Amargos de boca

O acordo obtido na concertação social sobre a reforma do regime laboral não deixa pedra sobre pedra dos pressupostos que havia até aqui.

o que em breve será regulamentado vai revolucionar as relações laborais, pondo portugal entre os mais liberais e os menos assistencialistas na ue. a perda está claramente do lado dos trabalhadores, ainda que as confederações patronais tenham chegado ao fim do processo sem disfarçar que gostariam de ter ido imensamente mais longe.

o documento é histórico pela mudança que induzirá nas nossas vidas, mas só existe porque uma central, a ugt, o subscreveu. sem isso, não haveria um acordo, mas uma lei sem pitada de tempero. uma injustiça ainda maior. deste prisma, ainda bem que joão proença não abandonou a mesa, como carvalho da silva, num gesto (repetido) a poucos dias da saída da liderança da central afecta ao pc. ao fim de mais de 30 anos de sindicalismo, dificilmente o antigo montador electricista deixará de sentir um amargo de boca na despedida, pela forma fracturante como deixa a liderança da cgtp, o que inclui um eventual processo judicial contra o homólogo da ugt.

joão proença herda, assim, por inteiro, pelo menos até ver, o palco que cabe aos sindicatos na negociação com o governo. na mudança de cena, com um novo líder na cgtp, proença, ele próprio a cerca de um ano de deixar a ugt, defenderá isolado o que ainda pode ser ‘salvo’ do lado dos trabalhadores. e, no fim do dia, quando deixar a central, dificilmente deixará de sentir um amargo de boca parecido com o que atormentou o seu ‘companheiro’ de lutas.

ricardo.d.lopes@sol.pt