Teste à CPLP

Mais uma vez a Guiné-Bissau correu o risco de um golpe. Alguns dos políticos vencidos na primeira volta das eleições presidenciais tentaram influenciar os militares no sentido de uma intervenção armada.

o argumento tinha a ver com alegadas fraudes e irregularidades nas votações de 18 de março, que deram ao actual primeiro-ministro, carlos gomes jr., e candidato do paigc à presidência, uma larga maioria sobre o segundo classificado, kumba yalá. carlos gomes teve 48% e kumba yalá 23%.

fraude por fraude, poderia dizer-se que se tal houvesse, não se perceberia por que é o primeiro classificado, que ficara a uns escassos milhares de votos da maioria absoluta, não a teria consumado, assegurando a vitória logo à primeira volta. o outro argumento, sobre a desactualização do recenseamento também não colhe, pois todos os candidatos tinham concordado em fazer as eleições com o actual recenseamento.

na verdade, estes protestos tinham, essencialmente, o objectivo de deslegitimar o processo eleitoral e criar uma crise e um vazio sobre o qual os militares com ânimo golpista, que estão longe de fazer a unanimidade, pudessem justificar a sua intervenção. a oposição recusou comparecer, o processo está viciado, logo, manda quem pode.

um jogo altamente perigoso. em poucos anos, se bem que não se repetisse a guerra civil de um ano entre junho de 1998 e maio de 1999, foram assassinados na guiné-bissau, um presidente da república (nino vieira) e três chefes militares – ansumane mané, veríssimo seabra e tagma na waié, além de outros políticos e oficiais liquidados em condições misteriosas.

o governo de carlos gomes jr. tem conseguido, progressivamente, dominar a violência interna, endireitar as contas do estado e combater o narcotráfico, evitando que o país se torne um estado falhado, risco que permanece em suspenso.

mas nas últimas semanas, a pressão e a intriga para influenciar os militares guineenses foi fortíssima. por outro lado, pretendeu-se também, através de sofisticada manipulação, levar o governo angolano a retirar a missão militar que tem vindo a colaborar, no plano bilateral, para a reforma das forças armadas da guiné-bissau.

pode dizer-se que, para evitar um desfecho trágico, foi fundamental a cooperação dos vários países da cplp – sobretudo angola e portugal – mas também de outras potências. conseguiu-se pacientemente desmontar os factores mais perigosos e perturbadores e está-se em vias de reconduzir a presença militar para uma missão de conteúdos mais alargados, no âmbito multilateral, provavelmente com a cooperação, sob a égide das nações unidas, de países ou blocos regionais interessados na manutenção da paz e da ordem na guiné-bissau, como a cplp e a cedeao.

em política, sobretudo em política internacional, os custos da repressão e controle são sempre muito mais elevados que os custos da prevenção. a cplp não se pode dar ao luxo de ter, entre os seus membros, um estado falhado que seria o que a guiné-bissau ficaria, caso os planos ou tentações de desestabilização fossem para a frente.

tanto mais que, com a violência crónica na nigéria, a tensão pós-eleitoral da costa do marfim e na guiné conacri, o golpe militar do mali, a presença de bandos ligados à al-qaeda na mauritânia, a importância do crime organizado e as suas ligações ao terrorismo em toda a região, auguram o pior, no caso de uma saída da normalidade.

este é um dos primeiros testes à cplp como instituição de segurança regional e sobretudo para os estados-membros.

vejamos se o consegue vencer.