o tio vânia, de tchekhov, é uma das obras-primas da dramaturgia mundial. escrita entre 1896 e 1897, estreou-se em moscovo em 1899. desde então, tem subido aos palcos de todo o mundo. agora, chegou ao teatro da trindade, numa co-produção com a escola de mulheres, encenado por isabel medina. o elenco é um luxo: a josé wallenstein, são josé correia e elisa lisboa juntam-se lucinda loureiro, pedro lima, teresa tavares e wagner borges. joão lagarto dá vida a vânia, numa interpretação magnífica.
há 20 anos que isabel medina queria levar a peça à cena. para ela, tchekhov é (juntamente com shakespeare e os dramaturgos gregos) um dos grandes autores do nosso mundo, pela sua intemporalidade e universalidade. «o vânia é a sua peça mais profunda – a par de as três irmãs. tem tantas camadas que, ao descascá-la nunca chegamos ao fundo».
para a encenadora este era o momento para a encenar. «o tempo do vânia é agora. o tempo de tchekhov era crise, foi antes da revolução, estava tudo em mudança. e nós estamos numa crise profunda da humanidade». o dramaturgo russo, diz isabel, tem um enorme carinho pelas pessoas e por aquilo que antes, como hoje, se sentia: «somos escravos da sociedade. eles dizem que comem, bebem, dormem, enchem a vida de trivialidades e trabalham para se sustentar. é o que nós fazemos». como eles, assume a encenadora, fazemos o melhor que podemos. mas não é suficiente. «temos a nuvem do mercado, um deus que não conhecemos e nos torna escravos. também eles tinham pressões contra as quais não conseguiam lutar». impotentes, cediam à inércia, mantendo a consciência de que se perdeu, e desperdiçou, a vida.
apesar do enorme desespero há uma nota de esperança: tchekhov espera que o homem encontre uma forma de ser feliz. também medina mantém a nota de esperança, com um apelo à resistência. apelo esse que vem de uma mulher. tchekhov mostra os homens como seres frágeis, as mulheres são as personagens fortes.
é uma tragédia, sim, mas tchekhov escreve com grande humor. humor que isabel quis realçar: «tchekhov dizia: é melhor rirmo-nos da tragédia. senão, o que é que nos resta? a tragédia é a vida, o dia-a-dia».