na rtp, era habitual os directores de informação serem também pivôs. no seu caso, não acontecia isso, mas regressou agora à antena. estar no ar é importante?
para exercer a função de director, não. para aquilo que dizemos ser a gestão da carreira, diria que sim. agora, sempre separei as águas: sempre achei que, tendo funções de direcção, essas funções eram prioritárias em relação ao facto de estar na antena. por isso, só faço espaços que tenham alguma irregularidade e que não exijam muito de mim. é difícil compatibilizar.
mas, em termos de gestão da carreira, achou que este era um bom momento?
com toda a franqueza e sem falsas modéstias achei que era mais importante para a rtp. estar ou não no ar, para o que faço e o que é a minha cotação no mercado, não acho que seja importante. mas acho interessante a rtp poder contar com mais uma cara.
há quantos anos não apresentava?
de forma regular, há dez.
e como foi retomar esse trabalho com o programa sobre idosos que fez recentemente?
foi muito mais tranquilo do que poderia pensar. num dado momento, o genérico estava no ar, a luz vermelha acendeu-se e pensei:’‘estou no ar’.
foi rever as imagens do programa?
era uma coisa que tinha por hábito fazer quando apresentava jornais na sic. não logo a seguir, mas no dia a seguir ou coisa que o valha. mas não revi o programa por inteiro; revi partes.
ficou contente com a sua prestação?
não completamente e isso tem a ver com a minha natureza – sou um eterno insatisfeito. a certa altura, tive uma discussão – nunca perceptível para o espectador – com a rosário salgueiro, coordenadora do programa na régie e por quem tenho um enorme respeito profissional. ela achava que eu deveria lançar mais uma peça e eu achava que não. pedro santana lopes era convidado e eu sabia que ele estava, e está, a passar por uma situação do ponto de vista pessoal muito dolorosa, pois tem o pai num estado de saúde debilitado. e desafiei-o a contar esse seu episódio de vida. foi um momento forte, mas se tivéssemos a peça não teríamos tido tempo para isto. enquanto estou no ar tenho a veleidade de pensar no que o espectador está a pensar.
é possível ter essa agilidade em directo?
acho que é possível e acho que sei fazê-lo. mas não estou a dizer que é um fenómeno paranormal. calma! isto é só a minha percepção das coisas. um dos problemas das pessoas que trabalham em tv é passarem a vida a falar dos espectadores e estarem-se nas tintas para eles. isso é verdade para os jornalistas e para os apresentadores do entretenimento que falam sempre do ‘meu público’ e depois não ligam nenhuma às pessoas.
não ligam como?
desde logo no essencial: não percebem que estão a falar para elas. estabelecer cumplicidade entre o emissor e o receptor é a chave, e insisto muito nisso com os mais novos. por exemplo, num directo, o pivô chama e o repórter responde. o repórter depois fica a falar para as pessoas e não para o zé. por isso, não faz sentido dizer: ‘bom, zé, como te dizia…’. mas não está lá zé nenhum! estão lá as pessoas. é fatal excluir o espectador.
deu a cara na questão das audiências, em defesa da rtp. e se se verificar, afinal, que o telejornal não é líder?
o problema não é saber se o telejornal é o primeiro ou o terceiro, o meu problema é saber a verdade. têm sido feitas confusões em duas frentes: uma é que estamos a tratar disto porque é uma questão que nos diz respeito. eu digo que estamos a tratar disto porque queremos saber a verdade. a segunda é: ‘bom, mas uma estação pública está preocupada com as audiências?’. não, uma estação pública está preocupada em saber a verdade. se nós tínhamos um indicador e temos agora fundadas dúvidas sobre a fiabilidade da nova medição, queremos apurar a verdade. é isso e apenas isso.
a questão de a estação pública não estar preocupada com as audiências não é bem assim. não se faz um canal para não ser visto por ninguém, pois não?
desse ponto de vista, ninguém faz uma tv para não ser vista. mas o que nos move aqui é saber a verdade. mas é claro que dá jeito dizer outras coisas.
irrita-o que a rtp tenha ficado sozinha na luta?
não, não, não. inquietava-me se não tivesse a convicção de que alguma coisa está mal. há aqui muitos interesses instalados e a rtp pode estar sozinha na verbalização do tema, mas não está sozinha na discussão do tema. é bom que isso fique bem claro.
de regresso à rtp, em 2011, disse que era ‘uma solução forte’. com as novas audiências, que resultados vai ter de apresentar?
o meu trabalho mantém-se o mesmo e nós não nos desviámos nem um centímetro do que estávamos a fazer e queremos fazer. temos um conjunto de obrigações e os espectadores têm em relação à rtp um conjunto de expectativas que têm de ser cumpridas. as pessoas não estão à espera que a informação da rtp se posicione da mesma forma da dos canais privados. a rtp não tinha um problema de posicionamento editorial quando aqui cheguei; não foi preciso reposicionar a estação. foi preciso introduzir novos conteúdos, mexer na organização da equipa…
depois de ser director de programas disse que deixava uma nova geração de comunicadores na estação pública. está a tentar criar uma nova geração de jornalistas?
as empresas de comunicação precisam de ter uma grande capacidade de regeneração e isso faz-se com um equilíbrio entre as pessoas mais experientes, mais velhas – não vamos ter medo de usar a palavra – e a necessidade de lançar caras novas ou com menos visibilidade. mas tentando responder à pergunta, sim, tenho procurado fazer isso na informação. mas estamos a falar de jornalistas com muita tarimba. são sólidos e, na informação, isso é mais importante do que no entretenimento, onde o código próprio do entretenimento permite disfarçar algumas insuficiências.
como?
há todo um embrulho que protege o apresentador, dispositivos que têm a ver com a produção do programa.
um sorriso, uma piada também funcionam?
claro. mas a televisão é sempre transparente – é possível recorrer a isso, mas não se pode levar ao limite. na informação não é possível: ou as pessoas são sólidas em relação ao que têm para comunicar, ou isso sente-se.
na sua despedida da rtp para regressar à sic, em 2008, citou pessoa. lê poesia?
sim, embora o que me fascina em pessoa não é só a obra dele, mas a personalidade. li muitas biografias, fotobiografias, para além de ter lido uma boa parte da obra dele e dos seus heterónimos.
e o que está a ler agora?
de poesia, nada. estou a reler – mas não sei se vou ter fôlego – a história do período de margaret thatcher em downing street. comecei mas não avancei muito. em férias, às vezes os livros não chegam, mas no dia-a-dia tenho pouco tempo para ler. somos bombardeados por informação e eu não escapo a ela. sou um fashion victim no que diz respeito a isso: estou sempre de ipad na mão… às vezes dou por mim a ler uma estupidez qualquer, um link do the guardian que não soma nem atrasa nada, em vez de estar a fazer um puzzle com o meu filho…