Casa de Altura volta para Isaltino

A SUSPEITA de que o principal arguido andava a tentar vender a sua casa de férias no Algarve – alegadamente para se desfazer dela antes que os investigadores a ‘apanhassem’ – não deixou outra saída. Certa manhã, disfarçados de turistas, dois inspectores da Judiciária bateram à porta da vivenda de Altura, que Isaltino Morais mandara…

Não foram precisos mais de dois segundos para que a suspeita se confirmasse. À porta surgiu o próprio Algarvio que, sem desconfiar de nada, mostrou a casa aos potenciais compradores e confirmou os valores pelos quais ela tinha sido colocada no mercado. No dia seguinte, a procuradora do DCIAP Leonor Furtado, responsável pela investigação ao caso Isaltino , determinou a apreensão do imóvel – considerado, então, como elemento de prova da prática de crimes de corrupção contra o autarca de Oeiras.

Estávamos então em 2005 e, pouco tempo depois, a acusação contra Isaltino caía como uma bomba no meio político e judicial. Mas, mais de três anos depois, o autarca pode voltar à sua casa de Altura.

Esta semana, pela leitura da sentença no Tribunal de Sintra – que concluiu pela condenação de Isaltino a sete anos de prisão efectiva, por corrupção, abuso de poder, fraude fiscal e branqueamento de capitais -, ficou a saber-se que os crimes imputados ao autarca e relacionados com esta vivenda não foram dados como provados. A apreensão ficou automaticamente suspensa e, em princípio, Isaltino Morais poderá assumir de novo a sua propriedade.

Mas, se o tribunal devolveu a vivenda, tirou um terreno. Isaltino viu, agora, ser declarada a favor do Estado a parcela que lhe foi oferecida em Cabo Verde. Para o colectivo de juízes, este património é a prova da prática do único crime de abuso de poder imputado ao autarca tanto na acusação como na pronúncia, pelo qual Isaltino foi condenado.

Recebidos de roupão

Eram precisamente 7h14m da manhã quando o magistrado Rosário Teixeira e o juiz de instrução Carlos Alexandre, com mais três elementos do DCIAP, bateram à porta da casa de Isaltino Morais. A primeira série de buscas à residência e escritórios dos principais envolvidos no caso estava prestes a começar.

Apareceu de roupão, acabado de acordar, e assim que leu o mandado de busca não resistiu a comentar: «E atrevem-se a escrever uma coisa destas a meu respeito!»

Os dois magistrados pediram, então, ao autarca que fosse arranjar-se e, sempre acompanhados pela empregada da casa, esperaram mais de duas horas para, finalmente, iniciarem a busca na companhia do visado.

Várias horas depois, quando terminaram o trabalho, a equipa do DCIAP teve uma surpresa: os carros em que se tinham deslocado até à residência de Isaltino estavam bloqueados.

As muitas peripécias e vicissitudes por que passou este caso não se ficam por aqui e estão ainda por contar. O processo começou, aliás, da pior maneira – com uma proposta de arquivamento da PJ ao Ministério Público de Oeiras em 2003, depois de ter estado a ser investigado pelos inspectores da Judiciária desde 1998.

Foi em 2003 que o caso passou para as mãos do DCIAP, por onde os episódios rocambolescos, umas vezes, e dramáticos, outras, se repetiram. Desde a tensão com a Judiciária – que esteve praticamente ausente de quase toda a investigação a partir desse ano – até à viagem às escondidas à Suíça, para o MP acertar com os colegas locais o pedido de informação sobre as contas de Isaltino – para evitar as fugas de informação -, aconteceu quase tudo. Até um número inusitado de recursos: 12 no total, durante o inquérito e a instrução do processo. O último episódio foi o recurso da sentença por parte do condenado.