Uma frágil virtude que Villas-Boas foi esgotando

O ditado popular coloca a paciência como uma virtude, um valor que o milionário proprietário do Chelsea voltou a demonstrar não ter. Ao fim de oito meses, Roman Abramovich tirou André Villas-Boas do banco e voltou a recorrer à sua fortuna para despedir um treinador. Depois de Mourinho, a história voltou a ter um português…

o contexto que empurrou villas-boas para fora do chelsea foi-se construindo ao longo dos meses. os números não explicam tudo, mas ajudam a entender o rumo de queda livre que a reputação do português estava a tomar junto dos adeptos e responsáveis do clube de londres: em 40 jogos oficiais esta época, o chelsea registou 11 derrotas e apenas 19 vitórias em todas as competições.

nos últimos 15 encontros, a equipa montada por villas-boas alcançara apenas cinco vitórias, um registo que deixou a equipa no quinto lugar da premier league e com os joelhos a tremer face à possibilidade de não conseguir alcançar um lugar de acesso à próxima edição da liga dos campeões, uma prova onde, esta época, o português deixou os ‘blues’ à beira da eliminação – a equipa recebe esta semana o nápoles na segunda mão dos oitavos de final, após a derrota por 3-1 na primeira partida, em itália.

e continuamos a falar de números para mostrar que, além de milionário, o russo abramovich é pouco paciente. no total, o proprietário do chelsea gastou cerca de 25,5 milhões de euros só com o treinador português – primeiro, pagou perto de 15 milhões de euros para libertar villas-boas do fc porto, e agora, oito meses volvidos, terá pago uma verba a rondar os 9,5 milhões de euros como indemnização por despedir o técnico, que tinha assinado um contrato válido até 2014. tudo sem contar o dinheiro que o clube gastou nos salários do português.

a quantia que villas-boas obrigou abramovich a retirar da sua fortuna, que rondará os 13 mil milhões de euros, serviu igualmente para aumentar a soma que o russo já gastou com treinadores no chelsea, que só nos últimos oito anos despediu cinco treinadores. se tivermos em conta os últimos quatro anos, o the guardian lembra que foram gastos cerca de 64 milhões só com contratações e despedimentos de treinadores.

assim, villas-boas depressa foi esgotando uma já de si frágil paciência do russo que, ainda assim, se deu ao trabalho de despedir o português em pessoa, um ‘privilégio’ que só tinha concedido a avram grant. de resto, josé mourinho, luiz felipe scolari e carlo ancelotti tinham todos recebido a notícia por via de terceiros, leia-se, súbditos de abramovich na direcção do clube.

o que se juntou aos números

com o despedimento oficializado no domingo, a imprensa inglesa não demorou a apontar as razões que foram encaminhando andré villas-boas para fora do clube, mesmo que, desde o início, tivesse sido uma aposta quase pessoal de roman abramovich.

o treinador português chegou a londres envolto numa áurea de prestígio. da época anterior trazia o campeonato e liga europa conquistados, ao leme do fc porto. em cima da mesa esteve um contrato de três anos para liderar um projecto que, em suma, visava rejuvenescer o plantel do chelsea e colocar a equipa a jogar um futebol mais atractivo.

e rejuvenescer porquê? posto de forma simples, as principais figuras dos ‘blues’ eram e continua a ser trintões. jogadores como didier drogba, frank lampard, john terry, florent malouda e ashley cole já ultrapassaram a barreira dos trinta, e foi precisamente este lote de jogadores com quem villas-boas terá desenvolvido atribuladas relações.

e foi este grupo que, nas últimas épocas, partilha uma personalidade que transformou o balneário do chelsea num dos mais difíceis de lidar na europa. já em 2008, lembre-se, foram vários os rumores que deram conta de que fora este grupo de jogadores a forçar a direcção a despedir luiz felipe scolari, o brasileiro que aguentou menos um mês que villas-boas ao comando da equipa londrina.

a tudo isto acrescenta-se o pobre desempenho da equipa, tanto na premier league, onde somou sete derrotas, como na liga dos campeões, onde se apurou sem brilho para os oitavos de final, fase em que está agora à beira da eliminação.

a eloquência que andré villas-boas sempre mostrou no seu domínio da língua inglesa permitiu à imprensa desmistificar um mito que já vinha sendo formado: que a barreira da língua era o principal obstáculo ao sucesso de treinadores estrangeiros. neste caso, a barreira foi erguida pelos próprios jogadores.

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