‘É mais fácil ser gestor do que político’

O impacto do pedido de ajuda externa na imagem de Portugal lá fora, as experiências de liderança em vários países e a importância de liderar de modo sustentável são abordados pelo vencedor na categoria de Líder Internacional do Best Leader Awards, Luís Pais Correia, CEO da Dalkia no Norte da Europa.

Lá fora, que percepção se tem dos líderes portugueses?
Antes de estar no Reino Unido vivi seis anos na Suíça. Nos últimos 25 anos morei mais de metade no estrangeiro, e os líderes são iguais em todo o lado. Há bons e maus. Só que Portugal é muito pequenino e o mercado também, pelo que tudo é ampliado. Quando as empresas têm bons resultados, os líderes são génios; quando têm maus, são falhados. Há vários portugueses com sucesso lá fora, mas muitas vezes única e exclusivamente porque é um mercado mais aberto e há mais meritocracia. Os líderes que estão no estrangeiro, de certeza que têm boa imagem, senão não estariam. Ninguém que esteja a trabalhar para uma empresa estrangeira está lá porque é primo de alguém. Está pelo mérito.

No seu percurso sentiu que era mais fácil liderar com sucesso fora de Portugal?
Senti que a margem de progressão é muito maior.

Com a ajuda externa, a imagem do país sai afectada? Sendo português, fazem-lhe perguntas sobre o assunto?
Claro e, geralmente, não são perguntas muito agradáveis. Mas não estamos sozinhos nisto. A Irlanda é dos países que conheço com maior espírito empresarial – continua a crescer a 7% ao ano na área industrial – e caiu no mesma ‘armadilha’. Mas não me parece que a imagem de Portugal saia prejudicada. Acho que saiu prejudicada por não o termos feito há mais de um ano. Todos sabiam que era inevitável.

Nem a imagem dos líderes portugueses sai beliscada?
A imagem de quem tomou esse tipo de decisões sai beliscada. Quem vier a seguir, certamente terá outro tipo de atitude. Mas tenho muito respeito pelos políticos. É mais difícil ser político do que gestor, porque nós gerimos factos, concorrência, mercados. Quando tem que se gerir percepções, opiniões, subjectividades, é mais complicado.

Além de Portugal, esteve na Holanda, Suíça e dirige a divisão da Dalkia do Norte da Europa. Que diferenças há na forma de liderar nos vários países?
Tem que se ter uma maior dose de bom senso para ter em conta as percepções e as culturas locais. Em Inglaterra, quando se faz uma entrevista de recrutamento, não se pode perguntar a idade do entrevistado, o que para nós, portugueses, parece absurdo. Se o fizermos, pode ser considerado discriminação e podemos ser alvo de um processo. Gosto de trabalhar no Norte da Europa, porque gosto de tudo organizado. O que menos gosto em Portugal é o ‘desenrascar’, o atraso, as desculpas.

Também deve ser diferente liderar e motivar equipas britânicas, suíças, portuguesas…
Sim. O tipo de humor de cada um é completamente diferente, por exemplo. Mas também há aspectos comuns: é fundamental dizer a verdade às pessoas, sejam as perspectivas boas ou más, para que possam participar nas decisões. Quando a crise aconteceu na Irlanda, por iniciativa do management houve um corte de ordenado proporcional: no topo foi de 25% e mantivemos os salários mais baixos. Mas ficámos com todos os postos de trabalho e isso cria mais valor para a empresa do que despedir 20% dos quadros. Mostra que há preocupação social. No Norte da Europa, na Escandinávia e Suécia, os sindicatos estão representados nos conselhos de administração, fazem parte da tomada de decisão. Há maturidade. Esta crise talvez seja uma oportunidade para que possamos ter um diálogo social menos baseado no conflito e mais em objectivos comuns e diálogo.

As preocupações com a sustentabilidade, responsabilidade social ou com o ambiente já estão espelhadas nas lideranças?
Sim. Em Portugal também, mas talvez de modo menos generalizado. Todas as empresas que tenham actividade internacional têm de ter uma postura social, ética e de respeito pelo ambiente, ou não conseguem conquistar mercado e isso é que fará a diferença entre as empresas que vão sobreviver, progredir e crescer e as que vão desaparecer.

Que comentário lhe merecem as opiniões que apontam estas questões como puro marketing?
Não podia discordar mais. Não só são factores diferenciadores, como factores de sobrevivência. Por exemplo, no recrutamento dos jovens vemos que querem ir para empresas com uma posição sustentável e responsável. Tenho amigos que trabalham em petrolíferas e é extremamente difícil contratarem, já para não falar na indústria do armamento. Em Londres há muitos banqueiros e, no seguimento da crise, muitos decidiram desistir e ir dar aulas, passar para a agricultura, fazer algo diferente. Isso é sintomático de que o que as pessoas amanhã vão procurar e consumir tem que ter sustentabilidade e uma grande dose de responsabilidade social incorporada.

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ana.serafim@sol.pt