ní rú hé yu zhongúo zuò sheng yì? significa ‘como fazer negócios com chineses?’, um tema que está a despertar interesse entre os empresários portugueses. reflexo disso é, por exemplo, a crescente procura de cursos de mandarim.
«tem-se verificado um significativo aumento da procura por pessoas que profissionalmente têm, ou pensam vir a ter, contactos com a china ou com empresas chinesas», confirma o responsável do centro científico e cultural de macau, rui abreu dantas, que disponibiliza formação neste idioma.
«tem a ver com os negócios com a china e tivemos procura de pessoas da advocacia, da diplomacia, de empresas públicas e ministérios», concorda lyudmyla adamenko, do centro de cursos livres, no iscte, onde a adesão à aprendizagem de mandarim triplicou entre 2010 e 2011. já no instituto confúcio – onde o número de alunos cresceu 15% no último ano –, a procura pelo módulo de chinês comercial, «tem sido muito boa», indica o responsável, moisés fernandes.
desde há algum tempo que os contactos entre portugal e a china têm vindo a intensificar-se. mas, com a entrada dos chineses da three gorges na edp, as relações bilaterais ‘acenderam-se’ definitivamente. segundo os dados mais recentes do instituto nacional de estatística (ver infografia), as exportações de bens portugueses para a china subiram 47,1% até outubro e, nesse período, as de serviços já ultrapassaram o total de 2010.
guanxi, rede de relações
a autoeuropa, que já tem na china um dos seus principais mercados, mas também empresas de pedras ornamentais, a gallo, a bosch ou a swedwood portugal, do grupo ikea, estão entre as principais exportadoras. tal como os maiores bancos portugueses, sonae, amorim, cimpor, hovione ou sogrape também já investiram na segunda maior economia mundial, que aprecia os vinhos, o azeite e a cortiça portugueses.
mas, para se ter sucesso no ‘império do meio’ é fundamental dedicar tempo a construir redes de relações – guanxi para os chineses. «não o fazendo, corre-se o risco de se ser enganado com grande facilidade. e é uma garantia de oportunidades, abre portas», explica virgínia trigo, docente do iscte que há vários anos ensina na china. «trata-se de convidar pessoas, de pagar almoços. hoje, em portugal, essas actividades são mal vistas. não estão inseridas numa estratégia de negócio. porém, os chineses só conhecem as pessoas depois de beberem juntos maotai, o licor chinês que é ‘lubrificante’ de relações. é preciso ir a jantares, aos karaokes», alerta.
no entanto, a autora do livros e artigos sobre a forma de negociar com chineses nota que também no oriente tem havido interesse pela cultura ocidental e em encurtar o choque cultural. «há anos que têm cursos sobre isso. querem saber como usar os diferentes talheres, qual a etiqueta de jantares, que presentes os europeus gostam de receber».
pauzinhos vs. talheres
a investigadora lembra ainda que «na china, estão muito interessados em aprender português», não só devido às relações que o país mantém com portugal, mas sobretudo porque tem fortes ligações económicas com o brasil e angola.
o ‘mundo lusófono’ é, aliás, uma das justificações para a aposta de investidores chineses em terras portuguesas. depois dos restaurantes e lojas, agora a ‘cobiça’ chinesa está nas grandes companhias. na fase pré-edp, só a zte e a huawei estavam em portugal. mas o governo chinês já assumiu que também a banca, energia, turismo, o sector automóvel e a logística portuária estão em análise.
«conhecemos a china há 500 anos mas, durante grande parte desse tempo, foi uma relação de chá e simpatia. porém, começou a surgir a ideia de que portugal não era só um rectângulo de dez milhões de pessoas, mas sim um centro para os países lusófonos», principalmente após a criação, em 2003, do fórum para a cooperação económica entre a china e os países lusófonos, em macau, lembra o vice-presidente da câmara de comércio e indústria luso-chinesa, ilídio serôdio. e remata: «portugal tem a vantagem de estar na comunidade europeia, o que é bom para os chineses. foi uma aproximação muito interessante».
as regras do protocolo:
valorizar cartão de visita
é um objecto de culto para os chineses. entregue-o com as duas mãos (o que, na cultura oriental, revela que não há nada a esconder, já que as mãos estão à vista) e de modo a que o destinatário possa lê-lo. receba-o da mesma forma, leia-o e mantenha-o à vista. guardá-lo no bolso ou na pasta será um ‘fatal’ desrespeito. além do inglês, traduzir para mandarim é bem visto. na china, indica-se primeiro o apelido e depois o nome próprio.
fazer contratos
assinar estes documentos significa apenas o início da negociação e não a sua conclusão. muitas vezes, é à mesa que se fecham negócios.
respeitar hierarquias
os chineses negoceiam em grupo e os interlocutores devem estar todos ao mesmo nível hierárquico. nas primeiras reuniões há muitas formalidades e rodeios. negociar exige paciência. e ser paciente é sinónimo de carácter forte.
negociar à mesa
os banquetes são obrigatórios e pontos altos nas negociações, vistos como fundamentais para aprofundar relacionamentos e avaliar a sinceridade dos parceiros. o consumo de álcool, sobretudo de maotai (licor chinês), é frequente. e beber de ‘penálti’ também. em refeições que podem ter mais de 13 pratos, os brindes começam no 2.º ou 3.º e são feitos de pé. fica mais alto o copo do superior hierárquico. sujar a toalha não é mau: prova que os convivas ficaram satisfeitos.
trocar presentes
demonstra estima. quem oferece deve optar por produtos típicos do seu país (vinho, azeite, azulejos ou louça, no caso de portugal), devendo dar sempre vários – só um é uma desconsideração – e durante banquetes ou na última reunião agendada. evite: relógios de parede (em mandarim, a palavra é semelhante a morte), objectos cortantes (significam vontade de cortar a relação), livros (em chinês a palavra é parecida com a que significa perder), chapéus ou bonés verdes (marido traído). e embrulhe em papel vermelho ou dourado e nunca branco, associado a luto.
não ‘perder a face’
é frequente que os presentes não sejam abertos na presença de quem oferece para que esta não ‘perca a face’ caso a oferta não agrade. uma das características mais importantes da cultura chinesa é a preocupação em não perder a face’ (mianzi), ou seja, não perder a imagem positiva de si próprio. por isso, também não se deve contrariar um chinês directamente ou em público.
ana.serafim@sol.pt