A crise, os Governos de políticos e os Governos de tecnocratas

Quem terá mais facilidade para lidar com a grande crise: os Governos tecnocráticos de Itália e da Grécia ou os Governos eleitos de Portugal e de Espanha?

no final do artigo da semana passada tinha feito referência a este contraste – que as eleições em espanha vieram pôr em maior destaque.

a frase que mais retive, na declaração de vitória de mariano rajoy, é que não vão existir milagres. depois acrescentou: «aliás, também não os prometemos».

a questão é mesmo essa, e o povo não espera milagres mas espera trabalho, bom senso e sentido de justiça.

portugal e espanha são, pois, governados por dois homens que não pertencem aos círculos da oligarquia internacional.

ao contrário dos primeiros-ministros da grécia e de itália, não trabalharam em grandes instituições financeiras internacionais, privadas ou não. não pertenceram nem ao fmi, nem à goldman sachs, nem à comissão europeia. não foram ungidos – foram escolhidos.

o que será mais adequado para estas circunstâncias? será melhor ter a responsabilidade de um mandato conferido por um resultado eleitoral ou não ter essa relação directa com o voto dos cidadãos?

há ocasiões na vida dos povos em que esse tipo de perfil até compensa.

e normalmente é mais fadado para enfrentar períodos de crise. por exemplo, em portugal, em 1985, cavaco silva surgiu com esse perfil de não-político. correu-lhe bem! mas é bom ter presente, para além das suas conhecidas qualidades, que esse primeiro governo minoritário coincidiu com o início da nossa entrada na comunidades europeia e com a chegada dos primeiros fundos estruturais.

nas actuais circunstâncias, a realidade é diferente.

trata-se de governar, não para anos de desenvolvimento, mas para anos que se sabe de antemão serem de crise.

obviamente, não é pelo facto de as medidas serem tomadas por governos tecnocráticos que deixam de ser duras e de provocar forte contestação social. mas, se já é difícil lidar com tão complexa situação tendo legitimidade eleitoral, será ainda mais difícil enfrentá-la sem essa chancela.

passos tem resistido à tentação do palco

não excluo que em portugal haja quem sonhe com governos semelhantes. mas não será nada fácil.

é que, para além do mais, em itália o governo já tinha quase quatro anos de muito desgaste. na grécia, já tinha cerca de dois, nos quais muito se desgastou. em portugal e em espanha há uma legitimidade fresca. em espanha um só partido tem a maioria absoluta – mas, por outro lado, existem os governos das autonomias cheios de poder e sempre com muitas matérias para tratar com madrid.

mariano rajoy é um enigma – e precisa de constituir uma equipa muito forte no plano político e no domínio técnico. não me surpreenderá se o actual alcaide de madrid, alberto luiz gallardón, for chamado a funções importantes no novo executivo – e, nesse caso, ana botella, a mulher de josé maria aznar, suceder-lhe–á na liderança da autarquia da capital de espanha.

se assim for, mariano rajoy demonstrará que compreende bem a necessidade de todo o seu partido ser chamado às gigantescas tarefas que vai ter por diante. rajoy, não sendo um líder carismático, já demonstrou saber bem o que quer e que é capaz de lutar por aquilo em que acredita.

tratando-se de personalidades muito diferentes, manda a verdade dizer que josé maria aznar também não era carismático quando chegou ao poder. pelo contrário, construiu o seu carisma no exercício do poder, o que é pouco frequente.

quer o novo primeiro-ministro de espanha, quer o actual primeiro-ministro de portugal, têm a vantagem de governar depois de, por sete e seis anos respectivamente, os seus países terem sido dirigidos pelos dois amigos josé luís zapatero e josé sócrates. a maioria dos eleitores chegou ao fim desses ciclos de governação socialista muito saturada.

pedro passos coelho tem-se protegido bem, tem-se reservado, tem preservado a sua imagem. ele, que é um homem da política, tem resistido à tentação do palco. aí, pode estar próximo do perfil dos chefes de governo tecnocráticos.

resta saber como será com mariano rajoy – e se sentirá a necessidade de falar muito para suprir as óbvias características do seu perfil de comunicação.

o mais importante para os quatro países é que os quatro governos tenham sucesso. e que, finalmente, sejam capazes de entender que em convergência são muito mais fortes.

quem irá gerir o museu dos coches?

não deverá faltar muito para que se concluam as obras do novo museu dos coches.

a obra não é nem da câmara municipal de lisboa nem do instituto português de museus. foi assumida pelo ministério da economia, ainda no tempo de manuel pinho, e anunciou-se que custaria cerca de 40 milhões de euros e seria paga com verbas do casino. aliás, das poucas obras que se projectam em lisboa, várias têm essa fonte de financiamento.

ora, não sendo a obra da responsabilidade nem da câmara nem do instituto dos museus, importa agora decidir quem ficará responsável pela gestão, manutenção e exploração do novo espaço museológico. com um projecto contratado, por ajuste directo, ao arquitecto brasileiro paulo mendes da rocha, já se pode constatar que está a nascer ali, na praça afonso de albuquerque, ao lado do palácio de belém, um imponente edifício arquitectónico.

lembro que fui eu, como secretário de estado da cultura, num governo de cavaco silva, que concretizei a compra do terreno onde está a nascer esse museu.

foi comprado ao ministério da defesa nacional, se bem me lembro, por 1,5 milhões de contos, cerca de sete milhões de euros. a ideia era passar os coches de lisboa e de vila viçosa para ali, passando o actual museu dos coches, antigo picadeiro real, a servir para exibições da escola portuguesa de arte equestre. para quem conhece, a ideia era fazer algo semelhante ao que acontece, para delícia dos turistas, em viena de áustria, com a spanish riding school, de origem também portuguesa.

os governos de antónio guterres e o meu reassumiram a ideia. já o governo de josé sócrates seguiu por outro caminho, o que está actualmente em execução. a escola portuguesa de arte equestre já não vem para esse espaço e, portanto, não se exibirá no picadeiro.

já foi referido que o governo está a trabalhar na escolha da entidade que vai gerir o novo espaço. o orçamento do museu vai ser, certamente, muito exigente. por isso mesmo, a solução não será fácil.