em casa, já o tratam por ‘mano sousa’?
em casa, não! só mesmo a minha irmã [risos]. o curioso é que há uma equipa de futebol de miúdos nos arredores de lisboa que se chama ‘mano sousa’. fiquei a saber disso este fim-de-semana, quando fui abordado por uma pessoa que me contou que o filho joga nessa equipa. achei uma delícia! é carinhosa a forma como a expressão entrou na minha vida, até porque toda a gente já me trata por ‘mano sousa’ aqui na redacção.
a ‘noite do futrebol’ está a ser o programa mais marcante da sua carreira?
cada projecto é um filho e jamais podemos dizer de qual dos filhos gostamos mais. está a ser uma experiência marcante, mas, em termos de carreira, já fiz tanta coisa que não consigo eleger o programa que mais retorno me deu. agora, percebo que estou a fazer algo completamente fora do registo normal dos programas de desporto, algo ‘fora da caixa’. por isso, percebo que o nível de satisfação das pessoas seja grande. o mérito é mais do paulo [futre] do que meu, mas gerir isto é um enorme desafio. tenho amigos que me dizem: ‘tens noção de que estás a fazer o melhor programa de desporto da televisão portuguesa?!’.
a forma como as pessoas o abordam na rua é diferente?
estava habituado a uma forma mais cinzenta de abordagem, por exemplo, quando ia jantar fora, as pessoas viam-me e perguntavam-me: ‘então, aquilo foi penálti ou não?’ ou ‘você é de que clube?’. essa pergunta era sempre feita. agora, não. vou a passar numa rua e vejo um tipo empoleirado na janela de um carro a gritar: ‘mano sousa, mano sousa’. estas reacções têm-me surpreendido.
disse que o mérito é de futre. é fácil conduzi-lo?
o futre não é uma pessoa que se conduza. costumo dizer que sou o treinador do futre e, no minuto que entra o genérico, estou ali só para o orientar. o génio dele é que manda no programa… e ninguém consegue controlá-lo.
mas combinam o alinhamento antes?
o programa é muito elaborado. até algumas falas são combinadas, como a abordagem a um tema ou a outro. depois, ele tem aquela coisa dentro dele que dispara… só a forma de falar, de contar histórias, é incontrolável.
há momentos em que vê a sua função esvaziada?
nunca, de todo. no programa, sou treinador, não sou jogador. não me cabe marcar golos ou fazer cruzamentos, cabe-me definir a táctica, a estratégia e, quando começa o programa, passo a bola ao paulo. a não ser quando temos convidados; aí, tenho uma parte de maior responsabilidade e não deixo que ninguém tome conta das minhas entrevistas. mas o resto, tudo o que é’ eu show futre’ é ‘eu show futre’.
há uma grande dose de incerteza nesse show. o facto de o programa ser em directo não lhe cria ansiedade?
nunca imaginei que se possa passar algum limite do razoável, mas pode acontecer. já tivemos colegas que deram bofetadas em directo, porque foram apalpados. aí, ultrapassamos o limite do razoável e eu não posso dizer que isso não me vai acontecer, porque um directo é completamente imprevisível.
joel neto, crítico de televisão, escreveu que ‘a noite do futrebol’ é um forte candidato a pior programa de futebol. mas que, por outro lado, não há nenhum melhor. que reflexão faz desta crítica?
respeitando ao máximo a opinião do joel, que é uma pessoa que estimo, o futrebol não é um programa de futebol. agora, pergunta-me: ‘então, é um programa de quê?’. não sei dizer. não sei definir o programa que estou a fazer. é uma experiência nova.
quando começou na rtp-porto, em 1993, começou logo no desporto. foi um acaso?
trabalhava na rádio press, quando abriu uma vaga na secção de desporto, no porto. sempre me senti muito ligado à área desportiva, por isso, foi um acaso com sentido.
o desporto entranha-se na vida de um jornalista?
é das coisas que mais gosto de fazer em tv. porque, para além da componente informativa, tem uma grande componente de espectáculo. um jogo de futebol não é um exercício clássico de jornalismo. um narrador, quando está a narrar um jogo e quando grita ‘golo’, mesmo dentro de toda a sua isenção, está a trabalhar para um espectáculo. e esse lado fascina-me: montar grandes operações, estar em contacto com multidões, procurar as melhores imagens, saber quantas câmaras, quantos helicópteros vamos usar.
vai ser um ano de ouro em termos desportivos – com o euro e os jogos olímpicos. que evento gostaria de cobrir?
já os fiz todos. mas adorei fazer os jogos olímpicos em atlanta, porque uma cidade quase que pára para um evento destes. saíamos às duas da manhã do recinto e tínhamos os restaurantes abertos 24 horas por dia. eu fazia, todos os dias, um trajecto do centro de imprensa até ao hotel que demorava meia hora a 40 minutos. e, quando acabávamos o trabalho de madrugada, o nosso momento de relaxe era fazer esse percurso a pé, mas demorávamos sempre duas horas a duas horas e meia. porque as ruas estavam invadidas por concertos, por barraquinhas de compras, discotecas ambulantes.
na época, estava na rtp. a estação pública foi uma boa escola para si?
aprendi quase tudo o que sei de televisão na rtp. foi lá que aprendi a falar e a escrever para tv. para além de ter sido uma escola, fez-me muito mais homenzinho. era uma empresa muito grande, com muitas pessoas, muitos egos e, para um rapazote com 20 e tal anos que vinha do porto, foi uma grande escola.
como é que a tvi surgiu na sua vida?
há um dia em que estou cheio de sacos de compras, toca o telefone e vi um número que não conhecia. até que me liga o mário moura e diz: ‘atende, porque a manuela [moura guedes] quer falar contigo’. depois, falei-lhe e ela disse-me: ‘és suficientemente maluco para vires para um projecto de malucos?’ sentei-me e pensei que trabalhar para a tvi… [pausa] a tvi estava na fase da pós-revolução e o desporto não existia, quase. mas há momentos em que somos levados pela loucura. e aceitei sem discutir detalhes. o que é certo é que, no ano a seguir, ficámos com os direitos de futebol. hoje, sou completamente feliz na tvi.
confirmou que era uma equipa de malucos?
completamente! na tvi, estava tudo a recomeçar, com a era josé eduardo [moniz], e havia um espírito aventureiro muito grande. as paredes não tinham história e este estúdio não tinha sequer dois anos.
gosta de pôr música e até já foi dj por brincadeira. que música dedicaria a futre?
ele gosta dos queen, portanto, dedicava-lhe um clássico do futebol, ‘we are the champions’. o futre é um campeão, um campeão brutal.