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a meio da prova já não sabemos se estamos em lisboa ou nas ilhas onde em 1819 chegaram os primeiros pés de cacau por ordem do rei d. joão vi, o clemente. mas a história não foi muito clemente para este fruto que cresceu praticamente ao abandono na ilha até o agrónomo tropical claudio corallo descobrir este tesouro nas densas matas do príncipe. o mais curioso é que tudo começou não com o cacau mas com o café, e não em são tomé mas no zaire, então congo…
em 1974 claudio corallo deixou florença, a sua cidade natal, e rumou até áfrica, onde trabalhou em projectos de apoio ao desenvolvimento. mas, desencantado com o que viu no terreno, desvinculou-se da cooperação italiana e passou a trabalhar numa empresa de plantação e comercialização de café.
foi aí que começou a interessar-se por este produto ao ponto de voltar a abandonar tudo para comprar duas plantações em plena floresta congolesa. antes disso porém, conheceu elisabete (bettina), filha do embaixador português antónio baptista martins, então » colocado no país. mal ela completou 18 anos, casaram-se e juntos rumaram às plantações de café.
«quando cheguei lá, ficaram todos a olhar para mim. queriam tocar-me e mexer-me no cabelo. tudo porque nunca tinham visto uma mulher branca», recorda bettina. o casal passou a viver isolado no meio da floresta – sendo apenas visitados por búfalos, elefantes e leopardos – e inteiramente dedicado às plantações de café robusta. só que a instável situação política na região obrigou-os a abandonar o país em 1995 e a procurar outro lugar para se fixarem. são tomé foi o destino escolhido.
a primeira viagem
é na plantação do terreiro velho, na ilha do príncipe, que começa o processo que faz deste chocolate um produto único no mundo, já que tudo é feito à mão e guiado por um conhecimento apurado ao longo de décadas. «quando nos mudámos, eu e o claudio vivíamos numa cabana junto à praia só para estarmos mais perto da plantação e controlar melhor todo o processo», recorda bettina, que reconhece que o cenário parece bem mais romântico do que de facto era: «o constante barulho do vento na chapa de zinco que fazia de telhado e as ondas sempre a bater nas rochas, além de uma humidade insuportável, faziam daquele lugar um sítio tudo menos tranquilo».
hoje já não vivem em plena plantação mas continuam a participar na apanha do cacau, num período que começa em maio e pode estender-se até dezembro. depois desta etapa, os delicados frutos seguem viagem em sacos de 30 quilos, de barco, até à ilha de são tomé, num percurso que dura mais de 20 horas.
é já na ilha principal que a viagem continua até à segunda plantação da família, chamada nova moca, onde também cultivam café. aí, e sem nunca ter tocado o chão desde que deixou o príncipe, o cacau sai finalmente dos sacos, é inspeccionado, organizado por data de apanha e colocado a secar. «quando chegamos a esta etapa podemos dizer que 60% do nosso trabalho está feito», garante o patriarca.
antes de serem colocadas a torrar, as favas de cacau são ainda seleccionadas à mão, organizadas por tamanhos e limpas. «só assim se pode tirar o melhor sabor do cacau», garante bettina. o próximo passo é a torrefacção, uma operação arriscada já que «é nesta fase que o aroma do cacau é desenvolvido e o mais pequeno erro pode arruinar todo o trabalho feito até aqui».
a matriarca da família explica que uma temperatura baixa e um longo período no forno tiram a ‘alegria’ ao cacau, enquanto que se a temperatura for demasiado alta o cacau ganha um sabor áspero.
do cacau ao chocolate
niccolò, o filho mais velho de bettina e claudio, sempre acompanhou o pai nas plantações: «lembro-me de ir com o meu pai desde sempre para o terreno e de ajudar a minha mãe a torrar as favas de cacau». ainda é ele quem controla a temperatura do forno e continua com a mesma impaciência de criança enquanto espera que o cacau se torne chocolate: «actualmente supervisiono todos os aspectos da produção, desde que o cacau chega das plantações até ao final, tudo para garantir que o nosso » produto chega ao patamar mais elevado de qualidade».
a sua última criação foi o chocolate com pimenta e flor de sal, mas no total já desenvolveu mais de 15 variedades de chocolate, todas sem corantes, conservantes, emulsionantes ou intensificadores de sabor. «na corallo só usamos ingredientes naturais!».
para a família, o segredo do sucesso está na qualidade da produção mas também no rigor por que passa cada etapa do processo: «tal como um bom vinho, o cacau precisa de um solo adequado, cuidados específicos e muita experiência. além disso, é muito importante que mantenha a ligação ao seu perfume natural…». e só a avaliar pelo aroma, qualidade é o que não lhe falta…