A limitação dos mandatos é perversa

A Lei de limitação de mandatos autárquicos gera efeitos muito complicados.

foi muito debatida antes de entrar em vigor. e sempre se levantaram vozes indignadas por serem os autarcas os únicos visados pela lei.

é bom lembrar que há limitação de mandatos para o cargo de presidente da república. e aí, como se sabe, o limite é de dois mandatos. mas, nesse caso, estamos a falar de funções não executivas e que, normalmente, não acarretam impopularidade aos titulares do cargo.

com os presidentes de câmara e os presidentes de junta o objectivo da limitação foi, fundamentalmente, impedir o chamado ‘caciquismo’ – considerando o legislador que muito tempo no poder, em funções executivas de proximidade, pode acarretar fenómenos de clientelismo ou outros piores.

essa limitação impede a permanência no poder por tempo excessivo. mas quem deverá considerar o que é excessivo nessa matéria? não deverão ser os eleitores?

uma consequência, já conhecida, da referida lei (46/2005, de 29 de agosto) foi muito negativa: os presidentes de câmara que não podem recandidatar-se perderam desde cedo parte da sua força e autoridade. logo no primeiro ano do último mandato começa a luta pela sucessão, deixando de haver condições para a desejada governabilidade.

é quase como se existisse um mandato de pausa entre o do presidente que vai sair e o do próximo a ser eleito. não faz qualquer sentido.

veja-se a confusão gerada com a sucessão de rui rio no porto, um presidente de câmara que tem suscitado um consenso significativo em torno da sua actuação, mesmo fora do seu concelho (diria mesmo na generalidade do país).

já houve de tudo: ‘deserções’ na sua equipa, guerra pública nas estruturas partidárias concelhias, declarações de vários proto-candidatos, afirmações do líder de um dos partidos que integram a coligação maioritária. é a confusão generalizada!

rui rio tem defeitos? como todos. exagerou ou foi intransigente em demasia nalgumas matérias? talvez, não sei. mas certamente não merece terminar a sua gestão na capital do norte com este ambiente.

mas não é só com rui rio que esse efeito perverso se faz sentir. muitos presidentes de câmara que estão nessa situação, com quem tenho tido oportunidade de conversar, confirmam que é esse o ambiente nas autarquias que dirigem.

a haver limites, deviam ser 4 mandatos

que mal fez rui rio ao porto para ser obrigado a saír? ou telmo faria a óbidos? ou macedo vieira à póvoa do varzim? ou luís filipe menezes a gaia? ou joaquim mourão a castelo branco? ou carlos beato a grândola? ou guilherme pinto a matosinhos? ou antónio ganhão a benavente? ou ana cristina ribeiro a salvaterra de magos? ou desidério alves a albufeira?

é bom renovar? sem dúvida! é boa a alternância? também. mas seria melhor que fosse o povo a decidir do que uma lei a impô-lo.

mário almeida está há muitos anos em funções em vila do conde? jaime soares, também, em vila nova de poiares? seguramente que sim. falo desses dois casos de autarcas por quem tenho apreço pessoal e que têm um enorme trabalho nas suas terras, porque são sempre os mais referidos, juntamente com alguns autarcas da cdu em câmaras ribatejanas ou alentejanas.

todos esses autarcas vão ter de sair. alguns admitem candidatar-se a autarquias vizinhas, o que tem sido objecto de alguma controvérsia jurídica. mas, independentemente da questão legal, pergunto: no plano ético, o que seria preferível – candidatarem-se ao mesmo concelho ou mudarem para outro quando já não podem candidatar-se ao mesmo? se essas mudanças de território acontecerem é, certamente, porque têm obra feita nos municípios onde estejam a cessar funções.

como se sabe, já vários presidentes de câmara deixaram neste mandato as suas funções por não estarem para suportar esse penoso final de exercício do cargo. carlos encarnação, antónio capucho, manuel frexes, mata cáceres, josé silvano, entre outros, optaram por sair a meio. independentemente de outras razões pessoais – e de alguns terem assumido outras funções públicas – nenhum escondeu algum desconforto com esta norma da limitação de mandatos.

que conclusão, então? não deve haver limitação? tanto, não diria… mas se o objectivo era impedir fenómenos de trinta ou mais anos no poder, julgo que três mandatos é pouco. se alguns autarcas já estão há muito tempo, outros vão sair com a obra a meio. quando falo de obra, falo do projecto, dos compromissos de cada um. estar mais do que 20 anos torna-se quase um estar por estar, por muito mérito que se tenha. e em 16 anos já seria possível concretizar o sonho que cada um tenha para o desenvolvimento da sua terra.

elogio a antónio costa não faz sentido

será difícil mudar, ainda a tempo das próximas autárquicas, o respectivo sistema eleitoral. há muitos anos que se tenta, mas os mandatos sucedem-se e tudo vai ficando na mesma.

o governo já anunciou o propósito de introduzir mudanças que vão no sentido de propostas anteriores – e que implicarão, nos municípios, a existência de uma só lista, passando o presidente da câmara a ser o primeiro da lista para a assembleia municipal.

é uma mudança que parece simples, mas não é. geram-se várias interrogações, nomeadamente saber onde e como são escolhidos os vereadores.

faço notar que estas alterações, a terem lugar, aplicar-se-iam já às próximas eleições. o que, não sendo muito complicado, exige que estejam publicadas até ao final da presente sessão legislativa. não faria muito sentido mudar as regras do jogo a um ano ou menos do acto eleitoral.

devemos, igualmente, ter presente que está em curso um processo de alteração do mapa das freguesias, o que também acontece já próximo das eleições autárquicas. concretizando-se fusões, extinções, integrações de algumas das existentes, isso terá efeitos já nas eleições de 2013?

sinceramente, parece-me muita alteração e muita probabilidade de confusão a pouco tempo do fim do actual mandato. esta proximidade temporal não costuma ser muito propícia a sensatez nas decisões que, porventura, se tomem.

ainda para mais, há um aspecto muito importante que convém não descurar: as populações e os órgãos das respectivas freguesias têm de participar no processo de decisão.

no acordo que foi celebrado em lisboa, entre antónio costa e a distrital de lisboa do psd de então, os órgãos das diferentes freguesias não se pronunciaram. houve só um colóquio na assembleia municipal…

por isso, a referência elogiosa de antónio josé seguro a antónio costa, a propósito desse acordo sobre lisboa e do suposto envolvimento dos autarcas e das populações – tentando fazer um contraponto com o processo seguido pelo governo – não colhe, de todo em todo.

para concluir, direi que, no clima reinante em portugal, vai ser muito difícil mudar freguesias, alterar o sistema eleitoral e escolher novos candidatos, tudo isto em meses.