a iniciativa da proibição vinha de longe, com o forte apoio das igrejas protestantes e ligas femininas, que reflectiam as preocupações das mulheres que sentiam os desmandos causados nos lares pelos pais, maridos e filhos. a women’s christian temperance union, a anti-saloon league e o prohibition party foram decisivos no lobby anti-álcool.
em 1919 a 18.ª emenda à constituição e o volstead act puseram em vigor e execução a proibição da indústria e comércio do álcool, excluindo para ‘fins científicos e energéticos’.
cedo se viram os efeitos perversos: havia dezenas de milhões de americanos consumidores convictos de cerveja, whisky, vinhos. a partir desta procura, e à margem da lei, organizaram-se por todo o país redes de produção e distribuição clandestina, reforçadas pela importação do canadá. os preços subiram em flecha e as margens de lucro davam para tudo – para comprar autoridades e juízes; para pagar sistemas alternativos de fabrico e distribuição de bebidas alcoólicas. multiplicaram-se as destilarias clandestinas.
boardwalk empire conta essa história a partir da mítica atlantic city – cidade associada ao jogo, ao álcool, à prostituição, ao prazer, à noite. e ao mar. em atlantic city dominou enoch ‘nucky’ thompson, papel interpretado na série por steve buscemi,o chefe das finanças locais e grande senhor da corrupção da cidade e de nova jérsia. nos estados unidos, o crime organizado foi poderosíssimo e imortalizado em filmes e séries inesquecíveis do cinema e da tv, d’o padrinho a os sopranos.
hoje esse crime deslocalizou e mudou de produto. mantêm-se algumas das zonas tradicionais, como o sul da itália com a cosa nostra da sicília, a camorra em nápoles, a ndrangheta na calábria e a sacra corona unita na puglia. o sul de itália é um cruzamento vital de várias rotas de produtos do crime – drogas, imigração clandestina, prostituição – vindos do médio oriente, dos balcãs e de áfrica. as máfias alargaram as suas actividades ao norte – ao triângulo milão – génova – turim; onde além dos sectores tradicionais, estão presentes na corrupção das obras públicas e fazem a lavagem dos dinheiros e a entrada na economia respeitável e formal.
as outras zonas de criminalidade ligada ao narcotráfico situam-se na américa latina: ali houve a mudança dos cartéis colombianos para os cartéis mexicanos, que controlam as rotas para o mercado norte-americano.
os novos negócios são o jogo clandestino, a prostituição, a imigração ilegal, a contrafacção de marcas e, finalmente, a pirataria. esta reapareceu em força há 20 anos na costa de puntlândia, na somália, e tornou-se um pesadelo para a navegação comercial do índico, apesar da presença de força de navios da nato, da união europeia e dos poderes locais como a índia e a china.
estes ‘impérios do mal’ multiplicaram-se, sobretudo depois do fim da guerra fria e da globalização. antes temiam e sentiam-se restringidos pelos poderes político-militares das grandes potências. agora circulam à vontade, aproveitam a tolerância das leis, as garantias do processo, tudo aquilo que uma legislação feita para proteger os cidadãos inocentes contra os poderes do estado, põe ao serviço de todos, inclusive dos criminosos. e que estes – sobretudo os responsáveis do crime organizado – sempre com bons advogados, sabem utilizar, na sua defesa. os impérios da ‘beira-mar’ regionalizaram-se e globalizaram-se. são os novos impérios do mal e os estados, fragmentados e empobrecidos, não conseguem controlar os seus mercados.