ambos fizeram muitas obras neste país e ambos sofreram muito por causa do que quiseram fazer.
imagine-se: fontes pereira de melo quis introduzir o caminho-de-ferro em portugal mas ouviu de tudo. oliveira martins chegou a escrever: «o caminho de ferro é um instrumento de uma energia incomparável, sem dúvida, mas é um instrumento apenas. aplicado a um organismo são e capaz de o suportar, revigora-o; aplicado, porém, a um organismo depauperado, extenua-o. pelos caminhos-de-ferro, esquecemos a terra, mãe omnípara de toda a riqueza». (o.m., fomento rural e emigração, lisboa, guimarães, 1956).
na página 129 do livro sobre duarte pacheco escreve-se que oitenta anos volvidos, e nas palavras do próprio, decretava-se o restabelecimento do «antigo ministério das obras públicas, para nele se promover a concentração de todas as obras de fomento que interessam à melhoria dos serviços do estado e das condições económicas da nação».
ora, nesse texto do livro escreve-se sobre duarte pacheco. «o antigo ministério das obras públicas ao qual duarte pacheco se referia era o ministério de fontes pereira de melo».
este antigo presidente do conselho deixou 6.500 km de estradas, 1.500 km. de caminhos-de-ferro e 6.000 km de linhas telegráficas. nem todas essas obras a ele se devem. mas a esmagadora maioria é de sua responsabilidade.
e note-se que, como escreve a citada autora, «as ideias de oliveira martins assumiram, durante décadas, o estatuto de verdade indiscutível». e logo acrescenta: «e, no entanto, não se vê como portugal se poderia ter desenvolvido sem uma rede de transportes».
hoje em dia, como se sabe, as populações clamam contra o encerramento de ramais ferroviários por entenderem que isso representa um grande golpe nas suas aspirações de combate à decadência e à desertificação.
‘o sonhador de grandes coisas’
quanto a duarte pacheco, sabem o que lhe devemos, entre outras obras?
por exemplo, o aeroporto de lisboa, o estádio nacional, a marginal lisboa-cascais, o instituto superior técnico, o instituto nacional de estaística, a fonte luminosa, as gares marítimas de alcântara e da rocha do conde de óbidos, o parque de monsanto, etc. isto, só na zona de lisboa. notável! por todo o país foram 500 km de estradas nacionais e municipais, obras profundas nos portos de leixões, viana do castelo e setúbal, e muitas de hidráulica agrícola. construiu vários bairros sociais. urbanizou as zonas envolventes dos palácios de queluz, da ajuda e dos jerónimos. a que se devem juntar hospitais e muitas, muitas escolas e liceus.
a sua política de solos foi revolucionária e as suas expropriações incomodaram muito. como se escreve nesse livro, depois do 25 de abril a ponte salazar mudou de nome mas o viaduto duarte pacheco, obra do notável ministro que foi também presidente da câmara municipal de lisboa, manteve a justa designação.
sobre o estadista escreve, nessa obra, na pág. 25, sandra vaz costa: «a vida de duarte pacheco foi curta: 43 anos, 7 meses e 7 dias. nesse mesmo espaço de tempo angariou admiradores e adversários. a sua presença não foi discreta e a sua forma de fazer política não foi consensual… a classe política estremecia à exposição das suas ideias e o governo oscilava entre o temor do embaraço e a certeza da obra feita». sobre ele, os seus opositores lançaram um dito: «a pior província do país é o algarve. a pior vila, loulé. a pior família, os pachecos. e o pior dos pachecos, o duarte». muitas vezes portugal é assim.
os seus admiradores chamaram-lhe ‘o edificador’. cottinelli telmo, outro grande criador, chamou-lhe o ‘sonhador de grandes coisas’.
em portugal ataca-se quem faz obra
esta semana escrevo sobre estes dois nomes grandes da história próxima de portugal por uma razão simples: para incentivar todos os que têm de tomar decisões difíceis em nome de portugal ou de uma região, ou de um concelho, ou de uma freguesia, a não esmorecerem.
esses dois homens tiveram de ouvir muito ataque. de duarte pacheco disseram, por exemplo, que o técnico era um horrível conjunto de caixotes. a fontes pereira de melo acompanhou-o sempre a fama de ‘perdulário’. foram nomeados, substituídos, afastados, nomeados de novo.
portugal passa muito tempo a discutir e a impedir que se decida. importa ouvir mas não ter medo de decidir. fontes pereira de melo fez o que entendia dever fazer e, hoje, o seu nome liga, na capital de portugal, o centro à praça do saldanha.
duarte pacheco agia mais depressa do que o som das palavras dos seus críticos e hoje, como disse, tem o seu nome no viaduto que liga a auto-estrada ao centro de lisboa. estão, aliás, essas vias na continuação uma da outra.
muito importante: na obra sobre o ministro mais famoso dos muitos que salazar teve, escreve-se na pág. 146: «duarte pacheco percebeu cedo que em política não se vive, apenas se sobrevive e ainda assim com uma equipa. e a sua maior força, a sua maior autoridade, advinha da equipa que formou».
portugal tem muitos exemplos da ‘gente’ que faz andar o país para diante. convém lê-los. felizmente, também temos quem estude, investigue e escreva muito bem. como os autores das obras aqui referenciadas.