Marchas de Lisboa com um cheirinho a Angola, Brasil e Nepal

Um nepalês de arco e balão. Um brasileiro que troca o samba pelas marchas de Lisboa. Estranho ou talvez não, são a nova realidade de marchantes dos bairros lisboetas, que alargaram fronteiras e atraem gente de todo o mundo.

ser marchante é ser bairrista, mas os bairros típicos da capital mudaram. do nepal ao brasil, passando por angola, as marchas de lisboa chamam novos participantes atraídos pelo mais típico da cultura nacional.

kamal gurung, 30 anos, está em portugal há cinco anos, depois de ter emigrado do nepal à procura de um sítio mais seguro para onde pudesse levar a família. tem um restaurante de cozinha nepalesa e entre as suas muitas paixões está o gosto por conhecer diferentes culturas. daí até integrar a marcha de belém foi um passo.

«vi numa revista da junta de freguesia de belém em que pedia que quem quisesse [ser marchante] se inscrevesse no belém clube e eu pensei porque não tentar uma vez. desde há dois, três anos que eu vou sempre ver à avenida da liberdade e acho muito giro», contou à lusa.

quanto a marchar e a aprender as coreografias, kamal disse não se ter sentido atrapalhado porque, assegura, dança bem e no nepal chegou a entrar em concursos de dança e a ganhar alguns prémios. o problema está na língua, que «foi difícil aprender», porque como bom marchante também tem de saber cantar.

«eu sou um mau cantor e também não canto muito bem em nepalês. cantar em português é ainda mais difícil, mas eu vou conseguir», afiançou e provou com convicção, cantando logo de seguida parte da letra de uma das músicas.

do país da mais alta montanha do mundo, o monte everest, o salto faz-se para o país do samba que tem em wesley fonseca um digno representante nas marchas de 2011.

foi uma amiga que lhe lançou o desafio porque sabia que wesley gosta de «dançar e de conhecer diferentes culturas», apesar de desconhecer por completo o que são as marchas de lisboa.

«na altura eu perguntei: o que é uma marcha? e ela disse-me: olha, pensa no carnaval do brasil. é quase a mesma coisa, mas com a cultura portuguesa. e eu falei: ah, então eu quero participar!», contou.

wesley fonseca apontou que no brasil «a dança parece que está no sangue e já nasce com a maioria das pessoas», o que facilitou então, a aprendizagem dos passos e das coreografias.

«estou a gostar muito e no ano que vem, se puder, quero participar de novo», disse, entusiasmado.

o entusiasmo estende-se aos amigos, a quem conta todos os dias o que se passa nos ensaios e que já se referem às marchas como o «samba português».

«já intimei todos. ao pavilhão [atlântico] só vão alguns, mas à avenida da liberdade vão praticamente todos os meus amigos brasileiros porque eles querem conhecer», adiantou.

do brasil, o salto faz-se até angola, de onde gilberto, 24 anos, saiu em direcção a portugal quando tinha 13. mais habituado aos ritmos do ‘kizomba’ ou do ‘kuduro’, não conseguiu resistir ao desafio de dançar ao ritmo das marchas.

«ao princípio estranhei um bocado, mas não foi assim tão difícil a adaptação visto que em angola também temos as nossas danças tradicionais e depois também gosto de dançar. tive dificuldade em alguns passos, mas com outros adaptei-me rapidamente», explicou à lusa, no final de um dos ensaios.

gilberto admite que nunca lhe tinha pensado em participar numa marcha, «até porque não sabia nem fazia ideia de como ser marchante», mas, agora que está quase a chegar o dia da apresentação no pavilhão atlântico, a certeza é só uma: «se surgir o convite para voltar para o ano, cá estarei».

lusa/sol