a receita adicional é facilmente calculada, abstraindo efeitos cruzados no plano macroeconómico que podem complicar as contas, e o impacto é de certo modo anestesiante, não se sentindo de imediato aquando do recebimento dos salários e outros rendimentos, mas apenas à medida que o rendimento disponível vai sendo aplicado na aquisição de bens e serviços.
no entanto, convém não esquecer que existe um enquadramento constitucional que rege a política fiscal do nosso país. as alterações cegas no plano das taxas de iva podem, facilmente, ferir esses ditames constitucionais colocando-as, por vezes, no plano da ilegalidade.
a chamada ‘constituição económica’ estabelece que incumbe prioritariamente ao estado, no âmbito económico e social, promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal (art. 81º, al. b). já no tocante à denominada ‘constituição fiscal’, prescreve-se que o sistema fiscal visa uma justa repartição dos rendimentos e da riqueza (art. 103º, nº 1, segunda parte). finalmente, importa referenciar, no que respeita concretamente à tributação sobre o consumo, a determinação que a mesma visa adaptar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo (art. 104º, nº 4).
francamente, não se vê como é que o aumento nominal das taxas de iva (reduzida, intermédia e normal) e a alteração de taxas aplicáveis a certos produtos (sempre com vista ao seu aumento), contribui para o nosso desenvolvimento económico, antes pelo contrário, só pode induzir uma redução do consumo e a continuação de um ciclo recessivo. quanto à justiça social e à distribuição do rendimento, é suficiente dizer que um imposto não progressivo como o iva, ao ser aumentado, tem obviamente um impacto negativo mais significativo nas pessoas de baixo rendimento. ou seja, se esta alteração prevista para as taxas do iva se vier a concretizar, como tudo indica, há de certeza um princípio constitucional que não foi violado: o que dispõe que o sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do estado e outras entidades públicas (art. 103, nº1, primeira parte). não chega.
paulo mendonça (tax partner)