.

E como sonhas o teu grupo nos próximos 20 anos?
RC – No meu sonho, eu gostaria que a Academia Bernardo da Costa se transformasse numa grande escola do conhecimento e do saber; que a IBD continuasse este sucesso de ser a empresa líder na área da segurança eletrónica; e que, na parte da iNERGIA, também conseguíssemos contribuir para ajudar esta transição energética que vamos viver nos próximos anos.

Acima de tudo, que estes projetos se desenvolvam e, se existisse um novo projeto, que se agregasse ao grupo pelos valores que transmitem e pelo impacto que criam na sociedade. Isto não é materialista. Eu só tenho um corpo para dormir numa casa e só tenho uma carta de condução e só consigo conduzir um carro de cada vez. Já não é isso que me move, mas, sim, o impacto que podemos causar na sociedade.