Conversa a três

Em conversa com um amigo americano e um amigo angolano trocámos impressões sobre o andar dos respectivos países: eu pergunto-lhes pelas eleições e pela estabilidade, eles perguntam pela continuidade ou fim do euro e da União Europeia.

e pelo que vai acontecer a portugal.

todos temos noção da volatilidade, hoje, das principais categorias políticas e económico-financeiras: líderes, eleitorados, moedas, energia, comida. eles, em países e continentes onde a política ainda conta muito – a américa por que é a primeira potência mundial, angola porque se quer afirmar com um participante importante do xadrez africano, consolidar a estabilidade interna e desenvolver a economia.

os estados unidos têm pela frente oito meses de campanha eleitoral. as incógnitas são duas: quem vai ser o candidato republicano? e será ele capaz de bater obama?

à primeira questão – o meu amigo republicano conservador diz-me que há só duas respostas possíveis – romney ou santorum. gingrich não arranca e é extremamente vulnerável, perante o seu próprio eleitorado, a nível de conduta familiar e financeira. ron paul, o libertário, tem uma base de adesão mas não passa daí.

romney tem o aparelho do partido e o dinheiro. santorum tem os princípios. o meu interlocutor não morre de amores por romney, que acha um cata-vento de posições de liberal para conservador, conforme os auditórios e que, perante obama será ‘mais do mesmo’. logo é natural que perca.

santorum tem os princípios, mas se gingrich se mantiver na corrida, a comer-lhe alguns dos conservadores, ser-lhe-á difícil bater a logística e a máquina de romney. mas se chegar a novembro pode surpreender.

o meu amigo angolano pensa que a estabilidade política é a condição do sucesso de angola e de toda a áfrica austral. que esta estabilidade, na região, vem precisamente dos cinquenta anos de instabilidade por que passaram e que ultrapassaram. e pensa que angola – como moçambique – por ter tido a guerra da independência e a guerra civil se vacinou contra a instabilidade. pode ter conflitos, lutas palacianas pelo poder, até lutas pelo voto popular. mas serão combates políticos, não conflitos fratricidas.

ligado ao mpla, vê com bons olhos a entrada em cena de um homem como abel chivukuvuku, um líder nato, capaz de falar para um público culto, elitista, mas também para o povo comum. alguém que tem inteligência, conhecimento, experiência das duas angolas. e cautelosamente optimista como o americano que, entretanto, é sensível à decadência da influência americana no mundo.

eu acabo por ser o mais pessimista. acho que a união europeia vai continuar neste ‘time’ sem definição. os alemães – a senhora merkel, as oposições, os banqueiros – não podem ou não querem assumir, pelo bce, a garantia da eurolândia. assim sendo, e por muito tranquilizantes que sejam os discursos e as cimeiras, a situação financeira vai continuar a degradar-se. porque sem garante de última instância, não vai ser possível baixar as taxas de juro das obrigações dos países ‘mais fracos’ e o peso da dívida e dos juros compostos da dívida irá agravar-se. isto porque cada reforma será a conversão das taxas por um valor mais alto.

sem desvalorização, as economias não poderão tornar-se competitivas e o agravamento cumulativo da situação económica das famílias poderá levar a uma explosão social a médio prazo que só agravará as coisas, mas que é capaz de acontecer. é um dilema trágico, e podemos pagar décadas de insensatez.

em nome da ue e da divisão europeia do trabalho, ficámos sem agricultura, sem pescas, sem indústria.

mas também não criámos a tempo as estruturas para uma alternativa.

assim, estamos a fazer o que fizeram os nossos antepassados há 600 anos. ir para fora à procura de uma base de sobrevivência.

não vai ser fácil, mas não há alternativa.