no fundo, a grécia foi durante anos um pobre com tendências e manias de rico. o discurso que tantas vezes se ouviu em portugal faz ainda mais sentido na grécia: uma vivência acima das possibilidades. o problema para os helénicos foi que apenas em 2009 se começaram a divulgar os ‘disparates’ que o país cometeu durante anos.
louise armitstead, jornalista do daily telegraph, quis recuar no tempo e explicar o que correu mal para a grécia atingir o estado que hoje está no centro da discussão europeia e mundial. e o problema grego começou a sair do seu esconderijo em outubro de 2009.
o mês marcou a chegada de george papandreou ao cargo de primeiro-ministro helénico. o então recém-eleito líder do executivo constatou que, durante vários anos, o país tinha escondido à eu, à zona euro e à sua população o seu real défice público – ou seja, o dinheiro a mais que o estado gastava -, para continuar dentro dos limites das directivas comunitárias.
‘mimos’ acima das possibilidades
durante décadas, a grécia gastou dinheiro que não tinha, algo que se foi agravando, primeiro, quando o país entrou para a ue, em 1981, e depois, em 2001, quando aderiu ao euro, apesar dos seus índices económicos – leia-se, dívida -, não satisfazerem os mínimos exigíveis. estas duas entradas permitiram ao país aceder a dinheiro e condições de crédito que lhe permitiram prolongar por mais tempo o seu endividamento.
e como foi este endividamento prolongado? em suma, pelas medidas que mais recentemente os líderes europeus e da ‘troika’ – fmi, ue e bce -, foram apontando. pelo menos desde 1974, ano em que a grécia saiu de um conflito no chipre com a turquia, que o governo helénico construiu um modelo de estado providência que deu à sua população condições muito para além das que podia oferecer.
uma reduzida idade de reforma, pensões generosas e os 13.º e 14.º meses extra de salário são exemplos de medidas que apenas serviram para aumentar a dívida do país, algo que se foi agravando com a crescente tendência do povo grego para a evasão fiscal.
até aos últimos cortes, anunciados este mês, a grécia tinha um salário mínimo de 751 euros e, em 2011, a idade média de reforma para os helénicos situava-se nos 53 anos. outros números da crise grega foram destacados pela bbc: os quase 21% que a taxa de desemprego atinge e os 48% da população jovem desempregada juntam-se aos 27,7% da população que está em risco de pobreza ou exclusão social.
assim, quando papandreou anunciou as primeiras medidas de austeridade, em janeiro de 2010, a expressão «tarde demais» fazia todo o sentido.
«uma obsessão europeia pela austeridade»
em maio do mesmo ano, a ‘troika’ anunciava o primeiro resgate financeiro à grécia no valor de 110 mil milhões de euros, uma ajuda que, passados apenas alguns meses, se tornou insuficiente para a escala do problema grego.
papandreou era obrigado a ir apertando ainda mais o cinto da austeridade no país, algo que, proporcionalmente, ia aumentando a revolta e protesto nas ruas do país. o povo, habituado a décadas de ‘mimos’ por parte do estado, ia ficando cada vez com menos dinheiro face aos cortes nos salários e pensões.
no final de 2011, um segundo resgate financeiro era cada vez mais discutido, algo que teria sempre a contrapartida de obrigar o executivo grego a impor ainda mais austeridade no país.
em outubro, a tentativa de papandreou de realizar um referendo junto da população para aprovar uma segunda ajuda externa valeu-lhe a fúria dos responsáveis europeus, e a sua demissão. agora, em fevereiro de 2012, a grécia está já encaminhada para receber mais 130 mil milhões de euros de ajuda externa, em troca de mais austeridade no país.
mas a europa poderá estar a afundar-se com a sua insistência na austeridade. gordon brown, antigo primeiro-ministro britânico entre 2007 e 2010, condenou o que considera ser o pensamento reinante na mente dos líderes europeus: «se a austeridade está a falhar, é porque ainda não existe em quantidade suficiente».
nas suas palavras, destacadas pelo wall street journal, brown considera que continuar no caminho da austeridade apenas reforçará a estagnação económica, algo que ameaça a recuperação financeira não só da grécia, como dos restantes países que também já convivem com medidas de austeridade, um lote onde portugal está incluído.