Fora de série

Depois de actores, guionistas e realizadores terem sido atraídos pela luz incandescente da televisão – e ao mesmo tempo que o cinema perde força –, chegou agora a vez de também o romancista indiano Salman Rushdie não resistir ao apelo a um ecrã que cada vez mais deixará de ser pequeno (em todos os sentidos).…

a showtime, recorde-se, é uma casa que privilegia o risco e a experimentação, acolhendo séries como dexter, californication, erva, shameless ou a letra l. daí que a perspectiva de ter rushdie a desenhar uma série que se debruçará sobre a cultura norte-americana contemporânea, com particular incidência em sexo, política, religião e ciência, prometa antecipadamente um debate fervoroso à volta de um país que oferece em toda a sua diversidade e nas suas contradições um material ficcional invejável. sob essa luz, o autor de versículos satânicos é uma escolha pouco inocente.

mas o que é verdadeiramente curioso é a forma bicéfala como os estados unidos se relacionam com a sua cultura. se séries como erva ou californication, uma mãe de família como traficante de droga ou um escritor em bloqueio criativo compensando-se com uma compulsão sexual, têm provado ser premiáveis e rentáveis, o sucesso estrondoso de charlie sheen em dois homens e meio não foi suficiente para o defender da sua vida privada. os estados unidos gostam de se ver ao espelho mas apenas sob a capa da ficção. de resto, é varrer para debaixo do tapete. charlie sheen, claramente, andou a ver séries a mais.