Em busca de raridades

Chegou por fax a informação de mais uma peça que tanto pode ser uma raridade como uma imitação sem história, mas nestes casos Mário Roque não arrisca. «Vou ver. Aprendi a não desvalorizar nenhum contacto. Às vezes acontece valorizarem algumas peças e não dão nada por outras que são realmente especiais», diz.

como o tabuleiro lusíada que encontrou num restaurador pintado de castanho e que quando a tinta saltou deixou a descoberto a madeira lacada a ouro e madrepérola, do século xvi. «de todos os exemplares conhecidos é, seguramente o mais recuado», pode ler-se no catálogo da são roque – antiguidades e galeria de arte. mas nem sempre é assim: «em 99% das vezes não há nada de interessante», comenta.

a mãe, maria helena roque, fundadora da casa, em 1992, segue de perto os passos do filho. «acabo por me entusiasmar com as peças e tentar acompanhar as viagens e as compras». a índia é um dos locais com mais ‘tesouros’. foi de lá que um dia chegou outro fax em péssimo estado a dar conta de um achado que à primeira vista parecia fantástico.

avançou com o sinal e seguiu no seu encalce. para espanto de mãe e filho, foi-lhes parar às mãos um cofre lusíada de influência mongol, do século xvi/ xvii, tão raro nas suas dimensões e nos motivos decorativos, que o estado o acabou por adquirir.

frequentemente as obras que passam pela s. roque vão parar ao acervo de museus, o que atesta a idoneidade das aquisições num mercado que convive dia-a-dia com falsificações. «são mais frequentes na pintura, mas também surgem móveis», confirma mário roque. são precisos mil olhos e muitas precauções para não deixar passar ‘gato por lebre’.

e na hora de catalogar as peças apostam no rigor da informação enumerando até o mais ínfimo defeito. «compramos em exposições dos próprios pintores, temos peritos associados e pertencemos à apa [a restrita associação portuguesa de antiquários, que conta 57 associados do sector], o que também é uma garantia para quem compra».

foi um acaso. maria helena roque, professora de física e química, fazia terapia quando o médico a desafiou a fazer algo que gostasse. coleccionadora de uma vida, viu nas antiguidades a resposta para os seus males. a receita operou milagres.

a primeira morada da são roque era mais modesta e acanhada, mas a selecção do acervo valeu-lhe o reconhecimento entre os pares. «o sucesso tem a ver com o rigor que a minha mãe sempre teve», reconhece o filho. desde criança, acompanhou-a a antiquários, leilões e no contacto com os coleccionadores.

em 1975, mário roque prosseguiu os estudos na bélgica, onde cursou medicina. ao mesmo tempo, alargou horizontes na arte contemporânea. fez-se médico, mas não descuidou o interesse pelo mundo artístico, que o fascinava e que ganhou terreno. «cada vez sou mais antiquário e menos médico», reconhece. a mãe tem pena que «desperdice a carreira médica», mas aceita a escolha do filho.

em 2007, as mudanças de instalações para o número 199b, da rua de s. bento, permitiu que as antiguidades – mobiliário, faianças indo-portuguesas, companhia das índias, arte sacra – partilhassem o espaço com mestres da pintura, como chagall, miró, dali, malhoa, silva porto, paula rego, vieira da silva, souza cardoso… (deste último tem um quadro de 1911, que nunca pôs à venda, tal é o apego pela obra).

agora organiza exposições com quadros do acervo, «peças raras de cada pintor». a mais recente, que se pode visitar até ao final do ano, intitula-se olhar graça morais, que considera uma amiga. e algumas obras são verdadeiros achados do início de carreira da pintora transmontana.

são roque – antiguidades e galeria de arte

rua de s.bento, 199 b, lisboa
tel. 213 960 734 
www.antiguidadessaoroque.com

sandra.nobre@sol.pt