Figura da Semana. Vasco Pulido Valente: Um cronista que adora acidez e não gosta de açucar

Do alto dos seus 75 anos pode dizer que poucos entraram em tantas guerras, de palavras, como ele. Somou inimigos mas também admiradores. ‘Ganhou’ o ‘prémio’ de palavra do ano com a sua invenção da geringonça.

 ar de chateado permanente e o olhar de desprezo são a sua imagem de marca. Parece mesmo que nunca na vida comeu um doce, tamanha é a sua acidez. Mas é pela falta de açúcar que é conhecido já que as suas crónicas venenosas e assertivas, algumas, fazem mossa. Não gosta de novas tecnologias nem de selfies mas lança, por vezes, ‘bocas’ que são autênticos sound-bytes.
 
Quem, na política, não se lembra da picareta falante, como traduziu António Guterres? Este ano ganhou o ‘prémio’ da palavra do ano: geringonça, termo que inventou para definir a aliança entre o PS, PCP e BE, que permite aos socialistas manterem-se na governação, apesar de não terem sido o partido mais votado nas últimas eleições legislativas. Curiosamente, a dita palavra foi proferida pela primeira vez numa crónica do Público de 2015. Depois Paulo Portas usou-a num discurso no Parlamento, os jornais e as televisões apropriaram-se para definir o Governo e a geringonça estava lançada. Até o pastor da aldeia mais recôndita do país a deve conhecer.
 
Vasco Valente Correia Guedes fartou-se de ser tratado por tão vulgar nome e aos 16 anos rebatizou-se de Vasco Pulido Valente, decisão que lhe valeria críticas ao longo dos tempos, acusando-o de snob. Licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras de Lisboa, tendo-se doutorado em História pela Universidade de Oxford, Vasco entraria cedo na política como secretário de Estado da Cultura do VI Governo Constitucional, depois da vitória da Aliança Democrática liderada por Francisco Sá Carneiro.
 
O historiador não ficou lá muito tempo, como também não ficou muito tempo como deputado da Assembleia da República uns anos mais tarde quando foi eleito. Ao fim de quatro meses fartou-se da confusão e bateu com a porta. É nitidamente um homem que se dá melhor a criticar do que a construir e, por isso, estranhou-se a sua insistência na vida política nacional. Um dos seus adversários de estimação, tem muitos, é Marcelo Rebelo de Sousa a quem não reconhece qualidades de chefe nem tão pouco acredita que mande noEstado, num claro trocadilho com a palavra chefe de Estado.Os inimigos que criou ao longo da vida encheriam, seguramente, o estádio do Restelo, mas Pulido Valente pouco se importa. Andou pelos jornais, onde chegou a diretor adjunto de O Independente, e é nesse campo que continua a dar cartas, com palavras novas ou gastas.