segundo o financial times, já há seminários de especialistas que vaticinam que, em breve, o euro estará a par do dólar norte-americano; o ouro interrompeu a sua ascensão; os gregos estão nas greves selvagens.
em portugal, as centrais sindicais ameaçam com uma semana quente para o fim do mês de outubro e várias figuras, figurões e figurantes dos últimos anos continuam a resvalar da crónica política, para a crónica de polícia: acusações de homicídio, entradas e saídas de prisão, exílios de conveniência, detenções domiciliárias ‘que rico não vai dentro’. talvez por causa disso, o senhor cardeal patriarca teve uma frase pessimista e infeliz – pela generalização – sobre a inevitabilidade da desonestidade dos políticos. e a política pode ser – devia ser – para os cristãos uma forma superior de exercer a caridade.
o mais preocupante em todo o imbróglio europa-euro é que parece haver, perante os males agravados, a tentação de dar ao doente uma dose reforçada do vírus. isto é, avançar com a integração, quando foi exactamente o voluntarismo de um processo unificador, monetário e político, sem respeito pelas diferenças históricas e culturais dos povos da europa, que nos levou à situação em que estamos.
porque a europa e a integração europeia são (ou passaram a ser) um fenómeno a contracorrente das grandes tendências mundiais. o pós-guerra de 1945 viu a segunda descolonização, o fim dos impérios europeus institucionalizados: estes impérios partiram-se e fragmentaram-se para darem origem a novos estados, em áfrica, mas também nas antilhas e na ásia. o mesmo tinha acontecido em 1918, com os impérios centrais – austro-húngaro, alemão e turco. e também com a implosão da rússia czarista.
com a derrota da união soviética e sua implosão (a jugoslávia foi o preâmbulo…) deu-se um novo capítulo nesta linha de fragmentação que nos leva a quase duzentos estados independentes. a regra hoje é que a cada nação corresponda um estado e cada estado tenha a sua nação. e só uma.
quando isto está a acontecer no mundo inteiro, nos quatro continentes, a europa mantém em marcha um processo de integração – fusão – iniciado nos anos 50 do século passado, numa conjuntura totalmente diversa. viveu da ambiguidade na construção, familiar para políticos e altos funcionários, mas esotérica, por obscurantismo induzido, para os povos. estes, quando chamados a pronunciar-se não foram entusiastas e franceses e holandeses rejeitaram a constituição política.
como observou roger scruton, esta europa tem sido construída por economistas e eurocratas, que não conhecem nem são sensíveis ao factor nacional. e até ao factor democrático. ora, foram estes os factores que, nos séculos xix e xx, puseram em causa toda a megaconstrução, todo o império.
os dirigentes europeus – que são políticos eleitos – têm uma dupla e contraditória agenda: por um lado, querem ser reeleitos, pelo que têm que atender as suas audiências nacionais; por outro, têm que pensar num ‘bem comum’ ou num ‘interesse europeu’ que não é visível para os cidadãos. a nível das elites eurocráticas (ver a interessante entrevista de pierre defraigne, director do madariaga ao público de domingo, 2 de outubro) reconhece-se que o modelo de capitalismo social europeu é inviável num mundo globalizado e que os europeus não querem gastar com a defesa.
perante isto, pensem duas vezes antes de dar mais passos em frente. podem ser para o abismo. ou cá, como estamos cada vez mais ‘ao lado’, para o buraco.