quando é que começou a trabalhar para o estado?
em 1972, foi quando tomei essa opção. tinha outra hipótese e na altura da entrevista disse: quero mesmo isto. optei por convicção.
e se fosse hoje?
sabemos lá nós… mas não estou arrependida. agora, sei lá… o contexto mudou. a ideia de estado é completamente diferente. acho que tomei a opção certa e não me arrependo do percurso profissional que fiz.
a reputação dos gestores públicos tem-se degradado. tem essa noção?
não senti até hoje essa grande dificuldade. muito antes desta crise, tínhamos procedido ao saneamento financeiro da empresa. por isso, não temos aqueles problemas que se vieram a colocar a muitas empresas: elevado endividamento e falta de crédito para novos investimentos. é um problema que não temos, estamos a efectuar um investimento de 40 milhões de euros com os capitais próprios da empresa. a questão da opinião pública nunca me preocupou muito. por exemplo, a administração da aps ficou exactamente com o mesmo vencimento apesar dos cortes. se me perguntar se me sinto incomodada pelas notícias contra os gestores? não, até porque a imprensa por vezes não diz a verdade. se dissesse sabia quanto se ganha.
o presidente da carris queixou-se de ter sofrido pressões políticas para tomar decisões que acabaram por prejudicar a empresa. já sentiu essas pressões?
não tenho esse registo, no passado ou no presente. a situação das empresas de transporte público urbano tem características diferentes. connosco a influência é mais indirecta do que na carris.
já teve convites do sector privado?
gosto de trabalhar no público, foi uma opção de vida tomada há muitos anos. naquela altura era muito mais jovem e tinha a convicção de que ia mudar o mundo e a melhor forma de o fazer era no sector público. por duas vezes tive oportunidade para sair para o privado, ponderei, e nas duas vezes achei que não seria tão feliz como no sector público. há um certo tipo de missão e sinto-me bem neste sector. pode parecer estranho, mas é verdade.
e conseguiu mudar alguma coisa?
o mundo não consegui e não tenho, neste momento, sequer a aspiração de que vá conseguir (risos). tenho a sensação de dever cumprido, é uma sensação gratificante, que vale o que vale.
a austeridade enfraquece o capital humano ao dispor do estado?
pelo caminho, tem havido perdas de pessoas que poderiam ter contribuído mais no sector público, e às tantas há um certo desânimo das pessoas por não se sentirem reconhecidas. é humano acontecer e não vou negar que não tenha acontecido. têm-se perdido valores. pessoalmente, encaro essas coisas de uma forma sempre natural. não é fácil ir abaixo com qualquer acidente de percurso. às vezes sentimo-nos injustiçados, mas temos de continuar a lutar e a ter objectivos de longo prazo.
será possível nos próximos anos captar bons gestores para as fileiras do estado?
será mais difícil. é uma questão geracional. nos mais jovens não vejo quase ninguém com a decisão tomada de ir trabalhar para o sector público. não vejo os jovens talentos tomarem essa decisão. o estado já está a perder. e vai perder-se muita gente.