Governos falham previsões desde 2007

Cinco anos, cinco previsões, cinco ‘tiros ao lado’. O cenário macroeconómico é um dos pontos mais esperados de cada Orçamento do Estado (OE), mas também o que mais falha e o que é alvo de mais críticas no documento que define a estratégia orçamental de cada governo para o ano seguinte.

com a imprevisibilidade resultante da crise financeira de 2007 e 2008, a recessão económica de 2009 e, por fim, a crise da dívida soberana na zona euro iniciada em 2010, as contas dos técnicos do ministério das finanças tornaram-se uma verdadeira ‘lotaria’. prever a evolução da economia portuguesa é hoje um exercício quase inglório a cada mês, quanto mais num horizonte a um ano.

desde 2007 que a evolução estimada da economia e a efectivamente verificada é cada vez mais díspar. nos últimos anos, os governos têm sido, normalmente, conduzidos por um excesso de optimismo nas estimativas.

pib ia crescer em 2009
o oe de 2009 é um dos casos paradigmáticos. apresentado em meados de outubro de 2008 – quando o norte-americano lehman brothers já tinha afundando, arrastando meia wall street e provocando a onda mais severa da crise financeira mundial, o documento estimava para esse ano (2008) um crescimento para portugal de 0,8% e de 0,6% para 2009. dois meses depois, 2008 fechava com a economia estagnada (0,0%) e 2009 traria a maior recessão dos últimos anos, com o produto interno bruto (pib) a contrair 2,5%.

o orçamento deste ano (oe2011) é outro exemplo. em outubro de 2010, quando a grécia já tinha sido resgatada, a irlanda estava em pré-resgate e os juros da dívida portuguesa se situavam no ponto de não retorno (acima dos 6%), o executivo de josé sócrates avançou que a economia iria conseguir crescer 0,2% em 2011. a realidade é distinta. as previsões apontam agora para uma recessão de 2,2% e portugal já é o terceiro país da zona euro sob o auxílio financeiro da troika (banco central europeu, fundo monetário internacional e comissão europeia).

o actual governo de pedro passos coelho também já recebeu críticas por ter um excessivo optimismo. em finais de agosto, quando apresentou o documento de estratégia orçamental que continha as previsões macroeconómicas até 2014, anunciou uma recessão mais suave em 2012 (queda do pib de 1,8%, contra 2,2% de 2011), exportações a acelerarem mais de 6% e um regresso ao crescimento em 2013. tudo isto num cenário com o consumo privado (responsável por 70% da economia) em queda abrupta de 3,3% e um desemprego recorde de 13,2%.

passos revê 2012 em baixa
a três semanas da apresentação do oe para 2012 – com data limite até 17 de outubro –, passos coelho admite agora que irá agravar o cenário de recessão esperado para 2012. numa entrevista à dow jones, esta semana, o primeiro-ministro afirmou que o executivo está a trabalhar num cenário de uma contracção do pib de 2,3%, contra 1,8% inicialmente estimados, devido à desaceleração da economia mundial. e carlos moedas, secretário de estado adjunto de passos coelho, admitiu que o recuo poderá ir até 2,5%.

estas são previsões mais pessimistas do que as feitas até agora pelo banco de portugal – que já anunciou que também irá rever as suas expectativas em baixa –, troika ou instituições internacionais. o bpi_e o bcp_esperam uma recessão de 2,2% e 2,1%, respectivamente.

passo atrás
passos sabe que o destino de portugal – e de todo o cenário macro para 2012 – depende da grécia. na entrevista à dow jones, afirmou que não deseja um default de atenas, seja ele «organizado ou desorganizado». mas, se tal acontecer, disse, portugal e irlanda estão «na primeira linha» com espanha, e itália «na segunda linha». «se acontecer um default na grécia, espero que seja dentro de um ano, para dar tempo à economia portuguesa de se reforçar e cumprir o acordo da troika», adiantou passos coelho.

cristina casalinho, economista-chefe do bpi, lembra ao sol_que portugal «terá de fazer um ajustamento na economia em dois ou três anos superior ao que alguns países europeus fizeram em 15». para o gabinete de research do millennium bcp, o «vigor dos parceiros comerciais e os suporte ao programa de assistência financeira» são as condicionantes de sucesso externas para portugal no próximo ano. dentro de ‘casa’, os factores decisivos são a «capacidade de implementação das medidas e a melhoria da produtividade».

luis.goncalves@sol.pt