era um motivo para alegria. duas semanas antes, os golpistas tinham tomado conta da capital, atacado a casa do primeiro-ministro, e ocupado as rádios, os partidos políticos, as sedes e os símbolos do estado.
teriam feito tudo isto, segundo os próprios, por causa de um pacto secreto entre o governo da guiné e o governo de angola. mas a verdade é que tinham sido manipulados por kumba ialá, que induzira os militares a tomarem o poder, para não serem afastados da cena política.
justificação patética a ‘conspiração’ angolana, cuja ‘prova’ nunca apareceu. o motivo real foi a manipulação dos militares, inquietos perante a reforma das forças armadas.
uma missão militar angolana estava a colaborar nesta reforma. o governo de carlos gomes jr. tinha pela primeira vez saneado as finanças do país e estava a pagar a tempo e horas os salários dos funcionários. e gomes jr. batia o adversário por uma larga maioria, 49% versus 23% kumba ialá.
o governo português – e os outros governos da cplp – actuaram com rapidez e fizeram a coisa certa: denunciaram o golpe e a sua origem; garantiram a vida de carlos gomes jr. e de raimundo pereira, responsabilizando os seus captores; trataram de obter uma condenação unânime, dos africanos e da comunidade internacional, e garantir o regresso ao status quo ante.
sem qualquer apoio popular e divididos entre si, os golpistas e a rede civil do golpe entraram em crise e passaram da arrogância extrema para as concessões parcelares.
mas, bruscamente, a organização regional cedao aparece em cena: os golpistas recebem a sua missão, aceitam parte das imposições, libertam o presidente interino e o primeiro-ministro. agora, surge em cima da mesa um pacto esquisito: em vez do regresso à situação legal e legítima anterior ao golpe, há uma espécie de acordo em que a cedao assume a arbitragem da questão, as vítimas são restituídas à liberdade e vai haver um período de interregno de um ano, em que golpistas e governantes legítimos partilharão o poder.
é como se depois de um assalto a um banco a polícia sentasse a uma mesa ladrões e gestores e os pusesse em gestão conjunta dos bens partilhando os ladrões e a polícia a segurança do estabelecimento.
faz sentido?