Passeio a energia solar na ria Formosa

Aproveitamos as temperaturas estivais e passeámos na Ria Formosa, no Algarve, no Espírito do Sol, o primeiro barco português movido a energia solar que não polui nem levanta ondas para evitar a erosão. Um encontro com aves, plantas raras, viveiristas e veraneantes em final de época.

o cais de faro está movimentado, com o entra e sai de barcos-carreira e dos táxis marítimos que levam os veraneantes para as praias da ria formosa. passa pouco das 10 da manhã e também nós estamos prestes a embarcar. mas vamos num barco diferente. silencioso, o espírito do sol aproxima-se. «é o primeiro barco solar, 100% ecológico em portugal», garante o guia, nelson campos. o toldo azul e fininho, que parece servir apenas para dar sombra, é, na verdade, o único ‘combustível’ da embarcação, desenhada pelo português jorge severino, e com capacidade para 12 passageiros. formado por oito painéis solares, armazena a energia em quatro baterias que, por sua vez, alimentam os dois motores eléctricos existentes. «não faz qualquer tipo de poluição, nem sonora, nem com dióxido de carbono», detalha nelson. e acrescenta que o barco está também preparado para navegar sem gerar ondulação e, assim, evitar a erosão das margens da ria.

dadas as explicações, zarpamos. há que aproveitar a maré baixa para poder observar a biodiversidade local. «quando a maré sobe, as aves escondem-se. também optamos por canais secundários ou terciários, que são zonas mais calmas, porque os barcos maiores não podem passar e é mais fácil ver a natureza», explica nelson. formando um sistema lagunar que se estende por 60 quilómetros no litoral algarvio – desde a península de cacela, na manta rota, até à península do ancão, em loulé – o parque nacional da ria formosa é um labirinto de sapais, dunas, ilhotas e canais. aqui habitam moluscos (284 espécies), peixes (79), répteis (15), anfíbios (11), mamíferos (18) e 214 espécies de aves, que não tardam em dar o ar da sua graça.

de binóculos em riste, avista-se uma cegonha branca, imponente, do alto das suas pernas cor-de-laranja, da mesma cor do bico. depois, surgem os colhereiros, assim chamados devido ao seu bico em forma de colher. e ainda uma garça branca pequena. não muito longe, as andorinhas do mar fazem o seu bailado. usando a força do corpo, uma faz um voo picado e mergulha de cabeça. traz um peixe, que uma companheira, invejosa, tenta roubar. sem sucesso, até que, a pescadora habilidosa aterra no sapal e partilha a refeição com a adversária. «não é comum», assevera nelson, que trabalhou num centro de recuperação de aves.

de cabelos ao vento, continuamos, agora focados nas margens. a zona de sapal está coberta de morraça, que submerge quando a maré sobe. a sarcocónia, a cistanca – que só existe no algarve, sul de espanha e creta – e a sapeira, também conhecida por lavanda do mar devido ao aroma e à cor roxa das suas flores, compõem o quadro. o toque final é dado pela salicórnia ou espargos do mar, uma especialidade da ria, que surge nas zonas de salina, muito apreciada pelos franceses, que já a usam em receitas culinárias, aperitivos ou saladas. há até empresas ligadas à salicultura que têm tentado produções em grande escala.

entretanto, uma garça real realça o castanho escuro da terra na zona dos viveiros. aqui, os viveiristas escavam pacientemente com pequenas pás, cuidando das suas culturas de amêijoas. «é como a agricultura. se não tratarem dos viveiros, ficam sem toda a produção», afiança nelson, sublinhando que no parque natural da ria formosa concentra-se 80% da produção de amêijoa do país.

aqui e ali, avistam-se pescadores à procura de isco. numa cabana verde, duas mulheres consertam uma rede de pesca. um homem mantém-se imóvel, imerso até ao pescoço. «provavelmente tem uma rede numa mão e com a outra vai remexendo a terra do fundo da ria, para apanhar caracóis do mar», arrisca o guia.

à medida que nos aproximamos da ilha de faro, a existência de casebres e pequenas habitações aumenta. indiciam que, por ali, a presença humana começa a fazer parte da paisagem. a circulação de barcos – muitos em excesso de velocidade – agita a calmaria das águas salgadas da ria.

e é já com terra à vista que nelson explica: «na verdade, a ilha de faro é uma península, já que está ligada ao continente pelo ancão. seguindo a pé, vamos ter à praia do gigi, na quinta do lago». aqui, há várias casas de férias e muitas famílias, a pé ou de barco, rumam a banhos nas praias das ilhas da ria, de chapéu-de-sol debaixo do braço. vêem-se também grupos de cócoras, lenço na cabeça, a apanhar amêijoa. alguns já têm baldes e sacos de rede bem aviados. seja para consumo próprio ou para venda, há que tratar do almocinho, antes que, daí a pouco tempo, a maré suba. há pais e filhos a jogar futebol no areal. as crianças aproveitam para apanhar estrelas-do-mar e as conchas brancas que polvilham a areia.

de regresso, ainda miramos os ostraceiros, que parecem pinguins mas com bico laranja. um maçarico real esgravata na areia, à procura de petisco, usando o seu bico longo e curvado para baixo. um fuselo, de tons castanho e de bico comprido faz o mesmo. uma rola marinha sobrevoa a embarcação.

«sintam este cheiro», adverte o guia, enchendo os pulmões de ar. enquanto, absorvemos o silêncio, apuramos o nariz para sentir o cheiro a terra molhada, a crustáceos e a relva húmida. na memória, levamos o espírito da ria.

ana.serafim@sol.pt

 

sunquays

urbanização montebranco

rua das violetas, lote p 2ºa

gambelas – faro

tel. 910 801 801

info@sunquays.com

www.sunquays.com

onde ficar

hotel real marina & spa

av. 5 de outubro

olhão

tel. 289 091 300

www.realhotelsgroup.com