mas sob essa aparente unanimidade há uma grande volatilidade das realidades da economia e da política – os mercados e os estados.
por isso o discurso ideológico está – e vai estar cada vez mais – longe da substância das coisas. em linguagem corrente diríamos que tal faria do nosso tempo um tempo de contradições, hipocrisia, ou mesmo de mentira. sabe-se que introduzir instituições em áreas e sociedades onde não existem as condições histórico-culturais das suas fundações só tem trazido confusão, actos fraudulentos, fragmentação, guerra civil. o que aconteceu numa parte substancial de áfrica.
a desregulamentação dos mercados, a subordinação da política às mãos misteriosas e invisíveis da economia, a crença na racionalidade dos mecanismos dos preços e produtos, criou e acelerou rupturas e mudanças significativas na hierarquia dos poderes, com a queda da europa e a subida dos novos potentados asiáticos e americanos.
é um mundo complicado de onde desapareceu o medo cruzado da guerra fria, o medo do holocausto nuclear numa confrontação este-oeste, mas renasceram os medos – ao terrorismo, ao crime, às epidemias, à fome, ao empobrecimento, ao desemprego.
é um mundo bem nos antípodas das maravilhas apregoadas em 1992, há 20 anos, quando acabou a união soviética e caiu a cortina de ferro.
neste mundo, a busca das identidades entre os homens e as comunidades é essencial. o isolamento é um luxo dos muito fortes e nem esses querem ficar sozinhos. mas o mundo é grande demais e os seres humanos são demasiado pequenos. a comunidade política por excelência é a nação. e como agrupar as nações, agora que os medos caíram, que as alianças baseadas no quadro ideológico antigo deixaram de ter significado?
a quebra das identidades ideológicas – fascismo, comunismo, liberalismo, socialismo democrático – e o unanimismo do discurso humanista correcto, dá importância a outras identidades – as dos costumes, da cultura, da história – fundações seguras para as realidades da política e da economia.
a nato, sem urss para conter, é uma aliança que funciona intermitentemente, casuisticamente e com geometria variável: nos últimos conflitos – na segunda guerra do golfo ou na líbia – assim foi. a união europeia pode estar, com a crise do euro, nas vésperas de uma ruptura. de qualquer forma os alemães já mostraram que não querem saber dos gregos e os ingleses puseram-se de fora das reformas financeiras.
neste quadro, uma comunidade como a cplp onde a identidade se faz pela matriz histórico-linguística, pode ter a sua importância acrescida: os seus países membros cobrem os quatro continentes, têm mais de 250 milhões de habitantes e um produto total superior a 2.500 biliões de dólares.
apesar dos problemas derivados das diferenças geográficas e de desenvolvimento, de regime político e de tempo histórico, os países da cplp têm que encontrar modos de reforçar e potenciar a sua organização em áreas em que contam e pesam especificamente, como na produção e distribuição de energia. podem, além disso, com realismo, procurar nas suas diferenças a complementaridade dos seus interesses.
nos últimos anos, o secretário executivo da organização, domingos simões pereira, coordenou um sério esforço neste sentido e os frutos estão a começar a recolher-se. a ver se deixamos de vez a retórica dos paraísos terrestres a fazer e tratamos do progresso dos povos dos nossos países, encontrando nas diferenças e até nos conflitos do passado próximo, o motor da construção do futuro.