a pergunta sacramental interroga em que medida o programa se enquadra dentro da lógica do serviço público de televisão. e a resposta é que – pensando num serviço público que se substitui ao privado na garantia de uma programação diferenciada e que zela pela manutenção de um patamar mínimo de dignidade e qualidade – sim, não há dúvidas de que último a sair concorre para essa definição. o falso reality show, como bruno nogueira já afirmou em entrevista, é um programa de ficção que, na essência, em nada difere de conta-me como foi ou estado de graça. e que, pela sua fórmula arriscada, dificilmente encontraria receptividade num privado.
a pouco mais de uma semana de eleições para um novo governo e perante o fantasma da privatização da rtp, importa reflectir sobre o que os canais do estado oferecem de verdadeiramente distinto. nesse sentido, telenovelas pós-almoço, programas como quem tramou peter pan? ou concursos como quem quer ser milionário, por exemplo, não destoam na programação de qualquer canal. mas a aposta em documentários, cinema criterioso ou séries de ficção está quase integralmente do lado do estado.
a esse serviço público agradecemos, de resto, a exibição – termina este domingo – que a rtp1 tem vindo a fazer em horário nobre da excelente série mistérios de lisboa, adaptação do livro de camilo castelo branco pelo cineasta chileno raúl ruiz. foi primeiro muito longa-metragem nas salas, é agora uma versão alargada para o pequeno ecrã. porque o entretenimento não pode ser apenas gente a pesar-se ou a brincar às tribos.
