ficam sempre bem estes gestos de solidariedade potencial, numa altura em que as classes baixa e média, um pouco por todo o mundo, se vêem a braços com sobrecargas de impostos e com a perda de regalias e apoios sociais. a ideia faz mais sentido nos eua, depois de bush ter aliviado os milionários. mas, na europa, em profunda crise e desintegração do euro, também faz, incluindo em portugal.
ainda que sejam comoventes, estes laivos de generosidade não passam disso mesmo: declarações de intenções, onde é inevitável encontrar traços de alguma hipocrisia e, sobretudo, demagogia. a solidariedade não se professa, pratica-se. por isso, mais do que pedirem para pagar mais impostos, os gestores ricos, que agora parecem perder o sono preocupados com as contas dos pobres, devem passar à acção. podem, por exemplo, baixar os seus salários, frequentemente de milhões de euros por ano, distribuindo umas centenas de milhar pelos colaboradores mais desfavorecidos (é verdade, isso agravaria os seus escalões de irs, mas compensaria, porque, para quem ganha muito pouco, pouco mais faz diferença). ou podem usar a margem de baixar os seus salários para criar mecanismos de apoio social nas empresas. não é preciso – ainda que seja simbolicamente importante e moralziadora – uma lei que obrigue os ricos a pagar mais. a solidariedade não carece de autorização legislativa. ou será que até para serem solidários os empresários têm que depender do estado?
ricardo.d.lopes@sol.pt