sentimentalismo machista
a s declarações emotivas do bastonário da ordem dos advogados, marinho pinto, sobre a ministra da justiça, paula teixeira da cruz, não devem ser remetidas ao esquecimento como se fossem um fait-divers igual a outros. ficámos a saber que o bastonário crê que a ministra «não gosta» dele, o que, segundo o próprio, não tem mal nenhum, porque ele também não gosta dela. a escolha do vocabulário é curiosa e reveladora de um certo modo de lidar com o sexo feminino. sabemos que não diria o mesmo se fosse um homem a ocupar o cargo. «o alberto martins não gosta de mim, mas eu também não gosto dele» não dá, pois não? lembremos que, no dia anterior, marinho pinto tinha sido deixado a barafustar no final de uma cerimónia de onde paula teixeira da cruz saiu sem avisar. a quebra de protocolo foi interpretada pelo homem que preside à ordem como uma afronta da parte de uma mulher que assumiu a pasta da justiça. há nas posteriores queixas e chamadas de atenção para os erros terríveis que «ela» terá cometido ecos ruidosos de milhares de anos de homens a mandar e mulheres a obedecer. há machismo e ego magoado nas declarações do bastonário. o amor já se exprimiu de maneiras mais estranhas.
romantismo oriental
e stamos habituados a notícias da china com números enormes. é muito dinheiro, muita gente, muitos restaurantes, muito tudo. assim, não surpreende ninguém que se tenha organizado em xangai o maior encontro de solteiros e solteiras à procura de mulher e marido, que contou com mais de vinte mil participantes. também não é novidade que a vida profissional deixa pouco tempo às pessoas para cuidar da sua vida afectiva. talvez por isso deleguem este pormenor da sua existência às agências de encontros amorosos. o mais espantoso deste evento casamenteiro é que, apesar de o governo chinês apelar ao casamento por amor, as mulheres e os homens continuam a obedecer a critérios estritos para dar o nó. as mulheres só começam a tirar as medidas aos pretendentes quando eles vêm acompanhados de casa própria e automóvel. e eles são tão conservadores quanto elas. pedem apenas que a mulher seja carinhosa e amável e não a querem especialmente bonita nem caprichosa. mas o lado chinês do acontecimento é tanto os celibatários como as celibatárias ali presentes serem em grande parte workaholics. é natural que apareçam propostas de casamento, mas só depois de longas negociações.
para o dsm-v
li um artigo no the new york times sobre a experiência de um homem no twitter. larry carlat abriu uma conta em 2008 e percebeu rapidamente que tinha talento para fabricar aforismos parvos em 140 caracteres. twittava 20 a 30 vezes por dia, todos os dias. twittava em todos os momentos sobre tudo e mais alguma coisa que fosse banal, invulgar, alegre ou triste. primeiro twittava mais sobre o seu dia-a-dia, mas depois começou a partilhar as suas angústias, os seus pensamentos, com os cerca de 25 mil seguidores que entretanto atraíra. um dia foi despedido. a segunda empresa que o contratou descobriu a sua actividade twitteira e manifestou o seu desagrado. ou apagava a conta ou saía da empresa. como não estava muito satisfeito com o trabalho, escolheu o twitter. parece inacreditável mas é o que conta. mas larry ainda não atingira o limite. foi preciso o divórcio e uma noite de solidão para twittar uma piada tonta sobre a ex-mulher. o filho ameaçou que deixava de seguir o pai no twitter e foi assim que larry percebeu que tinha de mudar. ah, nada como uma ameaça de deixar de seguir uma pessoa no twitter… a história de larry é triste e vazia. mas a culpa não é do twitter.
aquele abraço
silvia rajschmir é uma argentina que emigrou para israel em 1999. o seu projecto era fazer uma escola de tango em jerusalém. já havia duas em telavive. agora silvia rajschmir tem duas escolas, uma em cada cidade. os seus alunos, por sua vez, abriram outras em haifa e em mais três cidades com nomes impronunciáveis. se o êxito do tango em israel não é muito surpreendente, a maior dificuldade que esta argentina enfrentou com os seus alunos é no mínimo inesperada: o abraço. ensinar a abraçar faz parte do seu trabalho e não é tarefa fácil. silvia explica que os israelitas são mais tímidos do que os argentinos e os motivos que aponta estão relacionados com a realidade dura do país. as mulheres fazem parte do exército, ocupam cargos de chefia militar e não só e os homens parecem estar pouco à vontade quando chega a hora de dançar. o resultado é um tango mais contido, menos malandro, demasiado sério. o desconforto masculino é explicado pela ausência de vulnerabilidade feminina: elas não precisam de orientação. ora o tango depende da atracção entre a energia masculina e a delicadeza feminina. mas tenho confiança nos israelitas. até porque escolas não faltam.
no bamboleio
investigadores da universidade britânica de swansea fizeram uma descoberta divertida. usando um sistema sofisticado de detecção de mudanças na postura e no movimento, perceberam que é possível saber em que estado de espírito está uma pessoa pelo modo como caminha. o detector de movimentos é usado no pulso ou no cinto e pode até revelar se o seu utilizador está a mentir ou a dizer a verdade. tenho imensas dúvidas sobre a utilidade do dispositivo, assim como torço o nariz ao polígrafo. estas máquinas são dominadas pela capacidade de controlo humano, nomeadamente por criaturas capazes de manter o sangue-frio em momentos críticos e mentir com a maior das facilidades. apesar das boas intenções, por exemplo, na previsão da doença de epilepsia, esta nova máquina que mede micromovimentos de anca não me comove. falemos do aspecto mais frívolo e pouco prático no uso quotidiano desta descoberta. imaginemos que queremos saber se um amigo está triste. apesar de nos sorrir parece não estar muito bem. é nessa altura que lhe sugerimos que use uma maquineta no pulso e que ande de um lado para o outro para tirarmos tudo a limpo. não, pois não?