Splendid isolation

YES, Cameron got it right – titulava The Mail na edição de domingo, após o ‘não’ inglês.

uma sondagem demonstrava o apoio popular ao primeiro-ministro: cameron está certo (sim 62%, não 19%); esta cimeira deu demasiado poder à alemanha na ue (sim 70%, não 13%); deve haver um referendo sobre a inglaterra na ue (sim 66%, não 22%); o euro vai acabar (sim 65%, não 19%).

a grã-bretanha ficou fora dos acordos da cimeira de bruxelas. este acto de ruptura de um consenso de 26 em 27, tem razões fundas além da pressão dos eurocépticos e eurófobos nas fileiras conservadoras e dos sentimentos da rua.

ao contrário da plutocracia industrial americana com as fortunas feitas no carvão, no aço, no petróleo e nos caminhos-de-ferro, a oligarquia inglesa teve uma forte base financeira, desde a revolução inglesa quando a city of london se rebelou contra o ship money dos stuarts.

a aristocracia de raiz rural, que fez e financiou a revolução industrial, multiplicou a fortuna investindo não só no império, mas também na europa e nas américas.

quando a segunda revolução industrial arrancou na inglaterra, apareceu uma nova geração de ‘industriais’. já não eram aristocratas, mas homens novos, com fortuna feita nas fábricas e no grande comércio. isto reflectiu-se na política: o partido conservador permaneceu o partido da gentry e o partido liberal foi o dos ‘homens novos’.

a economia do império – englobando o transporte e troca de mercadorias e a correspondente infra-estrutura de serviços – manteve o seu comando financeiro na city of london. antes da grande guerra, o capitalismo inglês era essencialmente financeiro ou bancário e as grandes nações industriais tinham passado a ser a alemanha e os estados unidos. para elas, passara também a liderança militar, comprovada em duas guerras: em 1914-1918, só a entrada dos norte-americanos obrigou a alemanha à rendição. em 1941, a inglaterra e a frança foram outra vez batidas no continente e outra vez foram os estados unidos que (com a ajuda das massas da rússia comunista no leste) conseguiram esmagar o reich.

as oligarquias financeiras tiveram como modelo preferido de ordem internacional o liberalismo globalizador que ajudou a fragmentação dos impérios concorrentes. causas generosas como o combate ao tráfico de escravos, a defesa dos direitos dos povos a dispor de si mesmos e de protecção de algumas reivindicações constitucionais, serviram de bandeira para destruir concorrentes. como, no século xx, a partir da vitória de 1945 e do suez, os norte-americanos promoveram o fim dos impérios marítimo-coloniais europeus ao mesmo tempo que criavam o seu império invisível – económico e cultural – bem ajudado pela primeira marinha do planeta e pelas possibilidades geoestratégicas que ela lhes concedia.

nunca deixar que um poder – um só – dominasse o continente foi a regra de ouro da política britânica.

o movimento de unificação europeu é visto por londres como uma terceira tentativa da alemanha unida de hegemonizar a europa. o argumento alemão hoje, além do estado de necessidade financeira, é o continente europeu fazer face aos poderes da ásia e das américas – à china, à índia, ao brasil e aos estados unidos. e à rússia.

a unificação europeia vai contra os ventos da história, contra a grande tendência dos últimos 20 anos que é, por toda a parte, a da fragmentação dos espaços não nacionais, isto é das potências que não são estados nacionais.

a alemanha persiste nesta política de federação mas não quer pagá-la. ou seja, ameaça o burro com o pau, mas não lhe dá a cenoura. o bce mais uma vez fica de fora como garante último do euro e não há solidariedade na dívida. os ‘mercados’, esses misteriosos volúveis e voláteis senhores dos tempos democráticos, darão o veredicto.