Equinócios e Solstícios

Por que razão tanta gente se queixa de que não consegue encontrar pessoas para trabalhar?

congruência

não há gente para trabalhar?

sei que é um tema sensível quando os números oficiais dão conta de cerca de 12% de desempregados. para mais, sabe-se que são muitos os portugueses que saíram do país nos últimos anos. outras largas centenas de milhares!

então como explicar que fábricas têxteis ou de calçado no norte, e famílias várias no alentejo, não consigam contratar ninguém?

cada vez oiço mais pessoas revoltadas com esta situação. algo não bate certo.

esclarecer esta realidade insólita deve ser tarefa de todos, incluindo dirigentes sindicais.

a missão que têm, entre outras bem nobres, é defender os desempregados.

todo o dinheiro é pouco para enfrentar as necessidades de quem se encontra em situação de carência.

o estado social atravessa um processo de reestruturação profunda que só pode ser bem sucedida se for levada por diante com coragem.

há um certo sentimento no ar de que o governo começa a adquirir a velocidade de cruzeiro para a governação que se impõe. o governo começa a demonstrar um rumo de trabalho com lógica de reforma – e a oposição começa, também, a demarcar as suas linhas de actuação.

por exemplo, a reforma do poder local mostrou sinais de uma possibilidade de entendimento que cumpre saudar.

ao fim e ao cabo, trata-se de um acordo que esteve à beira de votação final na assembleia da república em 2007. menos cargos – de eleitos e de dirigentes –, menos despesa.

autarcas envolvidos, cerimónia bem pensada nos jardins da residência oficial de são bento. gostei de ver os (tantas vezes desconsiderados) representantes do poder local num espaço onde é mais frequente ver altos dignitários estrangeiros…

o ministro que tem a área do poder local deu testemunho da sua sensibilidade política.

eficiência

308 mini-assembleias da república

desde há dois anos que sou vereador da oposição na câmara de lisboa. já fui presidente de duas câmaras.

há muito tempo que admito que a melhor solução é não haver oposição no executivo autárquico – só existindo na assembleia municipal. mas também disse sempre que não tinha ‘dogmas’ na matéria. há vantagens e desvantagens em cada uma das opções.

costuma dizer-se, em abono dessa tese, que não faria sentido ter a oposição sentada na mesa do conselho de ministros. sem dúvida. mas é diferente. a assembleia da república funciona em permanência e, a todo o instante, pode fiscalizar os actos do executivo. mas pôr uma assembleia municipal (aliás, 308 assembleias municipais) a funcionar do mesmo modo, seria muito dispendioso e muito pesado. contrariaria, e muito, o sentido da reforma apresentada esta semana por pedro passos coelho.

assembleia da república há só uma – e tem um estatuto e um impacto muito especiais.

por outro lado, o tipo de actos de gestão no poder local é muito mais específico, mais concreto, mais individualizado. o que se discute nas autarquias não é tanto a estratégia ou o conjunto de valores de cada um – mas, sobretudo, regulamentos, despachos, licenças. quanto muito, fala-se de planos de ordenamento.

que fazer, então? ponderar, avaliar bem. sem dúvida que portugal precisa, a vários níveis, de um desenho novo, de um ‘refrescamento’ dos seus sistemas institucionais. mas, no poder local, optar pela ‘parlamentarização’parece-me contraproducente.

tal como não tive dogmas para afastar a presença da oposição nas reuniões de câmara quando liderei executivos autárquicos, também não os tenho, agora, para defender a sua indispensabilidade.

sei, todavia, quantas decisões foram melhoradas pelo contributo de várias bancadas. e, sem essas alterações, quanto caminho não fariam decisões erradas até que uma assembleia municipal pudesse intervir? e, em muitos casos, o mais provável seria nem haver intervenção.

o poder local é muito, muito diferente do poder central. mimetismos também aqui são errados. o mais sensato será algo a meio caminho entre o que é hoje um executivo municipal e uma assembleia municipal. a meio caminho no número de membros e no número de reuniões. existindo, claro, um verdadeiro executivo, com poucos membros mas com suficiente apoio.

reformar é preciso. mas com conta, com peso, com medida.

prudência

fechar a câmara é fechar a terra

quero também chamar a atenção para a situação das parcelas do território que estão mais despovoadas e mais desertificadas.

nessas terras, fazer desaparecer autarquias é contribuir para que acabe a última base de apoio às populações e às débeis economias em que se integram.

como não me canso de repetir, este desequilíbrio na ocupação do território é um dos mais graves problemas que portugal enfrenta. não sei se a troika já deu por isso. mas é!

faz muito mais sentido agrupar autarquias nas áreas mais desenvolvidas do que naquelas em que o envelhecimento e a enorme queda demográfica são as realidades mais evidentes.

é óbvio que é mais fraca a voz das regiões mais desfavorecidas. mas tem de ser escutada. há dias, dizia-me um presidente de câmara do alentejo que «fechar a câmara era fechar a terra». e acrescentava: «não digo isto por querer continuar neste cargo, pois nem posso recandidatar-me».

possa ou não, sabe quem conhece terras abandonadas neste nosso portugal que tem fundamento a referida afirmação. muitas terras dependem das suas câmaras e das suas juntas de freguesia.

depois do encerramento de centros de saúde, de escolas, de estações de correio, de linhas ferroviárias, de maternidades, acabar com as autarquias nessas localidades é ‘varrê-las do mapa’.

esta alteração profunda no sistema autárquico terá grandes consequências no desenvolvimento de portugal. autarquias, ccdrs, administração desconcentrada, serviços descentralizados, tudo se relaciona. foram extintos os governos civis. têm sido muito faladas as regiões autónomas. portugal, na sua organização e no seu funcionamento, está todo em equação. sem preconceitos, sem radicalismo, sem conservadorismo, há muito trabalho para fazer. e bom!