uma das suas primeiras decisões como presidente do ccb foi cancelar a aplicação do acordo ortográfico dentro da instituição, indo até contra a tomada de posição do governo. mantém essa guerra anti-acordo?
agora com a seguinte nuance: a declaração de luanda há 15 dias, em que foi patentemente reconhecido que este acordo precisa de ser revisto, que angola e moçambique não o ratificaram e, portanto, não está em vigor. e, mais ainda, não existindo o vocabulário comum da língua portuguesa, penso que não há outro remédio senão rever o acordo. acho que, para ninguém perder a face, deveria ser suspenso aquilo a que se chama a aplicação do acordo ortográfico. esta é uma fraude do anterior governo, que deu como existente um vocabulário ortográfico comum que não existe, e que veio dar como tendo entrado em vigor um tratado internacional que não entrou em vigor.
o secretário de estado disse que o acordo estava em vigor e era para aplicar, as escolas já aplicaram…
as escolas não podem ser condenadas a desfigurar a língua portuguesa.
mas as crianças já estão a aprender com o acordo.
mas estão a aprender mal e portanto espero que haja maneira de corrigir isso. quem avisou das consequências a tempo só pode lamentar que as coisas tenham chegado a esse ponto. espero que se faça uma revisão sensata, que tome em consideração uma série de aspectos científicos, técnicos, políticos, sociais e culturais. até aqui tivemos uma espécie de aplicação mecânica de uma coisa que ninguém sabe o que é e que ninguém consegue aplicar.
não será complicado voltar atrás?
quando há um desastre também se reconstrói. isto foi um desastre para a língua portuguesa. nós temos é de ser punidos pela irresponsabilidade com que alinhámos nisto e suportar as consequências.
chegou a dizer que por trás do ao estavam desejos economicistas de grupos ou lóbis brasileiros.
isso aconteceu inicialmente. hoje penso que tem mais a ver com teimosias pessoais. perdeu-se o império colonial e criou-se uma espécie de metafísica da língua, transferindo para o plano ontológico da língua essa noção de império frustrada. a verdade é que está a desfazer a língua. introduz na língua portuguesa situações que virão a desfigurar a sua pronúncia. porque é que toda a gente reage? porque a língua tem uma dimensão identitária absolutamente real.
sempre se manifestou contra o acordo.
há 26 anos que estou nesta guerra…
enquanto escritor tem toda a liberdade para escrever como bem entender. mas enquanto pessoa nomeada pelo estado para estar à frente de uma instituição…
isto não é um serviço público. é uma fundação de direito privado de utilidade pública, e nessa medida eu não posso aplicar uma resolução que não é aplicável. assenta numa decisão fraudulenta tomada pelo governo sócrates. se tenho obrigação de promover e defender a cultura portuguesa, tenho obrigação de não o aplicar.