Resultado Líquido

José Sócrates alertou ontem os portugueses, no tom dramático de quem está em campanha eleitoral, que vamos ter saudades do PEC. Trata-se de um exercício de pura hipocrisia, em que o primeiro-ministro alimenta a ilusão que o PEC chegaria para acalmar os mercados, livrando-nos da ajuda externa.

 a verdade, porém, é que as medidas do documento não seriam suficientes. porquê? porque já não havia, antes do ‘chumbo’, quem desse um cêntimo por nós. não é possível acreditar num governo que ‘martela’ sucessivamente as contas, desculpando-se, depois, com as exigências do eurostat, como se verificou agora com a nova revisão em alta do défice de 2010, desta vez por causa das scut. o problema da falta de confiança tem uma componente ‘histérica’ – o ‘efeito dominó’ dos mercados – mas, sobretudo, uma vertente estrutural: a economia não cresce, o governo não é assertivo no corte da despesa e vive de fantasias, insistindo (como se confirma com o programa eleitoral do ps apresentado esta semana) em obras como o tgv e o aeroporto.

não teremos, portanto, saudades do pec, até porque ele não existiu. poderemos, sim, ter saudades da ilusão em que vivemos durante décadas, gastando o que não tínhamos e vivendo de aparências. chegou a conta. e é bom que não se alimentem ilusões. não viveremos um ano ou dois em contenção. passaremos os próximos quatro ou cinco em aflição. e talvez daqui a sete ou oito o país apresente um crescimento digno desse nome. até lá será o back to basics ou, numa linguagem metafórica, o país – a maior parte dele – viverá o ‘amor e uma cabana’. está na hora de voltarmos a ser felizes com as coisas simples da vida. quem sabe um dia não teremos saudades de viver, apenas, com o que temos, sem dever nada a ninguém?

ricardo.d.lopes@sol.pt