PSD fez tudo para ajudar António Costa

O PSD não contribuiu só para José Sócrates subir ao poder: também ajudou muito a lançar António Costa no seu actual percurso…

escrevi a semana passada sobre o que teria dito no congresso do psd se lá tivesse discursado. falei do balanço que o psd deve fazer, introspectivamente, sobre a ascensão e o exercício de poder por josé sócrates.

o poder foi-lhe servido numa bandeja – com eleições legislativas a meio de um mandato em que a primeira metade fora caracterizada pela austeridade dura de manuel ferreira leite no governo de durão barroso.

de tal modo fora dura e difícil que, em julho de 2004, o psd e o cds tiveram, juntos, a pior votação de toda a história da democracia portuguesa. falo das eleições europeias em que ferro rodrigues, líder de um ps causticado pelo processo casa pia, infligiu uma derrota sem precedentes à coligação liderada por durão barroso.

mas, sobre josé sócrates e a cumplicidade de vários sectores da sociedade portuguesa, incluindo o psd, já escrevi na passada semana.

hoje quero falar do que se passou com antónio costa.

já era um dirigente político destacado, ministro de várias pastas.

mas foi obviamente em 2007, com o triunfo nas eleições autárquicas em lisboa, que antónio costa entrou na rampa de lançamento de que ainda beneficia.

se, em 2005, parte do psd contribuiu para entregar o poder a sócrates, em 2007 boa parte do psd tudo fez para entregar a câmara municipal de lisboa ao seu actual presidente.

querem maior amigo do ps do que o psd de algumas ocasiões? o psd estava no governo e detinha a cml – ora, em dois anos e meio, ficou sem nada.

recordo que carmona rodrigues ganhou a câmara de lisboa em outubro de 2005 – e, a partir de 2006, houve uma sucessão de acontecimentos que levaram o próprio psd a deitar a cml abaixo, em abril de 2007.

como foi possível? qual foi a razão? essa questão deveria fazer o psd meditar muito…

até porque, em junho de 2007, antónio costa ganhou com cerca de 30% a um psd dividido entre a lista oficial de fernando negrão e um movimento independente de carmona rodrigues, que juntos teriam conseguido uma votação superior à obtida pelo candidato do ps.

costa tem boa imprensa, seguro não

antónio costa encontra-se, neste momento, numa situação privilegiada.

ele próprio chamou caminho aberto ao livro que agora apresentou: pode ir para a cml, pode tentar ser candidato à liderança do ps e à chefia do governo, ou pode concorrer a belém.

homem com mérito? sem dúvida! mas há muitos outros na sua área política que também o têm e não gozam, nem pouco mais ou menos, da mesma condescendência, da mesma compreensão, da mesma simpatia, de que antónio costa desfruta na generalidade da comunicação social.

foi ministro da administração interna, foi ministro da justiça, pastas que concedem um poder significativo em vários domínios. toda a imprensa é, obviamente, independente. mas, como em tudo na vida, há uma que é mais do que outra. quantas pessoas gostariam de ouvir sobre si próprias: «pode ser candidato aos três principais lugares do estado»?

em 2002, 2003 e 2004 diziam algo parecido sobre mim próprio. mas não com simpatia, não com condescendência, não com compreensão. é muito diferente uma pessoa saber que tem esses caminhos abertos e que os pode calcorrear sem ‘rajadas de metralhadora’ ou ‘tiros de pistola’ – ou, por outro lado, ter a certeza de que, mais dia menos dia, se se meter ao caminho, choverão pedras dos sectores que mais se fazem notar na sociedade portuguesa.

antónio costa está há quase 5 anos à frente da cml e não teria lá entrado se o psd não tivesse deitado a câmara abaixo.

antes da cml, esteve 2 anos no governo, antes esteve no parlamento europeu e tinha estado no governo de antónio guterres.

por isso, quando ouço estabelecerem-se diferenças entre antónio josé seguro e antónio costa, afirmando-se que seguro esteve sempre em cargos políticos, eu pergunto: e antónio costa? foi vereador da câmara de loures, foi deputado, foi líder parlamentar, foi deputado europeu, foi ministro da justiça, foi ministro da administração interna – e é, como disse, presidente da cml há 5 anos.

a diferença é que, ao contrário de costa, seguro nunca foi apoiante de sócrates.

não escrevo isto para entrar nas questões internas do partido socialista ou para dizer que um é melhor do que outro. escrevo, tão-só, para demonstrar o que é a realidade dos factos ou a verdade falada.

veja-se o que é a força da simpatia, compreensão, complacência, condescendência, de boa parte da comunicação social. uns são rasteirados, enquanto outros são levados às cavalitas.

hão-de reconhecer – aqueles que costumam ler esta página – que me insurjo com muita frequência contra os dois pesos e as duas medidas. não quero tirar valor a antónio costa. mas, tendo valor, pode afirmar-se por ele, sem necessitar de injustiças e falsidades.

o ps tem adversários generosos

josé sócrates esteve 6 anos como primeiro-ministro e antes tinha estado quatro anos no governo com antónio guterres.

foram 10 anos, dos quais se destacam os tempos em que foi ministro do desporto com o euro 2004, ministro do ambiente com a co-incineração, e, principalmente, os seis anos como chefe do governo.

e estes seis anos foram-lhe proporcionados, também, por pessoas do psd.

no final deste mandato, em outubro do próximo ano, antónio costa contará seis anos de presidente da câmara da capital do país. seis anos esteve josé sócrates na chefia do governo, seis anos leva antónio costa à frente da cml… como diriam os nossos avós: «sim, senhor. bonito trabalho».

o que pensaria outro partido se tivesse proporcionado uma oferenda política destas aos seus principais adversários? que consequências é que isso teria? não consigo imaginar. mas assobiar para o lado e fazer de conta que não aconteceu é um erro tremendo.

esta é a realidade nua e crua. há quem acredite que a culpa é normalmente minha. mas em 2006 e 2007 já estava fora da cml… carmona rodrigues ganhou com ampla margem em outubro de 2005, e eu tinha saído um mês antes. não era, pois, por minha causa que ele não podia lá estar e continuar. não fiz nada para o derrubar. será que todos poderão dizer o mesmo?

bendito partido socialista, que adversários tão generosos tem.