A guerra que fez

Os primeiros tiros contra o Forte Sumter foram disparados pela artilharia confederada, na madrugada de 12 de Abril de 1861; 33 horas depois, a guarnição unionista, sem baixas, rendeu-se e foi embarcada de volta ao Norte. Os atacantes também não tiveram perdas.

quatro anos passados, a 9 de abril de 1865, em appomattox, na virgínia, ulysses s. grant, pelo norte, e robert e. lee, pelo sul, assinaram o acordo que pôs fim à guerra civil americana.

entre o derrotado lee e o vitorioso grant, as coisas correram com a cordialidade e respeito de camaradas de armas que a política tinha obrigado a enfrentar-se. agora reconciliavam-se: os vencidos entregavam o armamento, mas os oficiais podiam guardar as armas pessoais e todos os sulistas levar de volta os cavalos, propriedade sua.

entre estes dois episódios de brandos e correctos costumes, acontecera uma guerra em que tinham morrido 620 mil soldados (360 mil do norte e 260 mil do sul), mais 50 mil civis. a guerra civil é, ainda hoje, a primeira guerra em termos de baixas dos estados unidos.

havia 30 milhões de norte-americanos em 1860: 20 milhões de brancos e meio milhão de negros no norte e 5,5 milhões de brancos e 3,5 milhões de negros no sul. estes negros do sul eram escravos, na sua maioria filhos de escravos, já que o tráfico cessara desde o fim do século xviii.

abraham lincoln não acreditava na igualdade de brancos e negros, mas era pela sua igualdade legal, logo pela abolição. a maioria da população do norte pensava como ele. por isso quando foi escolhido pelo partido republicano e ganhou a presidência, os representantes de sete estados esclavagistas reuniram-se em montgomery, alabama, e prepararam a secessão, elegendo um presidente alternativo – jefferson davis.

lincoln procurou o diálogo com os separatistas; havia ainda estados fronteiriços, oscilantes entre a confederação e a união, e muitos no deep south – pensava-se – eram leais à união.

mas a economia do sul vivia do algodão e este do trabalho escravo. a questão tornara-se vital e os sulistas temiam não só a abolição como a revolta dos ‘seus’ negros. o ataque ao forte sumter arrumou as dúvidas e em maio de 1861, a divisão norte- sul era clara.

uma guerra desigual: o sul tinha um exército mais pequeno, de 900 mil homens contra dois milhões do norte. plantadores, agricultores e pioneiros, os sulistas estavam mais preparados para a ‘vida militar’. em inferioridade de homens, território, economia e reconhecimento internacional, tinham de obter uma vantagem estratégica inicial e fixar aí uma negociação. não conseguiram e no tempo longo foram esmagados.

a guerra civil americana foi a primeira guerra moderna – com espingardas de repetição, metralhadoras, caminhos de ferro e, no mar, os couraçados e o submarino.

também houve inovação no financiamento: o norte tinha recursos através das exportações de cereais para a europa e a correspondente entrada de ouro e recorreu às obrigações do tesouro e à emissão do papel-moeda.

o sul era mais pobre, embora ali os ricos fossem mais ricos ou vivessem mais como ricos. a nostalgia de uma civilização rural desaparecida levou mark twain, faulkner, tennessee williams, griffith e victor fleming a romantizarem na literatura e no cinema o sul e a confederação.

mas os grandes plantadores eram uma minoria. embora dominassem o governo e a sociedade, a ideia dos ‘escravos felizes’ não conseguiu aguentar a pressão abolicionista que livros como a cabana do pai tomás despertaram na opinião pública. e foi com base nessa ‘maldade’ dos ‘rebeldes’, que sherman lançou a sua coluna negra através da geórgia, queimou atlanta e chegou a savannah na véspera do natal de 1864.

partira, como grant fizera antes a oeste, o sul a meio, e levara o terror e o medo ao coração da terra rebelde, mas os estados unidos iam renascer mais fortes desta guerra de irmãos separados.