sufocante
a pressão sobre passos coelho só pode ter o efeito contrário
este artigo é publicado no dia em que termina o prazo de entrega da proposta do orçamento.
manuela ferreira leite defendeu que, em caso de abstenção, o psd devia dizer a sua posição antes desta data. é uma argumentação compreensível. ou seja, secundariza as hipóteses de negociação com o ps, provavelmente por não acreditar muito nos respectivos resultados.
pedro passos coelho, ao guardar a sua decisão para depois desta data, está a ligá-la ao conteúdo do orçamento. aliás, desde o início deste processo que se retira essa conclusão do seu comportamento. a começar pela declaração que fez no comício do pontal, com condições públicas para uma negociação.
ora, quando são colocadas condições em público, é meio caminho andado para não ser possível um acordo.
dito isto, quero tornar claro que considero contraproducentes tantas pressões públicas sobre o presidente do psd. julgo ser óbvio que tanta pressão deixa o pressionado numa situação insustentável. quanto mais solicitações são feitas em público, mais as pessoas se convencem de que a posição de pedro passos coelho é mesmo muito determinada no sentido de votar ‘não’.
ora, se assim é, se ele tem essa posição firme, se vai resistindo a tantos apelos/exigências que se vão sucedendo quase diariamente, como ficará se agora defender a abstenção? em minha opinião, nada bem.
podemos mesmo dizer que, quanto mais apelos são feitos, mais difícil se torna uma mudança de posição do presidente do psd.
pelo menos, se não conseguir um significativo ganho negocial. mas onde? na prova de que houve redução da despesa? já se sabe que não é possível. na imutabilidade da carga fiscal, nomeadamente nas deduções? mas o governo já aumentou o iva…
como é óbvio, acredito na boa-fé de todos os autores das solicitações públicas. mas, como procurei fundamentar, julgo que o efeito é o inverso do que pretendem.
intrigante
por que só se exige responsabilidade ao psd?
na semana passada, tive ocasião de recordar que as medidas do governo de josé sócrates foram anunciadas no dia em que terminavam as audiências em belém – e sem que tivesse havido qualquer cedência à oposição.
assim sendo, como compreender que quase ninguém se dirija ao primeiro-ministro – como lembrou marcelo rebelo de sousa – com tanta intensidade como tem acontecido em relação ao presidente do psd?
não será curial exigir ao governo, por exemplo, que apresente um programa de extinção de tantos organismos públicos supérfulos, como foi referido, nomeadamente, por luís marques mendes?
não será curial apelar ao sentido patriótico de josé sócrates e de teixeira dos santos para darem um passo no sentido da redução da carga tributária (e não só sobre as empresas)?
convém falar também, já agora, do sentido patriótico de outros partidos da oposição. sabemos que o pcp e o be estão, normalmente, fora do arco da governabilidade… mas o cds não está. qual o motivo para não lhe serem dirigidos apelos patrióticos?
o que aqui escrevo não pode ser atribuído a nenhuma proximidade com a actual direcção do psd. só resulta da preocupação com o que se passa e vai passar no nosso país. têm de ser tomadas as melhores decisões porque os riscos são enormes para portugal e para as pessoas, famílias e empresas que aqui vivem ou aqui operam. é melhor um voto negativo ou uma abstenção? não é por acaso que não quis dizer, até agora, a minha posição. preocupado? muito. mas não só com o orçamento. com o orçamento e com o que virá depois.
na verdade, mesmo que o orçamento passe, a questão da governabilidade continuará a colocar-se quase todos os dias.
por isso mesmo, insisto teimosamente no tema. se agora se diz que é mau o orçamento não passar, mais tarde dir-se-á que é mau demitir o governo. ou que é impossível o país perder meses com uma campanha para novas eleições legislativas. este tipo de argumentação servirá para sócrates se manter em funções até que melhore a situação económica.
extenuanteo orçamento passa e continua o desgoverno socialista?
há poucas semanas uma pessoa minha amiga, nada envolvida nas lides políticas, dizia que já não consegue ouvir discursos que invocam crises – nacionais ou externas. e, para justificar a sua aversão, dizia: «não se lembram de que há uma década se foi embora um primeiro-ministro dizendo que vinha aí o pântano? então, se era o pântano, que pode haver pior? há anos que andam com estas conversas!».
interessante observação de quem está longe da política. muitas vezes, com a vertiginosa sucessão de acontecimentos, essa perspectiva mais singela trazida pela memória do cidadão sem intervenção pública é secundarizada pela força das novas realidades.
quem leia, com regularidade, o que escrevo neste espaço, sabe que recorro com frequência à evocação das lições da história, mais remota ou mais próxima. mas aquela frase, aquele episódio que já tantas vezes invoquei, nunca o referi desse modo. se aquilo era assim, o que chamar à realidade de hoje?
na altura, por causa do que aí vinha, um primeiro-ministro optou por se ir embora. o actual tem feito tudo para continuar.
comparar as pessoas e as atitudes? não interessa agora. o que importa concluir é que o pântano aumentou, principalmente, por força do endividamento da economia nacional. vínhamos de seis anos de governação socialista e, depois dessa ‘partida’, mais seis se seguiram.
este é um factor que também importa ponderar na hora da decisão sobre o voto. passa o orçamento – mas continua a governação socialista? continua a rota que tem conduzido portugal ao estado em que se encontra?
há muito tempo que escrevo que o prolongamento da actual fórmula governativa é prejudicial ao país. mas, como tem sido abundantemente recordado, existe um condicionamento institucional que durará até à posse de quem vencer a próxima eleição presidencial.
há maneira de vencer este ‘impasse’ – uma das palavras que traduzem a actual situação do sistema político português.
e que foi a palavra escolhida por francisco sá carneiro para título de um livro seu, publicado em 1977, pouco tempo antes de o fmi iniciar as suas visitas a portugal. mas essa solução precisa de ser sentida por quem tem a responsabilidade de decidir.