é o entretenimento a escorraçar a arte das salas, a promover cada vez mais uma relação com a imagem que exige espectacularidade, fogo-de-artifício permanente, um ritmo de montagem vertiginoso e um sem-fim de atributos que tornarão quase impossível para uma criança que hoje nasça conseguir ver os filmes que marcaram a nossa adolescência sem um desconforto imenso, viciada que estará neste frenesim visual.
ora a grande novidade do mercado das televisões para este natal é precisamente a adopção da tecnologia 3d, com uns quantos pares de óculos incluídos, preparando-nos para o que – diz-nos o ritmo das revoluções nesta área que num piscar de olho tornam tudo o resto obsoleto – provavelmente será regra daqui por dez anos. já dá para imaginar um jogo de futebol em que o remate de cristiano ronaldo acabe quase no chão da nossa sala, em que o perdigoto de um pivô de telejornal quase nos atinja em cheio na cara ou a telenovela em que tentaremos impedir com a mão que o vilão faça a vida negra a toda a gente.
mas dá também para antecipar a crescente alienação que a televisão parece propor-nos caso adoptemos todas as suas novidades. é uma velha conversa, a da leitura praticamente condenada às mãos da miríade de canais na tv, mas é uma imagem mais perturbadora pensar que num futuro próximo poderemos ter de estar todos de óculos enfiados na cara, no nosso pacato lar, para ver o que a televisão nos mostra. ao desviarmos o olhar do ecrã, desconfio, vamos ter a impressão de que a realidade, ela sim, está ligeiramente desfocada.