Este Natal, quero escrutínio nas instituições

Permitimos demasiadas vezes que as decisões sejam tomadas na sombra.

As notícias dos últimos tempos mostram que fazem falta instituições sólidas em Portugal. A base que suporta as decisões em Portugal é curta e todos perdemos com isso.
Os telefonemas, whatsapps e demais conversas informais minam o ambiente de negócios. As narrativas que tudo justificam, incluindo o seu contrário, também. Este informalismo no tratamento dos factos e na gestão do que é público leva a um problema recorrente: a má afetação de recursos.
As instituições criam transparência. Primeiro, fazem-no fixando factos que geram bases de entendimento comum. Segundo, fazem-no introduzindo sistemas de contra-pesos que permitem o escrutínio.
Instituições fracas – sem factos ou sem escrutínio – aliviam os decisores públicos da pressão de decidir a favor de projetos defensáveis. Simplesmente, não precisam de os defender tanto quanto seria desejável.
Os ganhos sociais dos projetos, incluindo os ganhos económicos, passam a ter um peso menor nas decisões. É natural que um governante tenha de decidir entre bens conflituantes. Com a delegação democrática de poder, essas decisões difíceis deveriam resultar na escolha pelo bem maior.
No entanto, instituições fracas que promovem pouco escrutínio ou que não registam factos acabam por permitir que seja escolhido um bem menor.
Se o resultado da escolha não impacta a probabilidade de reeleição, ou não afeta a perceção da qualidade do decisor, então este pode tomar como critério considerações que se distanciam do bem maior.
Perde a sociedade. Ganham os amigos. Mas o problema não acaba nas más decisões tomadas por quem tem poder.
Um fraco sistema de escrutínio também afeta os incentivos de quem investe. Quando um decisor público tem de escolher entre bens conflituantes, é expectável que os agentes económicos os tentem influenciar.
No entanto, com escrutínio, os agentes tentarão influenciar os decisores usando os critérios que contribuem para o bem comum. Mostrarão com maior vigor os méritos do projeto e investirão na promoção do tal bem maior.
Na ausência de escrutínio ou quando os factos se tornam apenas difusos, os mesmos agentes continuarão a influenciar, mas passam a poder usar considerações laterais. Serão postos mais recursos de tempo, esforço e dinheiro em conquistar corações de forma menos clara. Os recursos tenderão a acabar nos amigos.
Como consequência, perdemos todos: não só ficam os recursos dos agentes económicos mal aplicados e a economia com ganhos por realizar, como acabamos a atrair ou promover aqueles que prosperam na menor transparência.
As instituições e os factos são, assim, fundamento de uma sociedade e economia saudáveis. Nada disto é surpresa. Mas por cá estamos longe de aceitar a importância desta proposição.
É inaceitável que sejam tomadas decisões sem o formalismo institucional devido ou sem a aceitação de factos ou definições.
A CRESAP não nomeia quem queremos? Esvazia-se a CRESAP, introduzindo a possibilidade de reverter as suas decisões por mera confiança pessoal ou política. A CP é permanentemente deficitária? Redefina-se a noção de lucro para que passe a ter resultados positivos com transferência do Estado.
As decisões têm de ser todas escrutináveis. As pessoas têm de aceitar factos.
Por exemplo, a história do tratamento dado às gémeas tem uma forma muito fácil de ser resolvida: use-se o poder institucional para revelar factos e mostrar se, ou onde, falhou o processo de decisão.
O mesmo nos casos de Sines, do lítio ou do hidrogénio. Como é que não estão no domínio público todas as decisões de todas as agências e direções gerais que intervieram nestes processos?
Falta-nos a confiança de saber que as instituições produzem consequências.
Por pressentirmos isto, acabamos por permitir demasiadas vezes que as decisões – do condomínio à presidência – sejam tomadas na sombra.
Portugal a 20 anos: como aumentar a confiança institucional?

Economista