Entrevista com Pedro Gadanho, curador no MoMa

Mês e meio depois de ter assumido o cargo de curador no departamento de Arquitectura e Design do Museum of Modern Art (MoMA), em Nova Iorque, Pedro Gadanho esteve em Guimarães, onde anunciou os vencedores de Performance Architecture. O concurso de ideias, que comissariou, elegeu cinco projectos de intervenção temporária no espaço público da Capital…

o que é que este concurso lhe disse sobre a criatividade portuguesa?
a relação entre arquitectura e performance enquanto tradição artística e modo mais interactivo de viver a cidade é um tema que pesquiso há muito tempo. optou-se por dar voz aos jovens, enquanto os maiores protagonistas mundiais foram membros do júri. houve concorrentes do japão, alemanha, frança, inglaterra ou américa latina, mas curiosamente todos os projectos escolhidos foram portugueses.

porquê?
há uma boa cultura de projecto em portugal e, talvez por uma maior proximidade e conhecimento, houve respostas mais concretas para a cidade. houve um grupo que percebeu que guimarães tem imensas fontes e pensou em apropriá-las como piscinas públicas, o que também é altamente performativo. chama-se fountain hacks.

o concurso apelava à apropriação de espaços controversos, não previstos…
pensamos que poderiam aparecer projectos mais políticos. a ideia é activar o espaço urbano e ligá-lo à população, sem que isso tenha a ver com a tradição monumental. bodyphonic é um exemplo disso, porque serão montados andaimes na escadaria do paço dos duques, a mais alta instituição da cidade. nesses andaimes há elementos que podem ser usados como peças musicais. agricultural mountain é uma instalação com blocos de feno cujo espaço interior pode ser usado para concertos.

a crise económica propicia esse tipo de projectos?
a população pode tomar conta dos espaços urbanos sem que seja o estado a suportar as intervenções. os arquitectos têm de arranjar maneira de fazer os projectos, mesmo quando não são solicitados. muitos não conseguem emprego e têm dificuldade em encontrar os primeiros clientes, mesmo nos estados unidos. já não se pode ficar no ateliê à espera de projectos.

isto implica equipas multidisciplinares e uma noção menos perene da arquitectura…
espero que a arquitectura perca uma aura demasiado cara e que se contornem os orçamentos com soluções criativas. é a única maneira de sobreviver numa europa com recursos cada vez mais apertados. nos últimos anos, portugal teve uma injecção brutal de fundos, há habitação mais do que suficiente e construíram-se espaços como este centro cultural vila flor, que é magnífico. agora, é preciso ocupar os equipamentos.

este é o primeiro projecto que o obriga a voltar a portugal depois de ter assumido a curadoria do moma. pretende manter essa ligação ao país?
também tenho um projecto em desenvolvimento no museu do design e da moda (mude). é provável que regresse esporadicamente em conferências e seminários, mas estou num sítio altamente exigente a nível do empenho. fazer curadoria fora do moma torna-se difícil. neste caso, monitorizo à distância e venho cá nos momentos cruciais.

a oportunidade no moma surgiu no tempo certo para evitar uma certa estagnação profissional?
estive prestes a desistir da curadoria, que conciliava com a arquitectura, a docência e a escrita, porque não queria repetir projectos. o moma permite-me passar para outra escala. não é que os projectos sejam muito maiores, porque a sala de arquitectura é um espaço contido, de cerca de 300 m2. a diferença é que o impacto nos media é brutal, até porque o moma tem 2,8 milhões de visitantes por ano.

o moma pode ser considerado o museu mais referencial em termos de curadoria de arquitectura?
em termos históricos, completamente, até porque foi o primeiro museu a ter um departamento de arquitectura. em setembro, terei o meu primeiro olhar sobre a colecção, talvez de uma perspectiva mais política, face ao papel usurpador que tem tido sobre ela a economia. mergulhei directamente no trabalho, que está bem definido: sou curador de arquitectura contemporânea a partir de 1980.

pensa que a marca escola do porto teve importância na sua selecção?
sim, enquanto lugar de tradição, herança e de um reconhecimento internacional grande. temos dois prémios pritzker no porto. mas sempre fui um elemento crítico da escola, no sentido de estar mais virado para fora. sem isso não teria aqui chegado. mas há uma aptidão portuguesa para usar o projecto e responder a situações diferentes.

qual é a percepção que existe em nova iorque dos criadores portugueses?
há o reconhecimento de uma capacidade quase alquímica para misturar referências e gerar um pensamento interessante. este é um dos últimos redutos para o futuro da europa. temos indivíduos com alta formação e projectos de muito valor e é pena que não consigam mais oportunidades em portugal. vir para o estrangeiro nem sempre é fácil, porque há mais concorrência, mas na minha carreira como professor devo ter dado aulas a uns 600 alunos e metade deles seguiram para outras paragens.

ainda não tem a família consigo. como tem sido, em termos sociais, a experiência em nova iorque?
estou numa posição privilegiada, com um grande índice de reconhecimento, e tenho tido uma vida social intensa. tenho tentado perceber o modo de funcionamento de uma grande cidade como nova iorque, que tem zonas completamente díspares. por vezes faço quatro ou cinco quilómetros a pé para sentir as diferentes áreas. viver em brooklyn não é o mesmo que viver no soho, por exemplo.

e já decidiu a zona em que vai morar?
em princípio será em carroll gardens, em brooklyn, onde há um sentimento de cidade mais europeu, próximo de berlim ou londres. tenho vivido em vários sítios, em casas de amigos ou em espaços que tenho subalugado. estou em constante circulação, porque tenho disponibilidade para isso. quando a família chegar será diferente.